A Jaraguá do Fantástico

Por: Nelson Luiz Pereira

29/04/2018 - 13:04

No último domingo (22) os jaraguaenses tiveram um motivo especial para assistirem ao programa ‘Fantástico’ da Rede Globo. Antes mesmo da matéria ter sido exibida, os guardiões da crítica já se manifestavam em polvorosa nas redes sociais. Imagine após a exibição. Jaraguá do Sul fora aludida como a cidade mais pacífica do Brasil no quesito homicídio. Confesso que tenho por hábito reservar uma hora e meia de minhas noites para exercitar o equilíbrio emocional. Ocupo este tempo selecionando os temas mais polêmicos do momento rolando nas redes. Me acomodo confortavelmente e vou acompanhando, sem me manifestar, a ‘tripa’ cacográfica que vai se alongando na tela do smartphone. Penso que observar o clima se incendiando, mantendo-se em off, é equivalente a alcançar o ‘tantra’ existencial.

Entre tapas e beijos, não me deparei com nenhuma conclusão coerente quanto ao impacto positivo ou negativo que a matéria poderia trazer para Jaraguá. Pelo contrário, as opiniões se dividiram entre: indiferentes, irracionais e patéticas, salvo raras exceções. Me dei ao trabalho de classificar uma opinião para cada categoria. A indiferente: “essa matéria poderá ter um impacto positivo, mas também negativo. Só saberemos mais adiante. Se nada acontecer, é porque não teria sido nem positiva nem negativa”. O instinto ‘Saraiva’ apoderou-se de mim, lembrei-me de uma figura política. Mentalizei a resposta, mas me contive. A Irracional: “já fui assaltado aqui, portanto, essa matéria só pode ter sido comprada pela prefeitura, e paga com o nosso dinheiro”. Respirei fundo, contei até dez, redigi a resposta com cuidado, fundamento e serenidade e…abortei, vencendo assim, o segundo round contra mim mesmo. Por fim, a patética: “esse tipo de propaganda só irá atrair folgados e assaltantes para nossa cidade”. Senti que meu animo evoluiu para um quadro de psicose. Me veio à mente a clássica cena do chuveiro de Hitchcock, porém, sendo eu o vilão. Oras, qual a tendência de assaltantes de fora se aventurarem numa cidade onde, além da polícia ser atuante, grande parte dos cidadãos é também um pouco polícia?

É obvio que o índice de violência de uma cidade não se esgota no indicador homicídio. Mas se somos referência positiva neste quesito, temos que nos orgulhar da matéria sim. Isso é uma conquista de todos. Entretanto, não podemos ignorar nossa violência velada, do estupro e agressão à mulher, cujo indicador somos referência bem negativa. Enfim, essa discussão me levou a uma constatação: toda cidade é uma percepção particular que deriva do sentimento de “pertença”. Há os que ‘moram’ numa cidade, e há os que ‘são’ de uma cidade. Em tese, os que ‘moram’, tendem a demonstrar rejeição para com essa exposição. Os que ‘são’, tendem a demonstrar orgulho e satisfação, porém, reconhecem e se preocupam com outras mazelas, envolvendo-se, de alguma forma, para combatê-las.