O ano de 2023 começou com muitas novidades no âmbito tributário. Em que pese os direitos e garantias fundamentais serem instrumentos de proteção do indivíduo frente à atuação do Estado, no mês de fevereiro uma decisão, proferida pelo Supremo Tribunal Federal, causou ainda mais intranquilidade ao sistema de garantias.
Foi o julgamento do caso envolvendo a Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) cujo pano de fundo envolveu o alcance da coisa julgada.
Afinal o que é coisa julgada?
O conceito da coisa julgada nada mais é do que “a decisão judicial de que já não caiba recurso” (art. 6º, §3º, LINDB) e encontra amparo na Constituição Federal.
Tendo isso em mente, vale resgatar o ocorrido com as empresas que estavam questionando a CSLL judicialmente. Estas, em 1992, obtiveram decisão favorável no sentido de terem garantido o direito de não recolher mais a CSLL, inclusive albergados com a coisa julgada.
Entretanto, em 2007, o STF julgou Ação Direta de Inconstitucionalidade aplicando entendimento diverso, ou seja, determinando que o mesmo tributo (CSLL) seria constitucional e deveria ser recolhido por todas as empresas.
A partir de então, aquelas empresas que em 1992 obtiveram decisão favorável para não efetuar o recolhimento da CSLL, retomaram a discussão de não pagarem o tributo diante da coisa julgada que as amparava de qualquer decisão diferente.
Todo esse debate a respeito dos efeitos da coisa julgada, foi levado à atenção do STF. Foi então que, em fevereiro de 2023, o STF determinou a quebra automática da coisa julgada, de modo que que todas as decisões proferidas em ações diretas de constitucionalidade, ou em ações individuais com repercussão geral, devem interromper automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado.
Ou seja, em questões tributárias que se renovam periodicamente, a coisa julgada pode ter o seu efeito quebrado automaticamente sempre que o STF, em repercussão geral ou ADI, decidir de forma diferente sobre aquele mesmo tributo.
Não é difícil imaginar a situação em que uma empresa deixa de recolher um tributo por ter em mãos uma decisão transitada em julgado (albergada pelo manto da coisa julgada) declarando a inconstitucionalidade de um tributo ou a sua não incidência.
Ocorre que essa decisão do STF determinou que, se houver outro julgamento em repercussão geral (ou ADI) sobre o mesmo tributo, a empresa deve alterar sua forma de recolhimento de maneira automática, sob o risco de se tornar devedora.
É neste cenário que advogados, contabilistas e empresários mergulharam suas preocupações da noite para o dia. E foi assim que as empresas que discutiam a constitucionalidade da CSLL, num momento se viam saudáveis, e depois, rodeadas por um mar de dívidas.
Com o passar dos anos, a vida jurídica nos ensina que, por mais que os juristas se debrucem em buscar novas soluções aos embates sociais, mais perspectivas multiformes surgem. E isso acontece justamente porque o Direito não se isola da Sociedade, ambos são sistêmicos, e juntos se renovam.
Um efeito desta renovação são os Projetos de Lei que surgiram após esse fatídico julgamento, concedendo oportunidades de parcelamentos mais justos para as empresas afetadas pela quebra automática da coisa julgada (PL 515.2023, PL 26/2023, PL 580/2023 e PL 508/2023).
Portanto, o julgamento do STF de fato mudou a forma como as empresas se organizam financeiramente ao litigar contra a Fazenda Nacional. Todavia, não esgotou a força propulsora da sociedade empreendedora que se alumia, capaz de inspirar a advocacia tributária na criação de novos mecanismos de segurança jurídica.