Há um bilhão de anos, a Terra era um lugar inóspito e congelado: um planeta envolto em gelo, sem qualquer sinal de vida como conhecemos hoje. No entanto, foi exatamente nesse cenário extremo, durante a Era Neoproterozoica (de 1 bilhão a 543 milhões de anos atrás), que começaram a surgir nos oceanos os primeiros organismos vivos, como micróbios e cianobactérias.
A origem dessa transformação biológica tem intrigado cientistas por décadas, e agora, uma nova pesquisa realizada na Austrália lança luz sobre o papel das geleiras nesse processo.
Segundo pesquisadores da Universidade Curtin, em Perth, os movimentos das geleiras durante a chamada “Terra Bola de Neve” (teoria que sugere que o planeta Terra esteve totalmente coberto por gelo) podem ter sido fundamentais para alimentar os oceanos com nutrientes essenciais ao desenvolvimento da vida complexa. Isso porque, ao se moverem, essas massas de gelo arrancavam minerais da crosta terrestre e os depositavam nos mares, rios e lagos, alterando radicalmente a composição química desses ambientes.
Essa teoria não é exatamente nova, mas sempre esbarrou em uma grande dúvida: será que as geleiras realmente se movimentavam durante aquele período de congelamento extremo?
Para encontrar respostas, os pesquisadores analisaram sedimentos de formações rochosas datadas dessa era e os compararam com sedimentos de um período posterior conhecido como “Terra Estufa”, marcado pelo desaparecimento das camadas de gelo.
Um dos focos da investigação foram os zircões, minerais incrivelmente duráveis que resistem a milhões de anos de transformações geológicas. A equipe descobriu que os sedimentos mais antigos, da era glacial, apresentavam uma diversidade maior de minerais e sinais de erosão compatíveis com o movimento das geleiras.
Em contraste, as rochas da Terra Estufa mostravam uma composição mais limitada, com ausência de grãos frágeis, possivelmente dissolvidos pela ação da água em ambientes sem gelo.
Essas evidências indicam que as geleiras da Terra Bola de Neve estavam de fato em movimento e, portanto, poderiam ter desempenhado um papel essencial na liberação de minerais que, ao se misturarem aos oceanos, criaram as condições necessárias para o surgimento de vida mais complexa.
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Ainda assim, o estudo não oferece uma resposta definitiva. Os cientistas continuam investigando se a quantidade de minerais depositada nos oceanos teria sido suficiente para causar mudanças ambientais duradouras ou se os efeitos foram apenas temporários.
O debate permanece aberto, e a hipótese da “glaciação como berço da vida” ainda precisa ser confirmada com mais evidências.
Independentemente da resposta final, a pesquisa traz outro insight valioso: o passado pode ajudar a entender o presente. Ao mostrar como mudanças geológicas lentas moldaram o planeta ao longo de milhões de anos, o estudo convida a refletir sobre o ritmo acelerado das transformações atuais provocadas pelas mudanças climáticas. Na Terra Bola de Neve, essas mudanças ocorreram em escala glacial. Mas, hoje, elas avançam a passos largos, desafiando a capacidade do planeta de se autorregular.
Seja sobre a origem da vida ou o futuro do clima, tudo está conectado. E entender o passado pode ser a chave para proteger o futuro.