Dados do Ministério da Previdência Social mostram que o Brasil enfrenta uma crise de saúde mental com impactos diretos na vida de trabalhadores e no desempenho das empresas. Somente em 2024, o país registrou mais de 470 mil afastamentos por transtornos mentais, o maior número desde 2014.
De acordo com a neurocientista da BrainEstar, Dra. Emily Pires, o estresse crônico pode comprometer a capacidade de foco e o controle emocional, além de aumentar o risco de desenvolver diversos transtornos mentais.
“Quando o cérebro é exposto a uma carga cognitiva intensa por longos períodos — sem pausas, com multitarefas e sob pressão — ele entra em um estado de fadiga neuroquímica. Isso reduz a eficiência sináptica, prejudica a memória de trabalho, diminui a atenção sustentada e afeta diretamente a tomada de decisões estratégicas, favorecendo erros, esquecimentos e respostas impulsivas”, comenta Emily Pires.
A especialista ressalta ainda que o estresse crônico ativa continuamente o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), elevando os níveis de cortisol.
“Com o tempo, isso provoca alterações estruturais em regiões como o hipocampo (relacionado à memória), a amígdala (área emocionalmente reativa) e o córtex pré-frontal (responsável por decisões e autorregulação). Essas mudanças reduzem o foco, a empatia e o controle emocional, além de aumentarem a irritabilidade e o risco de transtornos como ansiedade, depressão e burnout”, pontua.
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Segundo ela, para muitas pessoas pode ser difícil “desligar” do trabalho mesmo fora do expediente por fatores comportamentais, mas também neurológicos.
“Do ponto de vista da neurociência, o cérebro é moldado pela repetição e pela previsibilidade. Quando estamos continuamente expostos a estímulos relacionados ao trabalho (notificações, cobranças, prazos), redes neurais de hiperalerta permanecem ativadas. O cérebro perde a capacidade de entrar em estado de repouso (modo default), essencial para processar memórias, restaurar recursos cognitivos e gerar criatividade. Além disso, a dopamina liberada com metas e urgências cria uma ‘dependência de produtividade’”, explica.
No último mês, o governo federal oficializou o adiamento da atualização da NR-1 (Norma Regulamentadora nº 1) para 2026. A norma passaria a exigir das empresas, a partir deste mês, a identificação de riscos psicossociais e a adoção de medidas para proteger a saúde mental dos profissionais. A revisão da norma reforça a importância de identificar e controlar fatores como estresse, assédio moral e sobrecarga mental no ambiente profissional.
Para Emily Pires, cuidar da saúde mental representa uma estratégia inteligente para as organizações. “Empresas que investem em bem-estar reduzem o absenteísmo, os afastamentos e os passivos trabalhistas, mas, principalmente, constroem equipes mais resilientes, criativas e engajadas. O cérebro saudável é um ativo estratégico para ambientes inovadores, éticos e produtivos”, destaca a neurocientista.
Uma das formas de prevenir e tratar os efeitos do estresse no trabalho é o treinamento com o neurofeedback. “O neurofeedback é uma ferramenta eficaz e cientificamente validada para a regulação emocional e a redução do estresse crônico. Ele treina o cérebro a reconhecer e modular seus próprios padrões elétricos, por exemplo, reduzindo a hiperatividade em redes de vigilância (como a beta alta) e fortalecendo estados de relaxamento e foco (como alfa e SMR). Na prática, o colaborador aprende a sair do modo reativo e retoma o autocontrole neurofisiológico. Isso reduz a insônia, a ansiedade e melhora a performance sem sobrecarga”, conclui a especialista.