♫ “Nunca vi rastro de cobra nem couro de lobisomem/ Se correr, o bicho pega, se ficar, o bicho come/ Porque eu sou é home, porque eu sou é home/ Menino, eu sou é home, menino, eu sou é home/ E como sou”♫ (Homem com H; Ney Matogrosso)
O machismo e o sexismo estão em voga. Infelizmente. O que parecia ter ficado no passado, com famílias patriarcais onde as mulheres “deveriam se colocar nos seus devidos lugares” (na frente da pia ou do fogão), está ressurgindo com uma falsa sofisticação. Há homens que ainda se acham no direito de controlar, definir, diminuir e subjugar mulheres. E agora encontraram um lugar para se reunir, reproduzir discursos de ódio e multiplicar seguidores: a machosfera.
A internet, espaço de avanço e pluralidade, também escancarou seus porões. Eles não são novos, mas ganharam força com a internet: os red pills, os incels, os MGTOW (men going their own way), os defensores da “masculinidade alfa” e outras siglas que, no fundo, só disfarçam a mesma coisa: machismo requentado com memes e retórica de autoajuda tóxica. Ou simples incompetência de serem homens.
Gangues ou seitas?
Os red pills (nome inspirado no filme Matrix) dizem que sua “pílula vermelha” abre os olhos para a “verdade sobre as mulheres”. Eles acreditam que as mulheres são manipuladoras, hipergâmicas (um termo que eles adoram repetir sem sequer entender direito) e que só se relacionam com homens por interesse. A solução? Submeter, ignorar ou “reeducar” as mulheres. Sinceramente, não sei se rio (às gargalhadas) ou se choro (aos prantos).
Já os incels (abreviação de involuntary celibates, celibatários involuntários), alegam que são rejeitados sexualmente pelas mulheres e, por isso, culpam… as próprias mulheres. Em outras palavras: uns frustrados. A frustração transformada em ódio é tamanha, que muitos pregam a violência contra mulheres e homens em relacionamentos felizes. E há notícias de vários crimes ao redor do mundo (mas, principalmente nos EUA) cometidos sob essa bandeira.
Todos esses grupos, que mais se assemelham a seitas digitais, compartilham a mesma base: não aceitar que as mulheres tenham liberdade de escolha, de fala e de existência fora da validação masculina. Ou seriam facções criminosas?
Incapacidade social e intelectual
E o mais paradoxal? Eu acredito piamente que a maioria desses homens jamais sustentariam cinco minutos de conversa adulta com uma mulher real, com pensamentos próprios, histórico de vida e opiniões divergentes.
Esses caras criam fóruns, canais, podcasts e perfis para repetir mantras de masculinidade frágil. Ensaiam discursos “científicos”, “estatísticos”, “lógicos”. Atacam mulheres públicas, jornalistas, professoras, influenciadoras. Ensinam outros homens a dominar emocionalmente suas parceiras, a impor limites, a retomar o controle.
No fundo, são apenas garotos inseguros brincando de dominadores num playground virtual, incapazes de lidar com mulheres livres e independentes. Porém, há um risco nisso tudo, como os crimes que alguns vêm praticando.
Além disso, alguns deles são mais espertos. Aproveitam a onda para ganhar dinheiro com seus cursinhos de meia tigela. Sim, tem gente que paga para aprender a ser isso aí.
Os impactos nos adolescentes
De toda forma, o mais perigoso disso tudo não é a caricatura, e sim o impacto. Essas ideias ecoam entre adolescentes e jovens adultos. Transformam garotos em pequenos tiranos, alimentam discursos misóginos em escolas e universidades e fragilizam ainda mais as conquistas de igualdade que a sociedade mal começou a consolidar.
As mulheres não precisam da validação dos que as oprimem e nem daqueles que sentem saudade de uma sociedade onde elas não podiam votar, trabalhar ou existir sem tutela. A resposta está na autonomia, na informação, na educação e no exemplo.
Se a internet deu palco para a machosfera, é urgente que ela também sirva de palco para a resistência. Mulheres e homens sãos devem se opor a esses conceitos tóxicos.
Porque homem com H mesmo é aquele que respeita. Que se desconstrói. Que cresce com e não contra a mulher.