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O caso da mulher da janela do avião: estão todos errados

Foto: Freepik

Por: Raphael Rocha Lopes

10/12/2024 - 14:12 - Atualizada em: 10/12/2024 - 15:18

♫ “Mandei fazer/ De puro aço luminoso, um punhal/ Para matar o meu amor e matei/ Às cinco horas na Avenida Central/ Mas as pessoas na sala de jantar/ São ocupadas em nascer e morrer”♫ (Panis et circenses; Os Mutantes)

Generalizar é quase sempre um erro; logo parto da presunção do erro, pois vou generalizar.

Todo mundo viu ou ouviu falar – ou quase todo mundo, lá estou eu generalizando novamente – (d)o vídeo da moça que não saiu do seu lugar na janela do avião mesmo com uma criança chorando e alguém vociferando algumas indelicadezas.

A pessoa que postou o vídeo em sua rede social esperava que a horda se voltasse contra a calada moça da janela. O tiro saiu pela culatra. A turba se voltou contra a mulher que a assediava e a filmava, que era sua mãe (da garota que postou).

Por um tempo, o populacho da internet – e das rodas de bar – acreditou que a perturbada que interpelava a moçoila era a mãe da criança chorona. Sim, a multidão barulhenta da grande rede já havia taxado que o menino era um nutella birrento e a sua mãe uma folgada.

Como eu disse, a turba se virou contra a mãe da criança, que era a mãe da garota que postou o vídeo na internet. A propósito, no vídeo, a filha que postou o fez com um típico textinho pseudo-lacrador de internet: “e minha mãe que encontrou uma pessoa sem empatia com criança”. Continuando, o povo da internet se virou contra a mãe da criança e a mãe da poetisa que postou o vídeo pensando, esse povo todo, que era a mesma mãe.

Pois é, não era! Viva as redes sociais e suas generalizações!

Antes de eu entender o que estava acontecendo, eu já tinha visto gente dando aula de empatia ou de como ser empático; gente criticando mães folgadas e dando aula de como criar filhos raízes; gente dando aula para a moça da janela de como ela deveria agir daqui em diante (pra mim essa foi a mais bizarra dos bizarros ensinamentos que rolaram); gente dando aula sobre o custo extra dos assentos nas janelas dos aviões; gente dando aula de como se comportar em aviões; gente dando aula de dar lição de moral na filha que postou o vídeo (ainda pensando que era irmã da criança que chorava); e por aí vai.

E muita gente teve que guardar a língua, que, afinal, é o chicote daquela outra parte do corpo.

No final, a filha não era a irmã do filho que chorava. E a mãe da criança não tinha nada a ver com a torre de Babel que se tornou essa história. Pior do que isso, supondo, a internet – tal qual os coaches que dizem que o iludido, sem saber que não podia fazer, foi lá e fez –, sem saber de nada, acreditando que sabia de tudo, foi lá e fez o estrago do tamanho de uma pauliceia desvairada.

A mãe, a verdadeira, virou vilã sem, ao que tudo indica, ter dito nada, ter filmado nada, e ainda ter pedido desculpa e ter tirado seu filho de perto.

Outra desvairada, que não sei se é da pauliceia e nem me interessa de onde é, a que filmou e esbravejou, sem ser nada de ninguém (só mãe da outra desvairada que publicou o vídeo) e nem estar nas poltronas contíguas, levou uma bela chicotada da língua. Pior, das línguas da internet, que não perdoam e são cruéis.

Todas passaram a ser ameaçadas. A silenciosa poliana da janela (que passou de menos de mil para mais de dois milhões de seguidores em alguma rede social), a mãe e a filha barraqueiras, e a mãe da criança de quatro anos que, no final das contas, conseguiu contornar a situação. E quem tem ou teve filho pequeno sabe que existem momentos que não dá para fazer o milagre do engole o choro.

E, sim, todos estão errados!! Todos aqueles que se precipitaram, que tiraram suas conclusões pelas ondas da internet, que criticaram, confundiram e escracharam em textos de redes sociais ou mesas de bares.

De tudo isso ficou uma lição: que é necessário entender o que aconteceu antes de tirar conclusões precipitadas. Pena que ninguém vai lembrar dela semana que vem, no próximo tititi da internet.

 

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Raphael Rocha Lopes

Advogado, autor, professor e palestrante focado na transformação digital da sociedade. Especializado em Direito Civil e atuante no Direito Digital e Empresarial, Raphael Rocha Lopes versa sobre as consequências da transformação digital no comportamento da sociedade e no direito digital. É professor da Faculdade de Direito do Centro Universitário Católica Santa Catarina e membro da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs.