Em quase 150 anos de história de representação consular da Alemanha em Blumenau, Susanne Klemz Adam é a primeira mulher a assumir a função de cônsul.
Ela conta nesta entrevista ao projeto “Mulheres que Inspiram”, idealizado pela Contax Contabilidade e Planejamento Tributário, com o apoio da Presse Comunicação e do OCP News Vale, um pouco sobre a sua atuação consular, a vida profissional e os desafios do dia a dia.
Advogada atuando na área há cerca de 18 anos, Susanne é graduada em Direito pela Furb e especialista em Direito Tributário pela Fundação Boiteux/UFSC. “Sou muito grata pois tive nesse período a oportunidade de trabalhar com excelentes profissionais e ótimos clientes, que muito me estimularam a investir na minha carreira como advogada”, conta.
Representação consular
Susanne lembra que recebeu com surpresa a proposta de submeter seu nome à função de cônsul honorária da Alemanha em Blumenau junto ao Ministério das Relações Exteriores daquele país.
“Foi uma honra ser considerada para esta função tão nobre, precedida por pessoas do mais alto gabarito, tanto mais em posteriormente receber o termo de nomeação firmado pelo presidente da República Federal da Alemanha”, relata.
Antes de mais nada, ela explica que é uma servidora pública honorária (sem remuneração), que tem o papel de auxiliar a representação oficial – Embaixada e Consulado Geral – a bem desempenharem as suas funções, sem deixar de cuidar da própria carreira profissional.
“Embora ainda esteja me inteirando das funções que me são designadas, posso garantir que é uma função muito gratificante, que, apesar dos desafios, exerço com alegria”, aponta a cônsul, que ocupa o cargo desde maio de 2019.
No escritório de representação consular, ela conta com uma equipe formada apenas por mulheres. “Não posso deixar de agradecer a Ane e a Jacque pelos seus esforços em bem atender aos que nos procuram, bem como, em me auxiliar nas atividades”, completa.
Susanne já tinha uma ligação antiga com a Alemanha. Há muitos anos, auxiliou o Consulado Geral em Porto Alegre (RS) no caso de um cidadão alemão que havia sido preso e, a partir daí, começou um contato regular com o consulado.
Oportunidades e desafios
Para Susanne, a vida, por si só, é um desafio. Mas, para citar alguns exemplos, ela fala sobre a necessidade constante de aprimorar seus conhecimentos ao trabalhar em diferentes escritórios de advocacia. Além disso, como passou a atender alguns casos de clientes estrangeiros, houve o desafio de aprimorar o conhecimento dos idiomas que já havia aprendido – inglês e alemão.
Por fim, aponta a própria concorrência, que serve como estímulo para a melhora contínua de qualquer profissional. Atualmente, porém, seu maior desafio é conciliar a carreira profissional com a maternidade.
Susanne e o marido passam por um processo de adoção, que ainda não foi concluído. Eles se tornaram pais de dois meninos no início da pandemia. Hoje, o mais novo está com um ano e sete meses e o mais velho com quase três anos. Segundo ela, “uma aventura e tanto!”
Dificuldade e incompreensão
Apesar de todo o sucesso que tem na vida profissional, a advogada diz que já passou por situações limitantes pelo fato de ser mulher. “Num primeiro momento, relacionadas com eventual timidez e insegurança pessoal, questões próprias minhas. Também tive momentos em que faltou respeito pelo fato de ser mulher, como se não fosse capaz de lidar com as funções profissionais”, recorda.
No momento, a limitação que enfrenta é ser mãe de duas crianças pequenas e conseguir conciliar a vida profissional com as necessidades dos pequenos. Ainda mais em tempos de pandemia, quando, por muito tempo, as creches estiveram fechadas.
“Noto muita incompreensão por parte da sociedade com mães que optam por ter uma vida mais presente com seus filhos. No auge da pandemia, no ano passado, tive uma cliente de longa data, ela mesma uma mulher de muita fibra, que recomendou, antes de dispensar meus serviços, que contratasse uma babá e voltasse a focar integralmente nas minhas atividades jurídicas. Fiquei muito triste com esta postura, pois mostra bem a incompreensão que parte da sociedade tem para com as mães”.
Na opinião dela, muitas vezes é difícil conciliar todos os papéis vividos por uma mulher. “Vivemos numa sociedade que tem pressa em tudo, e onde as mulheres correm o dia inteiro para cumprir uma diversidade de tarefas. Trabalho, transporte, supermercado, casa, médico… Creio que a mulher tem muito a contribuir com as suas características inerentes, como a ternura, o carinho, os seus instintos, sem contar no esforço de criar um lar acolhedor”, observa.
Ao pensar no futuro, diz que tenta viver um dia de cada vez, “na esperança que Deus nos livre dessa pandemia terrível e nos ajude a lidar com seus efeitos. A pandemia trouxe muito desequilíbrio e incerteza. Portanto, tento focar nas possibilidades que se encontram ao meu alcance. Tenho certeza que teremos muito que aprender com essa época”.
Mulheres que inspiram
Uma grande inspiração para Susanne é sua mãe, que criou com esmero quatro filhos.
“Ela não teve uma vida fácil, pois renunciou de sua carreira para cuidar dos filhos e permitir trilhar caminhos por onde ela nunca foi. Sua maior preocupação foi que todos os filhos amassem a Deus e seguissem Seus caminhos. Também admiro as minhas avós. Minha avó paterna teve 12 filhos. Já minha avó materna possuía um gosto peculiar por dirigir (veículos, motos), além da aquisição dos gadgets tecnológicos da época (a primeira TV com controle remoto e o primeiro aparelho de fax eu vi com ela, por exemplo)”, lembra.
Além da família, Susanne se inspira em mulheres batalhadoras que não desistiram nunca. Como exemplo, cita Corie Ten Boon, que foi aprisionada na Segunda Guerra Mundial junto com sua família por esconder judeus em casa. Nos campos de concentração, perdeu grande parte dos parentes. Mesmo assim, não perdeu sua esperança e fé e usou isso para motivar outras mulheres a seguirem adiante. Tornou-se depois uma famosa palestrante, sendo seu maior momento quando perdoou o seu algoz.
Também admira a história de Erin Brockovich, pelo seu exemplo de força e determinação. Por fim, menciona como fonte de inspiração a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, “uma líder exemplar, que sem nenhum alarde ou grandes ostentações, cumpre seu papel com dedicação”.
Vulnerabilidade
Quanto à situação de vulnerabilidade da mulher, a advogada mostra-se preocupada, sobretudo com as meninas que engravidam ainda adolescentes, as mães que precisam educar seus filhos sozinhas e as mulheres vítimas de abuso.
“Tenho a impressão que vivemos um aspecto bastante cultural, um círculo vicioso que vem se repetindo. Penso que o melhor caminho seja a educação, na qualificação e na busca de melhores oportunidades profissionais. Penso também que o Estado deve olhar com carinho para essas mães e fornecer auxílio, até financeiro, visando reduzir a vulnerabilidade”, afirma.
Mensagem para as mulheres
Para concluir, Susanne deixa uma mensagem para as mulheres:
“Toda mulher importa! Toda mulher é especial! Temos uma grande função em buscar uma sociedade melhor e mais inclusiva. Não vejo que nossa meta seja concorrer com o mundo masculino, mas de trabalharmos em cooperação por um mundo melhor. Que não deixemos nunca de sorrir, mesmo quando o futuro não é promissor. Que não desanimemos de lutar por quem e aquilo que amamos. Que saibamos também renunciar para cuidar de outros. Que saibamos perdoar, quando preciso. Que não sejamos reféns de traumas e pessoas abusivas. Que sejamos sábias em aceitar o que não podemos mudar e mudar o que efetivamente está ao nosso alcance. Que nunca deixemos um coração para o próximo e suas necessidades. Que tenhamos paciência e perseverança em construir, sem alarde, um mundo melhor, pelo menos aos que nos cercam”.