O contexto da política brasileira tem nos proporcionado cenas e situações “nunca dantes” imaginadas. A instituição política, maculada pela corrupção, tem se transformado em palco, arena e, recentemente, picadeiro para as mais inusitadas exposições e interpretações dos mais variados personagens. A política palaciana do presidencialismo de coalizão que impera no Brasil, se transformou num grande teatro circense. Faz-se mister salientar, diga-se de passagem, que o gênero circense, dado a essência e beleza de sua arte, é palco indigno para comparação de tal peça, já que nessa dimensão, e para decepção de Oscar Wilde, “a vida não imita a arte”.
Quem acompanhou a seção de votação do relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO), da Comissão Especial de Impeachment, na última segunda feira, sem entrar no mérito técnico do teor do relatório, tampouco preferências de lados, assistiu a uma verdadeira tropelia pastelão circense. É provável que parte considerável da plateia telespectadora, desprovida de serenidade e senso artístico, não tenha percebido o papel representado por cada membro desse elenco. Particularmente, nos panegíricos e impropérios que fundamentaram as justificativas de voto de cada parlamentar, me foi possível identificar a personificação do domador, do malabarista, do acrobata, do trapezista, do equilibrista, da bailarina e, notadamente, do palhaço.
Curiosamente, na medida em que esse espetáculo mambembe avança, dando sinais de desfecho sombrio, vão se revelando na plateia do “respeitável público”, nos quatro cantos da Nação, insólitos coadjuvantes ávidos e furiosos, providos de suas utópicas retóricas, em busca de uma nova ordem. Paulatinamente vão se desvendando, dessa marcha “thriller”, espectros de William “Bat” Masterson, orientando mirar na virilha para acertar o coração e pôr ordem na casa; Antonio Conselheiro, profetizando a política missionária para santificação do sistema; “dreamer” Dom Quixote, de lança em riste, proclamando a altruística ordem de “síndico” do condado. A marcha vai tomando corpo. Como conjunto da obra, o que temos de mais real nisso tudo, é o espaço democrático possibilitando a encenação de todos.
Então, enquanto procuro no meio da marcha “thriller” o espectro de Raul, prefiro ficar “eu do meu lado aprendendo a ser louco, um maluco total, numa loucura real, controlando minha maluques, misturada com minha lucidez”. Certamente, dos polos extremos surgirá a força moderada e lúcida para a produção dos próximos espetáculos.