*Por Rafaela Thomé
Você se lembra da primeira vez que dormiu fora de casa? Como foi passar sua primeira noite longe da mãe, comer pela primeira vez sozinho longe da mesa com os pais, ficar conversando até tarde da noite com o amiguinho ou com os primos?
A primeira noite fora de casa talvez seja o primeiro grande evento longe das asas protetoras da família. É quando os pequenos experimentam seu primeiro voo solo. Esse tipo de experiência fica na nossa memória, guardada com afeto, assim como essa que eu vivi essa semana.
Recebi um amiguinho do meu filho para dormir aqui em casa, era a primeira vez dele longe da mãe e eu já tinha sacado a responsabilidade e a importância desse momento. A Andrea, minha melhor amiga, estava aflita e não conseguia disfarçar o nervosismo. Já o filho, todo faceiro com mochila nas costas.
Chegou hora da janta e perguntei aos guris o que queriam comer. Normalmente eu não faço isso. Preparo o alimento e sirvo – dentro do que sei que eles gostam e do que uma alimentação saudável deve ter. Mas era uma refeição especial, então, decidi que faria de tudo para transformar o momento em algo gostoso de ser lembrado no futuro.
– E aí gurizada, o que vocês querem comer de janta?
– Pizza calabresa com muita cebola! – disse o Pedro.
Bento, meu filho de cinco anos, entrou logo na onda e foi categórico:
– Pizza calabresa sem a cebola!
Calabresa com muita cebola e sem cebola. Pelo menos a variação de sabor estava somente na cebola. Porém, eu não sei fazer pizza. Não sabia. E tenho por princípios que não entra alimento pronto aqui em casa, tudo deve ser preparado na minha cozinha.
Comida pronta e de rua, comemos na rua. E adoramos também. Mas priorizo fazer as refeições em casa e em família.
Abracei-me a coleção de livros gastronômicos e ao Google. Encontrei uma receita com poucos ingredientes e a promessa de que qualquer pessoa poderia fazer. Outro detalhe: estou sem forno em casa, tudo o que eu tinha era um mini-forninho – o que me fez lembrar que também não haveria forma adequada para a pizza. A receita e os ingredientes eram somente uma parte do desafio.
Farinha, fermento, água morna, pitada de sal. Mistura, mistura e sova. Descansa. Estica com o rolo, farinha para polvilhar, espalha a massa bem fininha na forma (uma forma mágica que eu fiz funcionar). Coloquei o molho pomodoro que tinha preparado no mesmo dia, queijo comprado da colônia, a calabresa tão desejada e a cebola, muita cebola – somente de um lado.
Pedro, meu pequeno hóspede, comeu tudo e ficou bem feliz. Se sentiu seguro, atendido, acolhido e mimado pela tia. Já meu filho, quis comer a parte dele e a do amigo, com cebola. Ambos acordaram cedo, continuavam com aquele sorriso gostoso de criança e a pergunta: “o café da manhã já está pronto?”
A tia aqui descobriu outra mágica desse universo da cozinha – a de servir como ferramenta ou agente na transição de vida das pessoas. A pizza do Pedro marcou a primeira noite que ele dormiu fora de casa. E o Pedro marcou na tia Rafa a primeira pizza feita por ela; sem forno, quase sem forma, mas feita com o ingrediente mais poderoso dessa vida: amor.
Meu blog já está no ar. Dá um pulo lá pra pegar a receita de Pizza que agora eu chamo de Calabresa Bento e Pedro.
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