Maruim: irritação provocada pelo mosquito pode estar perto do fim

Por: Elissandro Sutil

13/03/2018 - 07:03 - Atualizada em: 13/04/2018 - 16:36

O verão em Jaraguá do Sul e em toda a região costuma ser cruel e implacável. Para amenizar as altas temperaturas só mesmo usando roupas leves. O mais leve possível. Mas não é todo mundo que mora na região que consegue usar roupas curtas que possam amenizar o calor.

A gerente de frota da Prefeitura de Corupá, Andréia Miotto, por exemplo, é uma das pessoas que passa longe das roupas leves. Não porque ela não sinta calor ou não goste delas, longe disso. O motivo para ela usar roupas mais compridas no verão, comumente utilizadas nos dias frios, tem um nome e é bem conhecido na região do Vale do Itapocu: maruim. Conhecido também como mosquito pólvora, o inseto costuma provocar coceira, vermelhidão e até infecções em pessoas com alergia.

Moradora de um sítio da região rural de Corupá há cerca de dez anos, Andréia sofre com os maruins. Ela conta que não existe uma época do ano em que eles estejam mais presentes. “Você sente o ano inteiro, é insuportável”, diz. Para suportar, só usando roupas longas e deixando a casa fechada. Atividades comuns, como lavar louça, se tornam muito mais complicadas graças ao inseto que tem dado dor de cabeça aos moradores e autoridades da região do Vale do Itapocu. “É muito ruim, muito mesmo. Aqui, nós trabalhamos com as janelas fechadas e o ar condicionado ligado, porque o maruim simplesmente não deixa você trabalhar. Você não consegue lavar a louça de bermuda ou saia ou qualquer roupa curta. Você fica extremamente condicionado. Ou você fecha a casa inteira ou não consegue suportar”, afirma.

Porém, uma pesquisa em desenvolvimento está dando alguma esperança de que o problema pode ser amenizado e Andréia é prova de que ela está dando resultado. Após audiência pública realizada em Jaraguá do Sul, ela levou para casa uma amostra de um repelente desenvolvido pelo biólogo e pesquisador Luiz Américo de Souza, que tem como objetivo o combate ao maruim.

O creme, à base da planta alfavaca cravo, deu resultado. Segundo ela, a proteção é eficaz e de longa duração. “Nós recebemos um potinho que foi desenvolvido pelo pesquisador para testar e realmente foi maravilhoso. Eu, particularmente, só não gostei do cheiro, mas é uma questão de gosto mesmo. Passando na pele, os mosquitos simplesmente não pegam. Tem uma duração maior que o repelente industrializado. Dá pra ficar umas seis horas pelo menos, sem que te incomodem”, comemora. Ela diz que a família também já usou citronela, mas observa que a alfavaca cravo se revelou mais eficiente.

O repelente faz parte de uma pesquisa que ainda está sendo desenvolvida e não está sendo produzindo em larga escala, até porque, para isso existem outros processos que precisam ser aprovados, como a passagem da pesquisa e do projeto pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). E, embora a pesquisa já esteja na agência, conforme explica a secretá- ria-executiva da Amvali (Associação dos Municípios do Vale do Itapocu), Juliana Demarchi, o processo de liberação e, mais ainda, de fechar parceria com um laboratório que faça a produção, pode levar algum tempo. Reuniões já foram realizadas com laboratórios e novidades no que diz respeito à produção podem surgir no próximo mês, afirma a secretária.

Enquanto a Anvisa não dá uma resposta e o laboratório estuda a viabilidade de produção do repelente, que já foi aprovado por Andreia, ela e a família se viram como podem para espantar o inseto. Além de plantar a alfavaca cravo ao redor da residência, ela conta que a família costuma ferver algumas folhas, o que “protege” a residência.

Além disso, outras soluções mais caseiras têm sido desenvolvidas pela família de Andréia e tantas outras que sofrem com o inseto na região. “Parece que não há barreira suficiente para eles. O que foi um impeditivo interessante foi a fervura. Meu pai voltou da audiência muito empolgado, plantou a alfavaca cravo, é uma planta que inclusive nasce e se espalha com muita facilidade. E ele resolveu pegar umas folhas e ferver dentro de casa. Com este processo, a gente notou que dentro de casa ficou confortável. Não sei se é pelo cheiro, se existe alguma reação química, não faço ideia, mas dentro de casa ficou bem confortável. Tanto é que quando vem visita lá em casa a gente sempre dá uma fervida para amenizar”, explica. Além disso, ela conta que a família costuma fazer uma solução caseira para borrifar na pele com álcool e a planta.

Incidência em escola atrapalha atividades

Pomada e repelente desenvolvidos por biólogo podem ser aliados no combate ao maruim, evitando alergias como as de Ashley | Foto Eduardo Montecino/OCP

Já na Escola Municipal Francisco Mees, em Corupá, não há paliativo que funcione. Com cinco anos de idade, a pequena Ashley carrega nas pernas e braços as marcas de incontáveis picadas do inseto. Com o corpo coberto por cicatrizes e pequenas feridas causadas pelo maruim, Ashley e Laura são alunas da escola que precisou passar por adaptações para evitar que os alunos sofressem ainda mais. Todas as salas têm ar condicionado e é comum ver os alunos de calça e agasalho, mesmo no verão. Tudo isso para impedir a picada dos insetos e mesmo assim, ainda é difícil sair imune, como mostra Laura, de nove anos, que também tem os braços marcados por manchas vermelhas provocadas pela picada do inseto que, a olho nu, parece microscópico.

