Relembrando a era das telefonistas: memórias fascinantes da chegada do telefone em Jaraguá do Sul

Foto: Portal Memória Brasileira

Por: Maria Luiza Venturelli

29/09/2023 - 07:09 - Atualizada em: 29/09/2023 - 10:20

Os telefonistas desempenharam um papel fundamental na história das telecomunicações e da sociedade em geral. Embora a profissão de telefonista tenha se tornado menos comum com o avanço da tecnologia, é importante ressaltar a importância que esses profissionais tiveram ao longo do tempo, e em Jaraguá do Sul não é diferente.

“Alô, telefonista, me liga com o número 5”. Seria assim o começo da conversa se em 1930 você quisesse ligar para o jornal O Correio do Povo. E claro, você teria que aguardar na linha uns por alguns minutos enquanto uma simpática profissional fazia a conexão do seu telefone com o telefone do jornal. Consegue imaginar a cena?

Não foi possível obter a data exata em que esse meio de telecomunicação, que revolucionou uma época, passou a operar em Jaraguá do Sul. Em 1878 os aparelhos chegaram a Florianópolis, em 1907 haviam telefones em Joinville. Em algum momento nos anos seguintes, a rede telefônica com os fios que carregavam a voz de um lado para o outro passaram a operar na cidade.

Os primeiros registros da chegada

Foto: Revista Galileu

O registro mais antigo encontrado foi justamente na capa do OCP de maio de 1930, onde ao lado do nome aparecia “Telephone n. 5”. Nos anúncios, o Hotel Central exibia o número 1 Notícias de 1934 apontavam reclamações à `”Companhia Telephonica Catarinense” (CTC) sobre as tarifas. De acordo com a publicação, uma ligação para Joinville com duração de três minutos teria passado de 900 “réis” para 2.100.

No Arquivo Histórico de Jaraguá do Sul, a informação mais antiga catalogada é referente a um edital em março de 1939 em que a Prefeitura abria concurso para empresas interessadas em explorar os serviços de telefonia na cidade. Possivelmente, uma demanda legislativa para regulamentar o serviço. O edital sinalizava, entre outras demandas, a necessidade de quatro telefones para o prédio, um para o hospital e um para o Fórum da Comarca.

Do outro lado da linha

Uma das figuras que leva a essa história é da emblemática Nair Enke, que em 1942 começou a fazer parte da trajetória da expansão da telefonia em Jaraguá do Sul. A simpática telefonista, falecida em 2011, é lembrada até hoje por muitas pessoas.

Nair começou como telefonista da Companhia Telefônica Catarinense (CTC) aos 16 anos e atravessou quatro décadas de transformação, se aposentando como gerente da Telesc por volta dos 60 anos.

As telefonistas foram peças centrais para a chegada dos telefones à rotina das pessoas. No início, a tecnologia era básica, com poucos números. Uma lista de 1948 exibe os 66 telefones que Jaraguá do Sul tinha naquele ano, e vale lembrar que nenhum usuário conseguia ligar diretamente para o outro, era sempre necessário passar pelo atendimento de uma telefonista.

A CTC, que funcionava próxima à Prefeitura Municipal, onde hoje fica o Museu Emílio da Silva, era um prédio concorrido. As telefonistas trabalhavam em turnos, de manhã até a noite, operando a central telefônica. Existiam canais com pequenos plugs redondos e uma luz que ficava vermelha quando chegava a chamada. A profissional se conectava para receber o pedido.

Profissionais da CTC em frente a sede, que ficava ao lado da Prefeitura, onde hoje é o Museu Emílio da Silva. Foto: Arquivo Histórico de Jaraguá do Sul

Então o usuário informava para onde queria ligar e começava a saga. Se fosse na própria cidade era mais rápido, bastava conectar pelo próprio painel com o telefone do vizinho, mas no caso de chamadas para outras cidades, a telefonista iria ligar para a atendente da central da cidade pretendida. Se era uma cidade muito distante, era preciso ir de ponto a ponto, conectando com a central mais próxima na direção geográfica do destino.

Esse processo poderia levar horas, ou dias, dado o tráfego. Enquanto pedia pela ligação, a telefonista ficava ali, girando a manivela que era responsável por gerar uma corrente que acionava um alarme na outra central onde a ligação seria recebida.

De acordo com informações apuradas, uma ligação para Curitiba naquela época demorava cerca de uma semana, a menos que fosse um caso de morte, porque não existia um equipamento moderno e potente capaz de levar um grande volume de informação. Existiam cabos ligando uma central na outra, que nos primeiros anos permitiam uma ligação por vez.

Reconhecidas por todos

Em uma cidade em desenvolvimento como era Jaraguá do Sul, todas as conversas telefônicas passavam por essas dedicadas mulheres. Elas faziam os pedidos e em muitos momentos acompanhavam a conversa para poder desligar a linha e anotar precisamente o tempo que o usuário utilizou o telefone e, assim, emitir a cobrança.

Era essencial manter sigilo total e discrição das conversas e pedidos de ligação, valores fundamentais para o serviço. Além, claro, da prestatividade, jeito comunicativo e disposição das telefonistas. Historicamente, as telefonistas são um marco na entrada das mulheres no mercado de trabalho em todo o mundo.

Um marco de tecnologia

Foto: Worknets

Hoje, descrever essas histórias parece coisa da “idade da pedra”. Mas para aquele momento, ir à central pedir uma ligação para Joinville era tão moderno quanto fazer uma chamada via Whatsapp para a China. De repente, era possível falar com parentes, conhecidos, sem precisar se locomover, apesar de muitas vezes a demora em conseguir a ligação fosse equivalente ao tempo de viagem.

Com o passar dos anos, os sistemas foram evoluindo. Por volta de 1957 começou a operar em Jaraguá do Sul o chamado DDO (Operadora Disca Direto) e as telefonistas realizavam apenas os interurbanos e internacionais – mais tarde modernizados com o DDD e DDI.

A CTC virou Cotesc (Companhia Catarinense de Telecomunicações), constituída pelo governo do Estado em 1969. Em 1974, a empresa estadual passou a se chamar Telesc. Foram mudanças lentas, que aconteceram ao passar das décadas. Haviam mais linhas, a rede foi sendo capaz de fazer a comutação, como é chamado o processo de interligar dois ou mais pontos entre si por meio de um sistema automático.

Sendo assim, gradualmente a figura de telefonista que fazia essa conexão pela central deixou de existir. Hoje, esses profissionais que viveram de perto aquele momento lembram com saudades e ressaltam como as novas gerações, que nasceram com internet e smartphones na mão, são incapazes de entender a importância daquele momento histórico.

*Reportagem reformulada com base em matéria publicada no Por Acaso em 20/11/2020

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Maria Luiza Venturelli

Jornalista apaixonada por contar histórias inspiradoras, formada pela Faculdade Ielusc