“Uma doença social”

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Por: Francisco Hertel Maiochi

02/06/2020 - 10:06 - Atualizada em: 02/06/2020 - 17:17

Quando comecei essa coluna, a ideia era escrever textos sobre psicologia e sexualidade, coisas que fizessem as pessoas refletirem nos seus problemas pessoais e, quem sabe, tomarem aquele primeiro passo de procurar ajuda com profissionais capacitados, como psicólogos e psiquiatras.

Observar o mundo todos os dias tem me feito desviar deste caminho ultimamente. Parece que nossos problemas pessoais não são tão importantes quanto os problemas sociais que efervescem nesse 2020.

Enfrentamos várias crises simultâneas. Temos a mais grave pandemia em mais de 100 anos, e somada a ela uma crise política de grandes proporções, um ressurgimento do fascismo no mundo e no Brasil, e a constante necessidade de muita gente ter que lutar para denunciar violências graves que sofrem simplesmente por existir na sociedade que construímos.

A nossa sociedade é escancaradamente racista, homofóbica e preconceituosa. Ao mesmo tempo, se eu perguntar aos meus leitores onde estão os racistas, os homofóbicos, ninguém vai levantar a mão. Talvez alguns apontem para alguns outros, mas nunca somos nós.

Talvez uma pergunta que revele com mais clareza é: “a maioria tem direito de ditar as regras para as minorias?”. Concordar com isso revela a crença em um suposto direito fundamental de quem se acha maioria poder escolher como qualquer minoria deva se comportar.

O branco poder julgar onde o negro pode andar. O homem dizer o que a mulher pode vestir, o hétero poder julgar como o gay tem que falar. Que o cristão possa determinar para quem o espírita, hindu ou muçulmano possa orar. Porque são a maioria, e as minorias têm que se curvar às maiorias, como nosso presidente colocou.

Essa é a estrutura básica do fascismo, que tanto se fala. Ou você faz parte da maioria, ou obedece à maioria, ou sofre violência da maioria. É um sistema brutal, persecutório, que resultou, na Itália de Mussolini e na Alemanha de Hitler, no extermínio de milhões de inocentes.

É uma crença na morte como solução, na impossibilidade de aceitar a diferença, então se a diferença existe, no final das contas, precisa ser exterminada de uma forma ou de outra.

Com a pandemia muita gente tem discursos com nomes diferentes, mas se porta dessa forma. Dizem que a maioria das pessoas não terá consequências graves, por isso tem que continuar vivendo normalmente. E a minoria, os idosos, os diabéticos, hipertensos, estes têm que se curvar à maioria, também se expor, ir trabalhar, andar na rua, acreditar que tudo está normal, porque está normal para a maioria.

Se está normal para a maioria, a minoria tem que se curvar, e se morrer, morreu. Morreu não porque se expôs, mas porque tinha “comorbidades preexistentes”. Como a pessoa que leva um tiro, mas “morreu porque era hipertensa, se não fosse hipertensa teria sobrevivido”.

Esse discurso não pode ser aceito como válido. Todos temos o direito de viver com liberdade, e não podemos justificar com o discurso de liberdade a liberdade de fazer mal ao outro. Não podemos, como sociedade, tolerar quem advoga pela exclusão, sacrifício ou morte do outro como solução para qualquer coisa.

Existe nobreza no sacrifício de si mesmo, quem é profissional da saúde e escolhe arriscar a própria vida para salvar a de outras pessoas. O contrário, quem decide arriscar a vida do outro para salvar a própria vida, as próprias crenças, a própria folha de pagamento, ou só para poder tomar uma cervejinha e comer um churrasquinho com amigos, isso é só egoísmo e crueldade.

É uma doença da sociedade que precisa ser combatida.

Francisco Hertel Maiochi – Espaço Ciclos

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