Pesquisa analisa percepção dos jaraguaenses em relação a vinda dos haitianos

Por: Elissandro Sutil

23/11/2017 - 11:11 - Atualizada em: 23/11/2017 - 11:56

Estima-se que em Jaraguá do Sul residam aproximadamente 500 haitianos. De acordo com a Secretaria de Assistência Social, os imigrantes podem acessar os programas oferecidos pelo município, recebendo o mesmo atendimento que os demais moradores. No entanto, dar condições para que possam trabalhar e conviver em sociedade depende, também, da maneira como a comunidade jaraguaense é impactada pela imigração. E foi exatamente isso que alunos do IFSC (Instituto Federal de Santa Catarina) foram pesquisar.

Em estudo realizado no ano passado para o programa Conectando Saberes, Eduarda Ribeiro, 17 anos, Jaíne de Souza, 16, Kauan Sbardellati, 16, Lia Hillesheim, 16, Luís Gustavo Prusak, 16 e Mayara Cantovick, 17, buscaram a percepção dos habitantes locais em relação a vinda dos haitianos. Além de pesquisa teórica, o grupo aplicou um questionário em diferentes bairros da cidade, centrando a análise sobre o modo como os cidadãos vêm compreendendo a chegada desse novo contingente populacional na cidade.

Para iniciar o trabalho, os alunos buscaram referências do município, mas alegam não terem conseguido dados oficiais. “Fomos atrás de informações sobre o número de haitianos em Jaraguá do Sul e onde residem. Entramos em contato com a Prefeitura, mas não obtivemos resposta. Por isso, acabamos utilizando dados aqui do IFSC, onde havia aproximadamente 40 haitianos fazendo o curso de Língua Portuguesa e Cultura Brasileira para Estrangeiros”, ressalta Kauan.

Segundo a secretária de Assistência Social, Maria Santin Camelo, existe uma associação que representa os haitianos no município, com aproximadamente 70 associados. A pasta se reuniu com entidades buscando parcerias para ajudar na inserção dos imigrantes. Ela diz que em outras cidades, instituições têm dado grande apoio para os haitianos. “Devemos acolhê-los como irmãos”, ressalta.

Durante o desenvolvimento do projeto, 204 questionários foram respondidos por habitantes de diversos bairros, como Nereu Ramos, Rio Cerro II, Vila Lenzi, Chico de Paulo, Nova Brasília, Jaraguá Esquerdo, Santo Antônio, Três Rios do Sul e Rau. Além disso, foram pesquisados comentários dos internautas em portais de jornais e blogs de Jaraguá do Sul. Um ponto que chamou a atenção dos estudantes diz respeito ao preconceito. “A gente achou que seria maior, só que a maioria respondeu não ter preconceito. No entanto, nas pesquisas que fizemos pela internet, notamos que é o meio onde elas se revelam mais preconceituosas. Lá, elas opinam de maneira mais aberta”, salienta Lia.

A haitiana Belienne Fiels, 28 anos, está há quase dois anos em Jaraguá do Sul. Desempregada, ela possui ocupações informais, como ensinar francês. Professora do ensino fundamental, ela deixou os pais para buscar um futuro mais próspero no Brasil. O objetivo é trabalhar e conseguir ajudar para a família.

Entre as principais dificuldades enfrentadas por quem chega está a comunicação. Belienne frequenta aulas no IFSC, mas ainda não domina a Língua Portuguesa, embora já entenda bem o idioma. Ressalta que a convivência com os brasileiros é essencial para que consiga desenvolver melhor a língua. “Entre nós, haitianos, falamos o francês crioulo, portanto, se as pessoas daqui não quiserem se aproximar e dialogar conosco, dificilmente conseguiremos aprender bem o português”, diz.

Belienne já recebeu muitos “nãos” por causa de sua cor e sabe de outros conterrâneos que também sofreram racismo. “Eu acho muito difícil para os haitianos viverem no Brasil. E, embora aqui em Jaraguá do Sul tenha muita gente boa, é difícil”, diz.

INDIFERENÇA TAMBÉM É PRECONCEITO

A pesquisa mostrou que muitos jaraguaense desconhecem as causas que levaram os haitianos a deixar o país de origem. Apenas a metade dos entrevistados sabia que o Haiti havia sido atingido por um terremoto em 2010. E, segundo os estudantes, apesar de não se declararem preconceituosos, os entrevistados revelaram certa indiferença quanto ao tema. O professor Gustavo Kern, orientador do trabalho, enfatiza que, embora as pessoas não se considerem racistas, a análise conjunta das questões mostra que não é bem assim. “Na questão que fala sobre preconceito racial as pessoas dizem que não, mas no conjunto dos dados fica muito evidente. Essa indiferença é produto do racismo. Embora, no trabalho, eles tenham sido muito cuidadosos ao tratar disso”, ressalta Kern.

O grupo afirma que houve receio e até mesmo incômodo relacionado ao tema. Muitas pessoas não quiseram responder a pesquisa. “Levamos mais de 20 dias para aplicar 204 questionários, passamos em mais de mil casas”, diz Kauan. No transcorrer das análises, os estudantes constataram que a presença dos imigrantes haitianos causa um impacto social relevante, digno de ser investigado por outras pesquisas de cunho sociológico. “Concluímos que seria importante que os imigrantes haitianos recebessem apoio tanto legal quanto institucional para virem para o Brasil, trabalhar de forma digna e exercendo funções em acordo com a formação escolar que receberam no Haiti, não ficando sua atuação profissional limitada aos postos de trabalho menos valorizados”, analisa Jaíne.

IMIGRANTES HAITIANOS TERÃO QUE DEIXAR OS ESTADOS UNIDOS ATÉ 2019

O governo dos Estados Unidos anunciou na segunda-feira (20) o fim do status de proteção temporária (TPS) para o Haiti, dando um período de 18 meses para que os 58.706 beneficiários da medida voltem ao seu país de origem ou busquem outra alternativa. Os imigrantes eram acolhidos pelo Status de Proteção Temporária (TPS, na sigla em inglês), a designação acaba em 22 de julho de 2019. A decisão ocorre duas semanas depois de o presidente do país, Donald Trump, ter encerrado o TPS para a Nicarágua, afetando 5.349 imigrantes. Eles terão 12 meses para voltar às suas casas. O TPS é um programa migratório criado em 1990 com o qual os EUA concedem permissões de forma extraordinária aos cidadãos de países afetados por conflitos bélicos ou desastres naturais, caso do Haiti que foi atingido por furacões. Nos últimos anos, os beneficiados viram sua permissão ser renovada automaticamente por períodos de 18 meses, mas agora o governo Trump decidiu reavaliar as condições que justificaram a concessão do programa.

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