“Os quinze minutos eternos”

Foto Pixabay

Por: Raphael Rocha Lopes

09/06/2020 - 10:06

“♫ Agora é tarde como eu fui bobo em vacilar/
Mas não vou mais deixar passar aquilo que eu quiser fazer/
Ainda é cedo pra uma outra chance aparecer/
E dessa vez eu vou fazer de tudo pra ela acontecer.”
(Agora é tarde, Ultraje a Rigor).

Até onde as pessoas vão para aparecer? Andy Warhol falava que todo mundo teria seus 15 minutos de fama. A internet democratizou até isso: ficou muito mais fácil ter esses 15 minutos. Ocorre que eles podem ser eternos. Democratizou isso também: a vergonha alheia.

As pessoas estão cada vez mais propensas a se expor na internet, pelos mais variados motivos. Desde uma simples autoexposição ao ridículo, até a mortes em situações lamentavelmente bizarras (como nos casos de tentativas de selfies inusitadas).

O fato é que muitos perderam a noção do bom senso!

Exposição alheia.

Com o terreno fértil da grande rede, surgiram sites e perfis em redes sociais justamente para veicular, compartilhar ou comentar postagens originais estapafúrdias.

Esse movimento não é novo: no saudoso Orkut já existia. Há sites e perfis antigos especializados nestas situações, tanto para famosos como para desconhecidos.

O que deixa o contexto ainda mais surreal é que, muitas vezes, as sedizentes vítimas reclamam que outras pessoas republicaram a postagem constrangedora que elas próprias inicialmente deram vazão. Algo como a teoria do Homer Simpson: “A culpa é minha, eu a coloco em que eu quiser”.

Não sei se reclamam porque entendem que realmente tenham feito algo equivocado ou porque querem defender sua imagem, sua privacidade, ou, ainda, seus direitos autorais de fotógrafo.

Os diversos direitos.

Como se vê, a situação não é tão simples como algumas pessoas fazem supor. Em situações como essas discute-se direito à imagem, direito autoral, liberdade de expressão, entre outros institutos. Para tornar as coisas um pouco mais complexas, vale ler o que diz, por exemplo, este trecho dos termos de uso do Instagram:

“Não reivindicamos a propriedade do conteúdo que você publica no Serviço ou por meio dele. Em vez disso, quando compartilha, publica ou carrega conteúdo protegido por direitos de propriedade intelectual (como fotos ou vídeos) em nosso Serviço ou em conexão com ele, você nos concede uma licença não exclusiva, gratuita, transferível, sublicenciável e válida mundialmente para hospedar, usar, distribuir, modificar, veicular, copiar, exibir ou executar publicamente, traduzir e criar trabalhos derivados de seu conteúdo”

Ou seja, parece que quem publica qualquer coisa no Instagram não está muito preocupado com sua propriedade intelectual, eis que cede seus direitos, de forma gratuita. E este é só um pequeno exemplo dos dados que as pessoas abrem mão quando confirmam (normalmente sem ler nada) suas concordâncias nos aplicativos e redes sociais.

E quando for crime?

Em algumas cidades têm aparecido perfis em redes sociais que denunciam assediadores, mencionando nomes e dados diversos. Muitas vezes os relatos indicam fatos que caracterizam crimes.

Sem chance de defesa, os acusados são linchados publicamente e, na realidade, poucos têm consciência das consequências. Já se verificou que, em alguns casos, aqueles que se diziam vítimas, estavam apenas se vingando de algo bobo, e acabaram virando réus em processos criminais ou indenizatórios. Outras realmente foram vítimas, mas, às vezes, dificultaram o trabalho investigativo da polícia.

Embora a música que abriu o texto fale de alguém que congelou e vacilou por não chegar na menina que queria conhecer, no mundo virtual tem muita gente vacilando por publicar o que não precisa.