“Conselheiro com ‘rabo preso’ não serve!”

Por: Emílio Da Silva Neto

24/04/2020 - 06:04

O Presidente de uma das maiores empresas de Santa Catarina, após ler a minha coluna ‘Um estranho à mesa?’(1) , postou-me sua opinião, via WhatsApp, a qual inspirou-me a novo texto sobre o tema. Ei-lo.

Naquele texto foi relembrado que, em muitas empresas familiares, imperam a cegueira e a surdez ao mundo exterior(2) e que uma das formas delas se abrirem a vozes e conhecimentos de fora seria, após cuidadosa análise de nomes, convidar um conselheiro externo para ocupar “um lugar à mesa” no Conselho Consultivo ou de Administração.

O papel principal do conselheiro externo é reoxigenar o negócio, provendo-o de expertises impostas por novas demandas e dinamicidade do mercado, mitigando riscos, mas respeitando valores, princípios e legados da família controladora. Isto não significa, contudo, “bater continência” a opiniões, interesses e visões individuais de sócios, às vezes, até mal intencionados, em proveito próprio de poder e ego ou ganho material.

Metaforicamente, o bom conselheiro não “amarra seu cachorro com linguiça”, ou seja, não deixa seu cliente com sensação de dono da verdade e nem alimenta vaidades como no episódio “o rei está nu” do conto de Andersen(3), cuja lição é “quanto maior a vaidade, mais tola uma pessoa se torna”.

Isto só é possível se o conselheiro se mantiver isento e independente, não subjugado financeiramente à função, sem temor de desligamento por “incompatibilidades” e nem inseguro pelas “más línguas”, tudo isso em nome das entregas esperadas, para as quais ele foi contratado.

Ou seja, o trabalho de um conselheiro externo só é idôneo, sinergético e produtivo se ele não balizar seu trabalho pela manutenção do seu contrato de prestação de serviços, via agrados e anuências pessoais a este ou aquele sócio familiar, principalmente, se um dos ‘fortes’ na sociedade.

“Amizade, amizade, negócios à parte”, frase de mesas de bar, diz muito sobre a dinâmica empresarial. A sua nuance está que quando se fala em amizade não se está falando, necessariamente, de confiabilidade, reputação e capacidade de entregar aquilo que é prometido, de forma a atender expectativas.

A amizade ajuda, sim, na criação da sinergia entre partes, mas se não houver confiança na isenção da competência profissional, o conselheiro, deverá ser será substituído o quanto antes.

Enfim, o conselheiro não pode jamais entrar num “jogo de cartas marcadas”, como ventrículo ou fantoche nas mãos de clientes, falando, por exemplo, em reuniões o que lhe é mandado dizer ou defender. Isto condenará, inevitavelmente, ao fracasso os resultados esperados na contratação do conselheiro externo.

Ao conselheiro externo cabe separar interesses pessoais e amizade do seu propósito de conselheiro. Isto pode, de cara, parecer frio e dolorido, mas, evitando conflitos de interesses, o conselheiro contribuirá para a qualidade da sua interlocução e mentoria na melhoria do negócio em si.

Em resumo, se o conselheiro privilegiar compromissos com alguém em particular do grupo de sócios da empresa, ou seja, se se sentir de “rabo preso”, “vendendo a alma” (também, coração e mente), o melhor a fazer é “jogar a toalha” (como num ringue, interrompendo a luta para preservá-lo de um prejuízo maior), “entregar o boné” e procurar o “caminho da casa”.

(1): DA SILVA NETO, Emílio. Um estranho à mesa?, Jaraguá do Sul: Jornal O Correio do Povo, 20.03.2020
(2): DA SILVA NETO, Emílio. Lições de grandes valem para pequenos?, Jaraguá do Sul: Jornal O Correio do Povo, 06.03.2020
(3): ANDERSEN, Hans Christian. As roupas novas do imperador. Dinamarca: 1837

 

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Emílio da Silva Neto

Dr.Eng. Industrial, Consultor/Conselheiro/Palestrante/Professor (*) Sócio da ‘3S Consultoria Empresarial Familiar’ (especializada em Processo Decisório Colegiado, Governança, Sucessão, Compartilhamento do Conhecimento e Constituição de Conselhos Consultivos e de Família). Doutor em Engenharia e Gestão do Conhecimento

Curriculum Vitae: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4496236H3
Tese de Doutorado: http://btd.egc.ufsc.br/wp-content/uploads/2016/08/Em%C3%ADlio-da-Silva.pdf
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