“Não existe segurança pública só com polícia”, defende presidente da Anaspra

Por: Schirlei Alves

23/04/2018 - 05:04 - Atualizada em: 24/04/2018 - 10:50

O presidente da Associação Nacional de Praças (Anaspra) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, sargento Elisandro Lotin, concorda com a intervenção policial para retomar o domínio das comunidades até então expostas a controle de facções criminosas.

Porém, critica a falta de planejamento do Estado para manter os índices de violência reduzidos e a lentidão em colocar em prática ações sociais que deveriam ser efetivadas e contínuas nos locais mais carentes e vulneráveis.

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As mortes em intervenções policiais estão em ascendência desde o ano passado (que registrou aumento de 26,2%). No primeiro semestre deste ano, o crescimento foi ainda maior (71,4%). Se a violência reduziu, por que a letalidade policial aumentou?
Elisandro Lotin:
A polícia voltou a fazer policiamento ostensivo, voltou a fazer operações que não vinha fazendo desde então porque não tinha dinheiro e a polícia civil começou a investigar mais (não é fruto de agora, já vinha fazendo). Por consequência, os resultados estão aparecendo agora. No caso da PM, tem mais gente na rua para a atividade fim. Quando tem mais policial na rua, inevitavelmente vai ter confronto.

A estratégia do Estado é usar a força policial para retomar os espaços dominados pelo tráfico para depois intervir com ações sociais. O senhor concorda com essa estratégia?
Lotin: 
A curto prazo, o coronel Araújo tem feito o que tem que fazer que é retomar o espaço, não tem jeito. Principalmente em Florianópolis e Joinville. Um crime organizado que está armado, vai gerar confronto e morte, lamentavelmente. Mas, isso é a curto prazo. Agora, tem que pensar em médio e longo prazo para manter esse controle de forma permanente e isso se faz com políticas públicas preventivas. Tem que entrar o Município, o Estado, a assistência social, a educação, a saúde. Senão, vai acontecer como no Rio de Janeiro. As Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) entraram e retomaram espaço, mas o resultado não veio, aí voltou a ser como era antes. O que falta é planejamento, inclusive envolvimento da sociedade nesse processo.

Como você acha que deveria ser esse planejamento para manter o controle?
Lotin: A comunidade vai ter que se envolver também. Os órgãos precisam assumir definitivamente que a segurança pública não é só um problema de polícia, até a imprensa tem importância nesse processo. Agora, demonizar a policia, não vai resolver o problema. Ela tem problemas sim, inúmeros, e precisa haver outras formas de atuação. A polícia, o judiciário e os outros órgãos precisam descer do pedestal e a comunidade tem que se abrir para ajudar. As políticas sociais têm que ser permanentes, do contrário é utopia.

A Vila União é uma das comunidades que foi alvo de intervenções policiais e está pacificada. Mas, as ações sociais demoram a começar. Esse período de ausência do Estado é um risco para retomada das facções?
Lotin: Sim, o Município, o Estado, o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Associação de Moradores, todos já tinham que estar lá dentro tratando os métodos de política pública de prevenção. Por enquanto, há verba sendo investida na polícia. E quando acabar o dinheiro? Vai ter um aporte financeiro permanente para que se mantenham as estruturações? Quando retomar o espaço, os outros órgão vão ter que atuar, senão, vamos voltar e enxugar gelo. A estratégia tinha que ser mais eficaz e mais rápida, todos tem que botar a mão na massa. Não existe segurança pública só com polícia, é muito mais complexo do que isso e a nossa sociedade não consegue entender.

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