Em entrevista coletiva na manhã desta sexta-feira (14), a Polícia Civil de Santa Catarina divulgou os detalhes da investigação sobre a chacina na creche em Saudades, onde um rapaz de 18 anos matou três crianças e duas professoras no dia 4 deste mês.
O delegado da Comarca de Pinhalzinho, Jeronimo Marçal Ferreira, responsável pelas investigações, descreveu o trabalho como complexo. Ferreira disse que Fabiano Kipper Mai, de 18 anos, tinha total consciência do que estava fazendo e muita pressa para matar o maior número possível de pessoas.
“Ele queria matar o máximo possível de pessoas. Agiu com este objetivo e estava com pressa. […] Ele tentava entrar numa sala, ia correndo para outra porque tinha pressa em atingir o objetivo dele”, disse o delegado.
O delegado explicou que a investigação foi fundo na vida de Fabiano.
“A gente aprofundou muito na investigação, na vida dele, na internet, por meio de relatos de testemunhas, interrogatórios, demos a maior profundidade possível. Ele agiu consciente do que fez, o tempo todo. Ele planejou a ação há vários meses desde o ano passado. Foi um crime premeditado”, relata o delegado.
A própria tentativa de suicídio após os assassinatos já estava nos planos do rapaz. “O próprio planejamento já incluía esta ação, ele admitiu, era a intenção dele”, disse o delegado.
Mais de vinte testemunhas foram ouvidas e os equipamentos eletrônicos de Fabiano passam por perícia – entre eles computador e celular – para elucidar a motivação do crime.
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Fabiano era uma pessoa isolada
Segundo o delegado, há um complexo contexto psicológico como pano de fundo nas razões dos assassinatos.
A polícia não detalhou o depoimento de Fabiano para “não expor terceiros e nem dar mídia ao autor”, conforme explicou Ferreira. O delegado relatou que o setor de psicologia da Polícia Civil ajudou a esclarecer o caso.
“Tivemos apoio de uma psicóloga Polícia Civil para tentar entender. Não quero ter a pretensão de entrar na cabeça do autor. Mas simplificando o que os elementos mostram para que todos possam entender: ele era uma pessoa muito isolada, com dificuldade de relacionamentos num nível muito acima do normal. Tem muita gente que é fechada e tem essa dificuldade, mas ele era mais”, explica Ferreira.
Segundo testemunhas, quando a família se reunia para jantar, por exemplo, em vez de sentar à mesa com os familiares, ele pegava o prato e ia para o quarto. Ele também não saía para comprar roupas, dava dinheiro para a mãe e ela comprava para ele.
“Nos últimos tempos ele foi se isolando no mundo dele, se isolando do nosso mundo. Entrou num mundo onde passou a ter contato com ideias violentas, material violento e com pessoas que pensavam parecido com ele”, resume o delegado.
As testemunhas confirmaram que ele andava “quietão, na dele e ninguém sabia o que se passava na cabeça dele ou que ele poderia fazer isso”, conforme informou Ferreira.
Fabiano tinha acesso a muito conteúdo inapropriado e “contato com pessoas com pensamentos e sentimentos ruins”, disse o delegado. “Não descarto a possibilidade [dele acessar a deep web], mas nada de concreto apareceu na investigação neste sentido”, explica Ferreira.
Alvo do ataque
Segundo a polícia, ele não tinha como alvo um grupo ou alguém específico. Num primeiro momento, a intenção dele era realizar o ataque na Escola Estadual Rodrigues Alves, onde havia estudado.
“Esse era o objetivo no início. Ele tentou adquirir uma arma de fogo, de várias formas, mas não conseguiu. Então ele achou que não daria conta de enfrentar os rapazes”, relata Ferreira.
Fabiano então comprou a faca usada nos crimes pela internet. Chegou na casa dele por encomenda cinco dias antes do ataque. Os familiares perceberam que ele tinha recebido a arma. “Não entenderam o motivo, mas chegaram a perceber”, relatou o delegado.
A arma foi comprada por cerca de R$ 400. “É uma faca. Tem suas especificidades, mas é uma faca”, explica Ferreira.
De acordo com o delegado, Fabiano considerou várias possibilidades e foi mudando de alvo com o tempo. Mas a partir do momento que a arma chegou, ele definiu o local do ataque.
“Ele atacaria qualquer pessoa em algum momento. Ele deixou claro que escolheu a creche pela fragilidade das vítimas. […] O que mostra que é um ato ainda mais covarde do que por si só já seria”, declarou o delegado.
Agiu sozinho
Apesar deste contato com outras pessoas, as investigações apontam que ele agiu sozinho. “Não há qualquer indicativo de que alguém tenha auxiliado, nada neste sentido. Ele agiu sozinho o tempo todo. […] Ele admitiu que planejou tudo e agiu sozinho”, afirma o delegado.
As investigações apontam que ninguém na família, da escola onde estudou ou do trabalho tinha ideia de que Fabiano poderia fazer o que fez. “Nunca exteriorizou nada”, disse o delegado.
Insanidade mental
O delegado responsável pela investigação disse que não há sinais de insanidade mental.
“Nada. Pessoa normal, tinha absoluta consciência do que fazia. […] O planejamento dele deixa isso muito claro, ele sabia o que fazia. Sabia exatamente o que fez desde o princípio”. Segundo Ferreira, isso foi confirmado pelo setor de psicologia da Polícia Civil.
“Ele tinha consciência de que o que ele fez foi errado, isso mostra o total discernimento que tinha. Ele planejou, sabia que estava errado e fez mesmo assim”.
Em seu depoimento, Fabiano disse que estava arrependido, mas o delegado declarou que não tem certeza se é um sentimento genuíno.
Prisão
O inquérito policial será enviado ainda nesta sexta-feira ao Ministério Público. Fabiano deve permanecer preso preventivamente no Presídio Regional de Chapecó até seu julgamento.
A Polícia Civil indiciou Fabiano por cinco homicídios triplamente qualificados e uma tentativa de homicídio, também triplamente qualificado. As qualificadoras são por motivo torpe, uso de meio cruel e meios que impossibilitaram a defesa das vítimas.