Polícia Civil de Criciúma indicia líder religioso por 15 crimes de violação sexual mediante fraude

Por: OCP News Criciúma

23/03/2021 - 18:03 - Atualizada em: 23/03/2021 - 19:10

A Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso (DPCAMI) de Criciúma concluiu inquérito policial, instaurado em novembro de 2020, quando algumas mulheres, vítimas de violência sexual, resolveram romper o silêncio e procurar a polícia.

Segundo a Polícia Civil, foram registrados boletins de ocorrência virtuais, seguindo-se a instauração de inquérito, e colhidos diversos depoimentos, das vítimas e de testemunhas, realizada prova pericial, apreensão de aparelho celular, entre outras medidas.

“Apurou-se que o investigado era pastor de igreja evangélica com denominação própria, a qual funcionou nos municípios de Balneário Rincão, Forquilhinha e Criciúma, contando ainda com encontros religiosos realizados em outras cidades e regiões de Santa Catarina”, informou a corporação.

De acordo com a investigação, o indiciado era tido como profeta e operador de milagres, bem como dotado de dons mediúnicos, incorporando os anjos dos fiéis. Eram realizadas cerimônias e rituais, fora da igreja, nas casas dos seguidores ou em áreas de mata, em que que havia sessões individuais de atendimento do pastor aos seguidores, homens e mulheres. Eram nessas sessões que os fiéis acreditavam conversar com o anjo de cada um, supostamente incorporado no pastor.

O investigado realizava demonstrações de supostos milagres e exercia forte domínio sobre os fiéis, convencendo-os da existência e da incorporação dos anjos.

Segundo o delegado Fernando Guzzi, as provas colhidas demonstram que os seguidores do indiciado foram ludibriados de tal modo que efetivamente acreditavam que tratavam com o seu anjo, e não com o pastor.

Havia inclusive alteração da voz e das feições faciais, além de um elaborado estratagema para convencimento dos fiéis, envolvendo desde atos de demonstração de poderes sobrenaturais a “adivinhações” sobre segredos das vítimas.

“Apurou-se que algumas fiéis mulheres, muitas em situação de desespero por problemas de saúde, familiares, financeiros, etc…, foram convencidas pelo indiciado que, para obterem a cura física e espiritual almejada, deveriam consentir com práticas sexuais. Embora a possibilidade de haver outras vítimas, três mulheres resolveram procurar a polícia e concordaram em depor sobre os fatos. Em relação a elas, foi comprovado um total de 15 atos de violação sexual mediante fraude, crime apenado com até seis anos de reclusão e multa (cada um) e que ocorre quando a vítima é enganada, mediante fraude, a consentir com a prática sexual”, detalhou o delegado.

Não é qualquer fraude ou engodo que configuram o delito, explica o delegado, mas apenas em casos em que a vítima tem sua manifestação de vontade totalmente viciada pela fraude do autor.

No caso, o autor se valeu de momentos de extrema fragilidade e vulnerabilidade das vítimas, bem como de sua forte crença religiosa e confiança no guia espiritual, contando com elaborado plano para conseguir seus intentos.

Vítimas

Além das três mulheres vítimas de violação mediante fraude, a investigação identificou ainda outras duas fiéis, que não concordaram em praticar relações sexuais com o suspeito.

Porém, nas sessões individuais, sem a autorização das vítimas, ele praticou atos libidinosos contra elas, sem o emprego de violência ou grave ameaça. Foi indiciado então por mais dois crimes de importunação sexual, com pena de até cinco anos de reclusão cada.

Por fim, uma vítima ainda teve fatos íntimos divulgados pelo autor, havendo a prática ainda de crime contra a honra apenado com até quatro anos de reclusão e multa.

As vítimas possuem entre 28 a 56 anos. O indiciado tem 43 anos e respondeu ao inquérito em liberdade. Os fatos ocorreram entre os anos de 2018 e 2020.

Lei não autoriza prisão

O delegado esclarece que o indiciado não mais trabalha como pastor, atendeu às intimações policiais, comparecendo com seu advogado, e mantém atualizado o endereço perante a Polícia Civil. Por tais motivos, aliado ao fato de os crimes terem ocorrido até cerca de um ano antes do início da revelação do caso à polícia, a lei não autoriza a prisão preventiva.

“A DPCAMI enfatiza o respeito dos profissionais de segurança pública a todas as religiões e reconhece a importância dos líderes religiosos para a sociedade, tratando-se o presente caso de exceção. A investigação se pautou pelo respeito à liberdade religiosa e se alertam possíveis vítimas (de todas as religiões ou práticas de fé) a procurarem a Polícia Civil e romperem o silêncio, para que os crimes sejam apurados e seja combatida essa prática que infelizmente está em evidência no Brasil”, ressaltou a corporação.