“Semana passada, era mais ou menos 7h30 e estávamos aqui fora, no pátio, cantando o hino e não tinha a menor condição de ficar quieto, sem se movimentar, sem espantar. Não tem como. No recreio, as crianças estão de calça, de agasalho, as professoras da educação infantil e do primeiro ano passam repelente nas crianças, não tem como levar elas para o parque e ficar sem repelente”, garante Viviane Kuhl, coordenadora da escola.

Saúde pública e economia local são prejudicadas sem ações de combate

Para Andréia Miotto, que recebeu um pequeno pote com a amostra do repelente desenvolvido pelo biólogo Luiz Américo de Souza, que desenvolve a pesquisa de combate ao maruim, a vida das pessoas que moram em Corupá e em toda a região do Vale do Itapocu está condicionada ao inseto e ela cobra uma posição firme com ações efetivas do poder público para amenizar o problema que, para ela, além de ser uma questão de saúde pública, também prejudica a economia local.

Andréia Miotto diz que atividades rotineiras são atrapalhadas por causa dos maruins | Foto Divulgação

“Por enquanto, está sendo uma solução e se não for isso, quanto mais pessoas se movimentarem para pressionar o Legislativo e as pessoas que devem se mexer para que corram atrás de uma solução, melhor ainda. O que não dá é para a população ficar a mercê, ficar condicionada ao maruim porque as autoridades lá em Florianópolis não estão muito preocupadas, porque não é um problema para eles”, destaca.

Ela ressalta ainda que, em princípio as soluções buscadas com base na alfavaca cravo são excelentes, já testadas e aprovadas por ela, mas que precisam ser mais bem produzidas e disseminadas. Para ela, a planta como insumo até facilita a busca da população porque tem custo baixo, é simples de plantar e manipular. “Tomara que seja ela a solução, mas se não for, que a pressão popular faça com que se busque alguma coisa, alguém precisa sim pesquisar. Alguém tem que fazer alguma coisa”, enfatiza.

Defensivo agrícola seria solução para reduzir população do inseto

Juliana Demarchi e Alessandro Rosá com folder com informações sobre o inseto | Foto Divulgação

A pesquisa, que já vem sendo desenvolvida há anos e que foi “abraçada” pela Amvali (Associação dos Municípios do Vale do Itapocu), em 2009, está sendo realizada pelo biólogo e pesquisador Luiz Américo de Souza e já rendeu alguns frutos, como o repelente testado por Andreia. O creme, feito à base de alfavaca cravo, minimiza e muito as picadas do maruim, conforme conta a gerente de frota de Corupá, mas, não é só isso.

A pesquisa, conforme explica Juliana Demarchi, secretária-executiva da Amvali, busca uma solução mais efetiva. Para ela, o repelente é uma boa solução, mas ainda é um paliativo e, para os problemas causados pelo inseto, o ideal é agir na causa. Por isso, o pesquisador desenvolveu, durante sua pesquisa de doutorado que deve se encerrar no mês de maio, um defensivo agrícola que agirá diretamente sobre os insetos e sua reprodução.

Juliana explica que este defensivo, pode ser encapsulado e aplicado nos locais em que o maruim se reproduz nas propriedades, fazendo um controle biológico e de “natalidade” do maruim. “Não é para exterminar 100%, a gente acredita que não vai conseguir exterminar, mas nossa expectativa é de reduzir de 50 a 70% a população do inseto na região”, afirma.

Para dar continuidade à pesquisa e às ações de combate, com testes, o laboratório de pesquisa já tem local e data para começar a funcionar. Anexo à secretaria de agricultura, o laboratório de pesquisa deverá servir para dar continuidade à pesquisa que se encerra em maio com o doutorado do biólogo. Segundo Juliana, até mesmo uma quantidade pequena do repelente poderá ser produzida no local enquanto todo o trâmite para a produção em larga escala prossegue. O laboratório, garante a secretária-executiva, começa a funcionar ainda neste mês de março, mesmo que timidamente e com os equipamentos iniciais. “Com o laboratório aqui em Jaraguá do Sul, a pesquisa fica mais próxima”, completa, lembrando que o biólogo trabalha e mora em Joinville.

Para Juliana, este é um momento importante da pesquisa, onde algumas ações já conseguiram ser desenvolvidas e testadas e que podem amenizar ou até mesmo solucionar o problema que afeta a saúde e a economia da região. “Estamos em uma boa evolução comparando com anos atrás. Nós não tínhamos dados, nenhuma expectativa de alguma solução, de um paliativo que seja, a própria pesquisa estava muito crua. Estamos bem felizes porque estamos chegando, provavelmente, em uma solução e isso vai ser bem positivo para a população”, finaliza.