Ofender a memória de alguém em redes sociais é crime e pode dar cadeia

Caso recente de feminícidio traz à tona um crime cada vez mais comum na era digital: o vilipêndio | Foto Reprodução/Redes Sociais

Por: Rosana Ritta

19/08/2018 - 16:08 - Atualizada em: 20/08/2018 - 09:27

Vilipêndio. Esta palavra difícil e muito pouco usada tipifica um crime que não é novo, pois está previsto no Código Penal Brasileiro, promulgado em 1940, mas está se popularizando a partir de agora, com o fenômeno das redes sociais.

“Muitas vezes, ao fazer comentários nas redes sociais a respeito de alguém que morreu, de forma a desprezar sua memória, as pessoas não têm noção, mas podem estar incorrendo no crime de vilipêndio de cadáver”, advertem as advogadas Luana Leier Soares Casanova e Ghazaleh Parham Fard.

Luana e Ghazaleh são autoras de uma notificação assinada no dia 9 deste mês e que desde então já foi enviada para dezenas de internautas, advertindo-os de que estão vilipendiando a memória de Andreia Campos Araújo.

A jovem de 28 anos foi assassinada no dia 5 deste mês pelo companheiro Marcelo Kroin, 38, na casa em que moravam no bairro Jaraguá Esquerdo, em Jaraguá do Sul. Embora Kroin tenha argumentado que foi um acidente durante uma briga do casal, a perícia apontou que ela foi asfixiada.

Em função da enorme repercussão do crime, tipificado como feminicídio – perseguição e morte intencional de pessoas do sexo feminino, por causa do seu gênero -, as redes sociais de vítima e suspeito foram inundadas por centenas de mensagens.

Andreia Campos Araújo, vítima de feminicídio ocorrido no dia 5 de agosto | Foto Reprodução Facebook/Rede OCP News

A maioria lamenta o crime, mas alguns julgam a vítima e sua conduta ao exibir na rede social um relacionamento que parecia perfeito, com uma profusão de presentes, jantares, passeios e juras de amor.

Prazo para exclusão de comentários

A notificação dá um prazo de 24 horas para que procedam a total exclusão de comentários considerados vexatórios e depreciativos que escreveram na página da jovem, sob a pena de os familiares registrarem Boletim de Ocorrência pelo crime de vilipêndio de cadáver. A família também não descarta o ajuizamento de ação por danos morais.

As advogadas lembram que algumas manifestações sobre a conduta da vítima chegam a ser crueis e aumentam o sofrimento da família, que já tem que conviver com a dor da morte precoce de Andreia, “morta por uma fatalidade de ser humano algum merece ser vítima, como ela foi”.

“Para a família, o que interessa é que Andreia era uma pessoa muito boa, querida e com muita vontade de viver”, destacam. Segundo as advogadas, a família pede que não se respeite somente a memória da vítima, mas também o relacionamento dela com o suspeito, o analista de sistemas Marcelo Kroin.

“Era um relacionamento verdadeiro, ela era feliz com ele e estavam realmente apaixonados”, frisam as advogadas, que entendem que as críticas ao próprio suspeito acabam por macular a memória de Andreia e a privacidade dela. E lembram que agora, com a confissão do assassinato, cabe à Justiça decidir o destino de Marcelo.

A família entende que muitos comentários são bem intencionados, mas não quer ver julgamentos a respeito da vítima, que não está mais aqui para se defender.

“A verdade e os fatos serão sempre verdade e fatos”

“Me senti um pouco intimidado por falar a verdade”, disse um dos internautas que recebeu uma das notificações encaminhadas por uma das irmãs de Andreia.

“Os fatos são incontestáveis e a dignidade e os valores humanos não pode ser mudados. A mente, o instinto humano e o dinheiro são uma grande cilada na sociedade”, escreveu ele, que admite que comentou que Andreia havia o procurando oferecendo serviços de garotas de programa.

Ele também conhecia Marcelo quando o mesmo era casado com outra pessoa, na condição de prestador de serviços para sua empresa, e diz que ficou surpreso quando soube que ambos estavam juntos, porém entende que “nada disso justifica tirar a vida de uma pessoa”.

Vilipêndio

O que é?

É o ato de fazer com que alguém se sinta humilhado, menosprezado ou ofendido, por meio de palavras, gestos ou ações.

Objetos também podem ser vilipendiados, quando são tratados com desdém ou desrespeito.

É crime?

Sim, este crime está previsto no artigo 212 do Código Penal Brasileiro. Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940.

Qual a pena?

O ato de vilipendiar cadáveres ou suas cinzas, pode ser punido entre um a três anos de reclusão e pagamento de multa.

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