O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli rejeitou pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para suspender a acareação no caso envolvendo o Banco Master e manteve a audiência marcada para o próximo dia 30 de dezembro, em pleno recesso do Judiciário. A decisão intensificou críticas de parlamentares da oposição e de juristas, que apontam possível desvio de competência, quebra de jurisprudência e tentativa de intimidação de técnicos do Banco Central.
A acareação colocará frente a frente Daniel Vorcaro, controlador do Banco Master, um técnico do Banco Central que apontou indícios de fraude, e o ex-presidente do BRB. O procedimento foi determinado sem solicitação da Polícia Federal ou do Ministério Público, o que, segundo críticos, contraria o entendimento consolidado de que juízes não devem conduzir investigações.
O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) – autor de um dos pedidos de criação da CPMI do Banco Master no Senado – ironizou a decisão e afirmou que marcar uma acareação durante o recesso, sem provocação dos órgãos de investigação, “é a coisa mais comum do mundo” — em referência crítica ao episódio. Para ele, o caso simboliza o que chamou de “passar pano” para ministros do Supremo.
“A defesa da democracia virou desculpa para qualquer canalhice”, disse o senador, que também mencionou a possibilidade de impeachment de ministros de cortes superiores.
O deputado Carlos Jordy (PL-RJ) classificou o episódio como “um crime de dimensões nunca antes vistas” e cobrou uma reação do Senado.
“Toffoli puxou para si a competência para julgar a ação do Banco Master, impôs sigilo absoluto e agora coloca no mesmo patamar quem fiscaliza e quem é fiscalizado. Isso soa como tentativa clara de intimidar técnicos do Banco Central”, afirmou.
Já deputado Gustavo Gayer (PL-GO) afirmou “nunca um ministro agiu de forma tão desesperada para blindar a si mesmo e seu colegas”.
Além disso, a oposição cobra que Toffoli volte a autorizar a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telemático de Vorcaro, medida considerada essencial para o avanço das investigações na CPMI do INSS. Parte dos documentos já havia sido enviada à comissão, mas ficou inacessível após decisão de Toffoli que impôs sigilo no âmbito do STF.
Especialistas também destacam que a decisão de Toffoli ocorre no momento em que cresce o escrutínio público sobre o ministro Alexandre de Moraes, citado em reportagens relacionadas ao caso.
Segundo reportagens do jornal O Globo, o escritório da advogada Viviane Barci de Moraes, esposa de Alexandre de Moraes, teria sido contratado para atuar em favor do Banco Master junto ao Banco Central, Receita Federal e Congresso, com pagamentos mensais de R$ 3,6 milhões por três anos.
Também surgiram especulações após os contatos de Moraes com o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, para tratar da aprovação da compra do Banco Master pelo BRB. Moraes afirma que as conversas se restringiram a discutir impactos de sanções dos Estados Unidos.
O ex-procurador da República Deltan Dallagnol classificou o caso como o episódio mais grave já registrado envolvendo a conduta de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele afirmou que os fatos narrados nas reportagens configuram, em tese, o crime de advocacia administrativa, previsto no artigo 321 do Código Penal.
“É o escândalo mais grave de conduta irregular de ministro da história conhecida do Supremo Tribunal Federal”, afirmou.
Segundo Dallagnol, o crime ocorre quando um agente público patrocina, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração Pública, o que, segundo ele, se encaixa nas suspeitas levantadas no caso do Banco Master.
“O impacto disso é gigantesco. É a última peça do quebra-cabeça, que revela o que realmente acontece nos bastidores, em que a família Moraes enriqueceu em grande quantidade nos últimos anos”, disse.
Em nota, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que, em razão da aplicação da Lei Magnitsky, recebeu para reuniões o presidente do Banco Central, a presidente do Banco do Brasil, além do presidente e do vice-presidente jurídico do Banco Itaú. Segundo o ministro, também participou de uma reunião conjunta com os presidentes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), da Febraban e do BTG, além de vice-presidentes do Santander e do Itaú. De acordo com Moraes, todos os encontros trataram exclusivamente das possíveis consequências da aplicação da lei, especialmente no que diz respeito à manutenção de movimentações bancárias, contas correntes e cartões de crédito e débito.
O jurista André Marsiglia afirmou que a acareação determinada por Toffoli, além de sigilosa, carece de motivação jurídica e pode ter como objetivo identificar fontes de vazamentos à imprensa.
“Uma acareação sigilosa e sem motivação jurídica pode servir para identificar fontes de vazamentos. Se usada para blindar o STF e intimidar a divulgação de irregularidades, configurará mais um grave escândalo da Corte”, disse.
Marsiglia explica que, embora a acareação seja um instrumento legítimo, ela deve ser usada como etapa final da investigação, quando há contradições entre provas já produzidas — e não no início do processo.
“Não serve para produzir provas no momento inicial das investigações, como acontece agora. O caso acabou de ser remetido ao STF. Uma acareação nesse estágio não faz sentido jurídico”, disse.
Segundo o jurista, o contexto levanta a hipótese de intenção política por trás da decisão.
“É uma especulação, mas é legítimo cogitar que a Corte esteja tentando saber o que mais circula nos bastidores do sistema financeiro sobre as relações divulgadas pela imprensa entre Alexandre de Moraes, o escritório de sua esposa e os bancos, ou até mesmo quem são as fontes dessas informações. Isso, se confirmado, seria totalmente ilícito.”
* Com informações da Gazeta do Povo.