“♫ Vai dizer que você prefere o ódio ao amor?/ Então me diz neguinho… Qual é?/ Essa onda que tu tira, qual é?/ Essa marra que tu tem, qual é?/ Tira onda com ninguém, qual é?/ Qual ,é neguinho? Qual é?” (Qual é?; Marcelo D2).
Nos últimos anos, temos presenciado a proliferação do ódio na internet, sufocando espaços que deveriam ser de troca saudável de ideias e de aprendizado. A polarização, intensificada pelas bolhas criadas pelas redes sociais e pela superficialidade do conhecimento tem transformado a internet em um campo de batalha onde a marra e a intolerância reinam.
Mas, então, qual é a razão desse fenômeno? Como se chegou ao ponto onde o ódio se tornou uma resposta quase automática, uma forma de marcar território virtual? A resposta não é simples, mas passa por uma análise profunda do comportamento digital, da educação (ou falta dela) no uso das ferramentas tecnológicas e do seu impacto transformador — muitas vezes, devastador — que a internet pode ter sobre nossas interações cotidianas.
E tudo isso regado, muitas vezes, com pitadas de preconceito. Ou, mais precisamente, com conchas, e não pitadas, de preconceito.
O ódio como refúgio
Hoje a pergunta “qual é?” do Marcelo D2 pode ser entendido como um desafio direto à lógica daqueles que se escondem atrás da marra virtual. Essa pergunta deveria ser feita por todos nós cada vez que esbarramos com internautas anônimos ou assumidos vomitando seu ódio quase desesperado.
O fato é que tem se constatado que nas redes sociais, o ódio muitas vezes se manifesta como uma forma de refúgio, um lugar onde se pode descarregar frustrações. A polarização acentuada só intensifica esse comportamento, criando um ambiente onde a divergência de opiniões se transforma rapidamente em ataques pessoais.
A superficialidade com que as informações são consumidas na internet contribui para esse quadro. Em um mundo onde tuítes e postagens com poucos caracteres ditam a pauta do dia, o conhecimento profundo e as nuances das questões são deixados de lado. O resultado? Discussões rasas. O objetivo não é compreender o outro, mas vencê-lo. Se possível, destruí-lo. O ódio encontra terreno fértil.
As bolhas de (des)informação, criadas e reforçadas pelos algoritmos das redes sociais, são combustível na disseminação do ódio. Conteúdos que reforçam as crenças e valores dos usuários contribuem para a distorção da percepção da realidade, fazendo com que esqueçam que existe um mundo lá fora, com pessoas que pensam e vivem de forma diferente. E que das diferenças surge o progresso e a evolução.
Essa fragmentação do espaço digital alimenta a polarização, que por sua vez, alimenta o ódio. Dentro das bolhas, a divergência de opinião é vista como uma ameaça, e o outro, que pensa diferente, é desumanizado, transformado em inimigo a ser combatido. A capacidade de dialogar, de encontrar pontos em comum, é sufocada pelo ruído ensurdecedor das discussões normalmente vazias e sem sentido.
A educação digital: um antídoto
Se a proliferação do ódio na internet é uma doença, a educação digital é o antídoto. É necessário aprender a usar as ferramentas tecnológicas com responsabilidade, a entender o impacto das palavras, a reconhecer as armadilhas das bolhas temáticas e, acima de tudo, a valorizar o conhecimento.
Desenvolver o senso crítico é, agora, uma questão de sobrevivência da sociedade. Ou, pelo menos, da sanidade mental da sociedade. Respostas simplistas e soluções mágicas não resolverão os problemas que se avizinham nesses tempos digitais sombrios.
É preciso pensar como usar a tecnologia para construir pontes, não muros; para promover o diálogo, não o conflito; para ampliar o conhecimento, não o superficializar. Isso exige um esforço consciente de cada um de nós e de toda a sociedade em conjunto.
Quando Marcelo D2 pergunta “qual é?”, ele nos provoca a refletir sobre nossas escolhas. Na internet, assim como na vida, podemos optar pelo amor ou pelo ódio, pela compreensão ou pela intolerância, pela informação ou pelo conhecimento. A proliferação do ódio na internet não é inevitável.
É imprescindível educar, buscar o conhecimento profundo, resistir à tentação da polarização fácil e, acima de tudo, tratar o outro com respeito, mesmo nas divergências. Porque, no final das contas, a internet reflete o que somos como sociedade. Se queremos um mundo melhor, precisamos começar por nós mesmos. E aí, “qual é”?