Dois temas já debatidos em um grande número de cidades do país agora chegam com força à pauta na região. O Escola Sem Partido e a proibição da ideologia de gênero nas escolas devem, inclusive, ser analisados pela Câmara de Vereadores de Jaraguá do Sul. Envoltos em polêmicas e sendo retrato da divisão que vive o Brasil, os dois projetos levantam paixão e ódio. De um lado, há quem defenda que tanto uma quanta outra iniciativa tem o objetivo de evitar a doutrinação, seja partidária ou comportamental, e proteger a família tradicional. De outro, os que acreditam que o que se quer é promover a censura e o preconceito.
Como os dois temas afetam diretamente o ambiente escolar e, em consequência, familiar, o promotor Rafael Meira Luz, da Infância e Juventude e Direito do Consumidor, tem sido bastante requisitado. Nesta quita mesmo, ele participa de uma reunião na Câmara de Vereadores com integrantes do movimento Escola sem Partido. A previsão é que um projeto de lei seja protocolado no Legislativo nos próximos dias com autoria coletiva de parlamentares.
A outra proposta, a da proibição da ideologia de gênero, já foi protocolada, tendo autoria do vereador Jackson Ávila (PMDB). Juridicamente, o promotor Rafael Meira Luz argumenta que não vê problemas nas iniciativas e pessoalmente admite simpatizar com os projetos. O promotor diz ainda que é preciso chamar a comunidade para o debate. E é aí que faz uma crítica aos sindicatos e aos movimentos de esquerda. “Quando o sindicato fala todo mundo para e escuta. O contrário não acontece. A esquerda tem dificuldade com a democracia, não gosta de ouvir.”
Vários setores da sociedade travam uma luta bastante intensa em relação a temas que afetam a rotina escolar como o Escola sem Partido e a proibição da ideologia de gênero no âmbito da educação. Como promotor da Infância e Juventude, acredita que esses debates podem ser benéficos às crianças?
Todo debate é importante. Independentemente de concordar ou não concordar. É importante que as pessoas busquem informações, leiam sobre os projetos e saibam sobre o que se está falando. Não pode ser no acho que pode ou acho que não pode. São temas que tratam da infância, educação, duas questões essencialmente sensíveis em uma democracia. Todas as vezes que se tentou suprimir a democracia se passou por esses dois temas, moral e educação.
Especificamente sobre o Escola sem Partido. Alguns professores acreditam que se projeto de lei nesse sentido for aprovado haverá uma volta à censura. Qual seu entendimento?
O projeto de lei não introduz nenhuma penalidade que já não esteja prevista nas leis que regem a educação e essa relação. A lei não inova nesse sentido. O que o projeto de lei traz são esclarecimentos de direitos, inclusive previstos em tratados internacionais. Nada que o Brasil não tenha já se comprometido a fazer. Um dos pontos que o projeto prevê é que ao falar de questões políticas e econômicas, o professor as trate de forma justa trazendo as diferentes vertentes. Não vamos ser bobos, nem demagogos, todo professor, toda pessoa quando expõe um fato sempre esse fato vem carregado com seus valores morais, sociais, políticos, culturais. Não fosse assim, as aulas seriam dadas por robôs, as sentenças seriam dadas por robôs.
Na prática, vamos imaginar um professor extremamente marxista ou liberal na economia. O marxista pode falar para os alunos que acredita que a Revolução Russa foi positiva, mas ele tem a obrigação de dizer que alguns intelectuais mostram que houve um massacre de ucranianos, que o movimento foi desumano. A grande sacada do projeto é garantir a pluralidade. O professor pode dizer que ele pensa dessa ou daquela maneira, mas ele tem que mostrar que existem outras teorias e quais são, pelo menos as duas principais, antagônicas. Ele também não pode querer que o aluno pense como ele e nem exigir essa visão na prova. Se o aluno escrever na prova que o marxismo foi uma droga e mostrar fundamentação, o professor não pode dar zero.
