Desenvolvimento: Crianças precisam de rotina com menos estímulos e mais experiências

Lúcio Sassi

Por: OCP News Jaraguá do Sul

10/07/2017 - 17:07 - Atualizada em: 11/07/2017 - 22:14

Por Ana Paula Gonçalves | Foto Lúcio Sassi/ArquivoOCP

Rotinas muito bem organizadas, horários definidos e uma série de atividades pré-determinadas para executar. Até parece o ambiente adequado para uma empresa. Mas esse tem sido o dia a dia vivenciado por muitas crianças. Cada vez mais, atividades de lazer descontraídas e que oportunizam o exercício da criatividade estão desaparecendo da agenda dos pequenos. Envolvidas em um roteiro de aprendizado cada vez mais rígido e focadas em brincadeiras eletrônicas junto à TV, computadores e celulares, as crianças estão apenas seguindo um padrão.

Para a psicóloga Liana Boeing, parceira do Projeto Por uma Educação Sensível e parte da equipe do OCP Infância, a ideia de que a criança tenha uma rotina traz organização para a sua vida, mas isso é bastante diferente daquilo que se presencia atualmente: crianças sem espaço de ócio, sem espaço para criar, fazer escolhas, manifestar suas verdades, enfim, sem espaço para brincar.

“A atividade mais importante e mais frequente no dia a dia da criança precisa ser o tempo livre para brincar. Estar ociosa, deparar-se com espaços vazios e com aquilo que não está pronto faz com que a criança se movimente de modo criativo, inventivo e transformador”, ressalta a psicóloga.

O mesmo movimento ocorre com os brinquedos: para a criança há pouco valor em prateleiras lotadas de objetos prontos e inventados pelos adultos para elas (e que muitas vezes acabam passando mais tempo na prateleira). Isso sem falar no excesso de jogos, celulares, desenhos televisivos e atividades não interativas que acabam permeando o espaço ocioso das agendas infantis, interferindo no desenvolvimento saudável ao proporcionar excesso de informação pronta e pouco contato consigo e com o mundo real.

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“A criança quer ser ouvida pelos pais ativamente”

A coordenadora do OCP Infância, Helena Almeida, mãe de Bento, três anos, e de Romeo, um ano, responde abaixo algumas questões sobre aprendizagem, comportamento e rotinas.:

OCP – Devido à capacidade de aprendizagem na primeira e segunda infância (zero a sete anos), as crianças são incentivadas desde cedo a uma série de atividades programadas. Como manter o equilíbrio dessa agenda e do brincar criativo?
Helena – O primeiro ponto importante é reconhecermos que a gente cria esse ideal de criança. E, idealizando muito, o meu filho deve, o meu filho pode, o meu filho precisa, deixamos de respeitar uma premissa básica. Todos nós, preocupados com o que virá, esquecemos uma coisa que um grande italiano já falava há muitos anos, que é a escuta ativa. A criança quer ser ouvida pelos pais ativamente. É uma escuta em que de fato você não traz o que a criança está dizendo para a dimensão do adulto, você escuta a criança em relação a ela mesma.

É importante saber o que realmente a criança quer fazer, o que realmente é importante para ela, quais seus interesses. E, não ouvindo a criança, caímos numa outra armadilha, que é o estímulo. Estímulo é totalmente diferente de experiência. As crianças, hoje, ficam muito cansadas de ficar repetindo aquilo que não é experiência para elas e que é só mais um estímulo nesse mundo bombardeado por estímulos (aprender línguas, praticar uma série de esportes e outras atividades rotineiras).

Não se entende a criança como alguém que faz do ócio um momento de criatividade. A questão é essa mesma: equilíbrio. Deixá-los viver novas experiências, ter mais contato com a natureza, incentivar coleções de pedrinhas e outros objetos com os quais possam criar.

OCP – Quando a criança faz birra, o que ela está tentando dizer?
Helena – Para mim, trata-se de escuta. Quando eu grito, é porque realmente a minha voz não está sendo suficiente. E a gente volta no conceito da escuta ativa, que nos diz que ou se tem um tempo de escuta, ou vamos ter essas crianças tiranas, que gritam e mandam.

O caminho é uma escuta ativa, uma escuta sensível. Se fosse uma dica, seria essa. Claro que há exceções, mas pensando na infância, em sua plenitude, eles têm de fato uma dificuldade, muitas vezes, para elaborar todas essas emoções e sensações, e o adulto faz o papel de mediador para colocar isso em palavras.

OCP – Como deixar a rotina menos cansativa e mais proveitosa/prazerosa?
Helena – É difícil, porque temos uma série de famílias, uma série de rotinas, há uma multiplicidade hoje em dia, até a configuração familiar mudou. Mas, de forma, geral, o grande problema é terceirizar esses filhos. A rotina se institui dentro das possibilidades da família. Então, se o meu filho precisa ficar na escola o dia inteiro, a rotina dele é uma jornada.

Tem pais que querem pegar a criança de banho tomado depois da escola, jantada, para chegar em casa e fazer dormir. De fato, consideram a criança um problema. Aí a gente cai na questão da escuta, na qualidade do tempo juntos, tudo de novo. Então, é preciso pensar essa rotina respeitando o tempo de cada um, de forma que se preconize o tempo da criança, que é o tempo de brincar, de experenciar, de estar livre. Precisamos sair do padrão, desconstruir.

Agenda de criança requer:

Menos brinquedos prontos e mais criatividade
Menos paredes e mais rua, natureza, ar livre
Menos plástico e mais terra, madeira, pedras, cores, formas, texturas
Menos tarefas e mais descobertas
Menos virtualidade e mais presença
Menos excessos e mais simplicidade
Menos modelos e mais liberdade

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