No princípio era o verbo! E no contexto do direito, um princípio se refere a uma regra fundamental ou uma norma básica que serve como diretriz para a construção de um sistema jurídico e para a interpretação e aplicação das leis.
Princípio é o que dá base. O que fundamente. O que dá sustentação. E existem vários princípios.
No judiciário, por exemplo, um dos princípios fundamentais é o da publicidade e transparência, que rege o funcionamento do sistema judicial, tanto no Brasil quanto em muitos outros países democráticos. Ele se baseia na ideia de que as atividades, processos e decisões do sistema judiciário devem ser abertos e acessíveis ao público em geral, garantindo assim a prestação de contas, a justiça e a confiança no sistema.
Logo, os votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), por fazerem parte do sistema judiciário, são públicos.
Essa publicidade dos atos judiciais, essa transparência do judiciário, provém de uma série de fatores históricos e fundamentais que moldaram o sistema judicial brasileiro.
A história desse importante aspecto remonta ao período colonial. Durante o domínio português, o sistema de justiça era caracterizado por uma opacidade extrema, com decisões frequentemente tomadas a portas fechadas e sem qualquer prestação de contas. Isso resultou em uma falta de confiança generalizada nas instituições judiciais e em sérias injustiças.
Com a Independência do Brasil em 1822, a qual comemoramos 201 anos essa semana, houve uma crescente demanda por maior transparência e prestação de contas no sistema de justiça. O Imperador Dom Pedro I promulgou a primeira Constituição do Brasil em 1824, que continha disposições importantes relacionadas à administração da justiça.
Embora essa constituição tenha sido bastante centralizadora em relação ao poder do imperador, ela também introduziu princípios fundamentais, como a publicidade dos atos judiciais, incluindo os votos dos juízes.
Ao longo do tempo, a demanda por transparência e prestação de contas no sistema judicial cresceu. A Constituição de 1891, que estabeleceu a Primeira República Brasileira, manteve a disposição de que “os julgamentos dos tribunais são públicos”, consolidando ainda mais o princípio da publicidade e transparência nos atos judiciais.
No entanto, foi com a Constituição de 1988, a atual Constituição Brasileira, que a importância da publicidade das decisões e votos, inclusive dos ministros do STF, foi enfatizada e reforçada.
O artigo 93, inciso IX, da Constituição de 1988 estabelece que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”. Isso significa que não apenas os votos dos ministros do STF devem ser públicos, mas também que todas as decisões judiciais devem ser devidamente justificadas, garantindo a transparência e a prestação de contas.
A publicidade das decisões e votos, inclusive dos ministros do STF, desempenha um papel crucial na manutenção da confiança pública no sistema de justiça brasileiro. Permite que os cidadãos acompanhem de perto as decisões, compreendam o raciocínio jurídico por trás delas e avaliem a atuação dos julgadores. Especialmente dos ministros da Suprema Corte.
Quando alguma pessoa, quer ela quem seja, sugere ou afirma que os votos dos ministros do STF devem ser secretos/sigilosos, erra grosseiramente. Erra de forma histórica, erra de forma principiológica, erra de forma institucional e erra, inclusive, de forma Constitucional.
Não podemos esquecer, nunca, que a publicidade das decisões e votos, inclusive dos ministros do STF, é uma conquista histórica que se enraíza na luta pela transparência e pela prestação de contas no sistema judicial brasileiro. Ela reflete a evolução do país desde os tempos coloniais até a atualidade, reforçando os princípios democráticos e contribuindo para a consolidação do nosso Estado Democrático de Direito no Brasil.
Willian Leonardo da Silva é advogado (OAB/SC 38.396), sócio do escritório Coelho Ramos & Silva Advogados; Mestrando em direito pela Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas – FGV em São Paulo.