“Não posso ser professor de inglês é ficar
falando “Fora Dilma”, por exemplo.”
O professor de matemática, então, ficaria impedido de dar a sua opinião política?
Professor de matemática nem se cogita falar de política. Isso não é liberdade de cátedra. Liberdade de cátedra é dentro do conteúdo pedagógico, não para falar sobre o que o professor quiser. Não posso ser professor de inglês é ficar falando “Fora Dilma”, por exemplo.
E sobre o projeto de lei já apresentado que proíbe a ideologia de gênero nas escolas?
Eu não li o projeto ainda. Essa questão é um pouco mais delicada. Temos que separar ideologia de gênero, teoria de gênero e política de gênero. O debate é um mesmo um tanto confuso, para uma ala religiosa, a ideologia de gênero quer acabar com a família, prega que não existe diferença entre feminino e masculino, que isso é uma construção social. Já os defensores dizem que o que se quer é diminuir o preconceito, as desigualdades, a violência a que homossexuais, principalmente, estão sujeitos.
Isso de acabar com a violência e o preconceito, isso é política de gênero, não ideologia. Isso pode e deve ser abordado na escola. O que não pode ser abordado na escola é sobre moralidade sexual, isso é questão da família. E não são os conservadores que pregam que a ideologia de gênero diz que todos nascem com sexo neutro. Não são os religiosos. Quem diz que não existe gênero são os próprios ideólogos de gênero. Eles é que dizem isso.
Talvez eu tenha me expressado mal, a bancada religiosa afirma que a ideologia de gênero a ser implantada nas escolas seria para reforçar a ideia que não existe gênero e há uma corrente, de professores, que alega que não é esse o foco, que o que se quer é combater o preconceito.
Todos os textos que falam sobre gênero, desde o século 20 até documentos das Nações Unidas, vão no sentido de dizer que o gênero é neutro e se constrói socialmente.
Mas o senhor acredita que os professores vão fazer isso nas escolas?
Já estão fazendo. É uma realidade muito presente. Sobre esse projeto de lei (apresentado em Jaraguá do Sul pelo vereador Jackson Ávila), se a base curricular comum for aprovada, esse projeto perde o sentido. A grande discussão é nacional. As políticas de gênero devem ser inseridas no contexto escolar. Combater o preconceito. O professor deve dizer que um menino homossexual não é menos que um heterossexual, que a menina não é menos que o menino. Isso é totalmente necessário na escola. Mas não é isso que está sendo discutido. Essa não é a finalidade da ideologia de gênero. A ideologia de gênero desconstrói a identidade humana.
Não sou eu Rafael, promotor, católico, quem está dizendo isso, são os teóricos do movimento. Minha dificuldade como pai e promotor da infância é você introduzir na escola a noção da neutralidade de sexo. Isso não tem base científica nenhuma. Isso não nega que existam pessoas homossexuais, transexuais, bissexuais, assexuadas, mas só existem dois sexos. Esse pessoal não quer combater a discriminação, isso já está na lei. Esse pessoal não está sendo honesto intelectualmente no debate.
“O que eu quero é muito claro: defender a família. E eu não
vou parar de bater nisso. Eu não vou parar de bater no que for contrário à família.”
O que eu quero é muito claro: defender a família. E eu não vou parar de bater nisso. Eu não vou parar de bater no que for contrário à família. As pessoas têm que pensar que tipo de escolas querem para seus filhos, essa é uma discussão democrática. E quando a escola for tratar de temas polêmicos, tem que entrar em contato com a família. Por exemplo, a escola vai fazer uma semana contra o preconceito e daí resolve trazer uma palestra do Pablo Vittar, isso não é combater preconceito. Combater preconceito é mostrar como é ruim ser alvo dele por ser diferente. Não precisa colocar um drag queen com uma calcinha rebolando, isso não combate o preconceito, isso dá mais raiva. Tem que criar empatia e não forçar uma realidade que não é natural.
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