“Você já ouviu falar sobre os ‘Parâmetros Curriculares Nacionais’ (PCN)?”

Por: Ana Kelly Borba da Silva Brustolin

17/06/2021 - 17:06 - Atualizada em: 17/06/2021 - 17:11

De acordo com Souza (1998, p. 6), os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) foram elaborados buscando, “de um lado, respeitar diversidades regionais, culturais, políticas existentes no país e, de outro, considerar a necessidade de construir referências nacionais comuns ao processo educativo em todas as regiões brasileiras”.

Essa citação, extraída dos PCN de Língua Portuguesa destinados ao terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental, faz parte do texto de abertura dedicado “ao professor” que está assinado pelo ministro da Educação e do Desporto, representado naquela data por Paulo Renato Souza. Ela é bastante significativa no que se refere à aprendizagem que se processa em uma relação interativa entre o sujeito e a cultura em que ele está inserido.

Assim, entre o homem e os saberes próprios de sua cultura, precisamos dar valor aos numerosos agentes mediadores da aprendizagem, não somente ao professor e à escola, apesar de estes serem agentes excepcionais pela sistemática pedagogicamente delineada, objetivos e intencionalidade tomados.

Entretanto, é necessário, como fala Souza, “criar condições, nas escolas, que permitam aos nossos jovens ter acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania” (1998, p. 6).

A atual situação da disciplina curricular “língua portuguesa” é consequência de diversos processos históricos, dentre eles, a reforma pombalina e as mudanças ocorridas na década de 1980 e 1990, e, principalmente, a introdução dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) no cenário brasileiro.

Uma discussão bem comum ultimamente na área de educação diz respeito aos PCNs e ao seu reflexo no ensino. A preocupação com o ensino da língua obteve, enfim, repercussão política e, agora, pelo menos teoricamente, conseguiu-se perceber algumas mudanças positivas.

No tocante à língua portuguesa, área em que atuo, os PCNs apresentam discussões acerca de planos de trabalho que dão valor à participação efetiva e crítica do aluno perante a sua língua e que mostram as variedades de uso da lingua(gem) em diversas situações de interação no dia a dia.

Organização dos PCNs

Se analisarmos os PCNs de língua portuguesa para o ensino fundamental, observaremos que eles se organizam em duas partes. Na primeira parte, são trazidas as propostas da interdisciplinaridade – a fim de que o aluno considere a língua de um ponto de vista mais amplo – e da relação da disciplina junto aos temas transversais que orientaram os PCNs, como ética, pluralidade cultural, meio ambiente, saúde, orientação sexual, trabalho e consumo. Já na segunda parte, há informações sobre projetos, utilização de tecnologia em sala de aula e critérios de avaliação.

Assim, os PCNs trazem uma perspectiva interacionista em relação ao ensino de língua citando, ainda, a leitura e a produção de textos como o alicerce para a formação do aluno, expondo que a língua não é homogênea, mas uma soma de possibilidades condicionadas pelas situações de uso e pelas situações discursivas.

Um ponto basilar que retrata essa perspectiva de ensino de língua mais bem-sucedido está denotado no texto dos PCNs: “Toda educação comprometida com o exercício da cidadania precisa criar condições para que o aluno possa desenvolver sua competência discursiva” (1998b, p. 23).

Logo, um dos aspectos da competência discursiva é que o indivíduo seja capaz de usar a própria língua de maneira variada, sabendo adequar-se às várias situações de interação cotidiana, tanto na fala quanto na escrita, o que se denomina “competência linguística e estilística”. (1998b, p. 23)

Ressalto que muitos estudiosos da área como Sírio Possenti, Luiz Antônio Marcuschi, Mary Elizabeth Cerutti-Rizzatti e Irandé Antunes já asseveravam que, para que possamos aplicar o que vem sendo defendido nos PCNs, é preciso tirarmos o foco do ensino ante as regras emolduradas das gramáticas e nos fundamentarmos na análise de textos, tendo em vista a compreensão e produção escrita e falada dos alunos.

Os PCNs, igualmente, se referem à inclusão de textos orais no ensino de língua na sala de aula. Embora ainda não sejam recorrentes propostas de textos orais nos livros didáticos e propostas de trabalhos com textos orais por parte dos professores, é muito importante realizar trabalhos com a oralidade na sala de aula, pois, tanto a oralidade quanto a escrita são imprescindíveis, a fim de que os usuários da língua a dominem e não confundam seus papéis, seus contextos de uso, bem como não discriminem os falantes da língua.

Outro ponto relevante trata da importância da produção de textos pelos próprios alunos. Por meio de produções textuais de variados tipos, os estudantes podem deleitar-se acerca de várias épocas, autores, palavras, gestos e expressões… E o professor, além de motivá-los em suas produções, pode realizar diversas atividades de análises linguísticas e prática textual, e também reflexões a respeito da lingua(gem), sem esquecer de, inclusive, efetuar comparações entre textos orais e escritos, dos mais diversos gêneros.

Assim, o aluno tem condições de perceber as variações linguísticas e se torna apto a usar a própria língua de maneira variada, sabendo adequar-se às várias situações de interação cotidiana, tanto na fala quanto na escrita.

Portanto, cabe à escola promover a ampliação das condições de produção do aluno, considerando os diferentes níveis de conhecimento prévio, “de forma que, progressivamente, […] cada aluno se torne capaz de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, de assumir a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais variadas situações” (PCNs, 1998a, p 19).

Na segunda parte dos PCNs, na seção designada “Objetivos de ensino”, também constatamos a apresentação de diferentes práticas de trabalho com os conteúdos previstos, cujos objetivos são desenvolver no aluno o domínio da expressão oral e escrita em situações de uso público da linguagem, levando em conta a situação de produção “social e material do texto […] e selecionar, a partir disso, os gêneros adequados para a produção do texto, operando sobre as dimensões pragmática, semântica e gramatical” (BRASIL, 1998b, p. 49).

Nesse ínterim, a prática de escuta de textos orais, leitura de textos escritos, a prática de produção de textos orais e escritos e a prática de análise linguística constituem-se em um alicerce no qual está sustentado o ensino de língua portuguesa, e este funciona como um tipo de “edifício”, com os seus devidos andares, na formação dos alunos.

Como podemos observar na orientação dos PCNs, os conteúdos partem sempre, deste modo, de textos. Desta maneira, o professor, ao delinear sua ação, de acordo com os PCNs, precisa enfatizar o texto em suas aulas de português, e com base nele realizar aulas de leitura, oralidade, interpretação e análise linguística, priorizando as habilidades pretendidas para os alunos ao final do ensino fundamental, que devem se manifestar em objetivos realizados e cumpridos na essência do projeto educativo da escola.