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Aprovado em cima da hora, “Jabuti” legislativo abre portas para Mercadante no BNDES

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Por: Pedro Leal

14/12/2022 - 15:12 - Atualizada em: 14/12/2022 - 15:18

A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (13) uma mudança polêmica na Lei das Estatais (Lei 13.303/16), anexada em cima da hora em outro projeto de lei que alterava o limite das despesas publicitárias das estatais.

Anexada ao projeto no dia da votação pela relatora do PL 2.896/22, Margarete Coelho (PP-PI), a alteração reduz de 36 meses para apenas 30 dias o período de quarentena em que é proibida a indicação para diretoria ou conselho de administração de estatais e agências reguladoras de quem tenha atuado como integrante de instâncias decisórias de partidos ou atuado em campanha eleitoral.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) já defendia essa flexibilização na Lei das Estatais.

A mudança abre caminho para que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), indique aliados para postos-chave nas estatais – como o ex-ministro Aloizio Mercadante (PT), anunciado nesta terça por Lula para presidir o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento).

Este fator levou a proposta a ser apelidada de Emenda Mercadante por parte de políticos do NOVO, que colocaram o trecho em votação – a proposta do NOVO era sobre se deveria ou não entrar a proposta de Margarete Coelho quanto ao período de quarentena.

A posição do partido NOVO – compartilhada com o PSDB, antigo partido do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, atual PSB – é que a alteração destrói “na canetada” a confiança nas estatais estabelecida através da Lei 13.303.

NOVO, PSDB e Cidadania foram os únicos partidos a orientar que se votasse contra o texto.

A lei protege da interferência indevida dos políticos que ocupam cargos, que ocupam postos, sem qualificação, para fazer uma política de interesse do partido. O texto vigente veio em resposta aos escândalos da Operação Lava Jato, para proteger as estatais de novas ingerências políticas.

“Enorme Retrocesso”, diz Marques

Único parlamentar do NOVO por Santa Catarina, Gilson Marques descreveu o trecho adicionado pela relatora como um “enorme retrocesso” e “um jabuti” – termo usado para descrever elementos que não tem relação com o objeto da matéria em votação – incluído na última hora.

Ele frisa que o texto já era absurdo antes da inclusão do “jabuti” da quarentena, quadruplicando os gastos publicitários das estatais, além de facilitar publicidade estatal em ano eleitoral.

“A Câmara aprovou ontem o projeto que permite elevar os gastos com publicidade das estatais, sem qualquer requisito prévio, de 0,5% para 2% da receita operacional bruta do exercício anterior, ou seja, 4 vezes mais. Também modificou o sublimite desses gastos em ano eleitoral. Antes havia restrição para todo o ano e agora mudou-se apenas para o primeiro semestre”, explica Marques.

Ele adiciona que por serem sustentadas pelo contribuinte, as estatais já contam com uma vantagem competitiva quanto às empresas privadas – e a alteração faria delas um asset eleitoral para o governo de situação. “Também fragiliza o intuito dessa restrição que é evitar a promoção indevida do governo do momento”, adiciona.

O retrocesso maior, no entanto, vem com a emenda.

“Como se não bastasse, o absurdo maior veio com o jabuti, incluído no texto, que reduziu a quarentena para a indicação de políticos com atuação partidária nas estatais, que era de 3 anos e passa a ser de um mês. Na prática, acabou-se com essa quarentena que visava proteger as estatais de indicações meramente políticas. Isso já vai beneficiar a nomeação de Aloizio Mercadante para a presidência do BNDES, mas também deve beneficiar o loteamento de muitos outros cargos para apadrinhados políticos. Um enorme retrocesso!”, critica.

Outros políticos também criticaram o projeto.

Kim Kataguiri (União-SP) afirmou no twitter que a alteração é um “erro do início ao fim”. “O projeto da lei das estatais original permitia que as estatais quadruplicassem os gastos com publicidade. Ainda colocaram uma emenda unicamente pra favorecer o Mercadante a assumir o BNDES. Erro do início ao fim”, declarou.

Tiago Mitraud (NOVO-MG) chamou a alteração de um “ataque”. “Na última hora, após as 22h, Centrão e PT atacam a Lei das Estatais, para colocar novamente políticos no comando das empresas! A ‘quarentena’ passará de 3 anos para apenas 30 dias”, declarou.

Responsável por aprovar a Lei de Estatais, que dificultou o aparelhamento político de empresas públicas pilhadas durante os governos do PT, Michel Temer lamenta que uma das primeiras medidas do futuro governo seja justamente atropelar a legislação para nomear Mercadante.

“Compreendo as razões personalíssimas que levaram o futuro governo a tomar essa decisão, mas lamento muito. A Lei das Estatais foi um grande avanço para o país, conquistado no meu governo, que permitiu a recuperação de estatais que estavam dando prejuízo”, diz Temer à revista Veja.

Votação em SC

A votação do destaque entre os parlamentares de SC teve quatro votos favoráveis e sete votos contrários.

Quatro parlamentares do estado não votaram no destaque.

O destaque em questão acabou aprovado com 223 votos favoráveis e 123 votos contrários.

A votação quanto ao inteiro teor do PL 2896/2022 foi dividida: foram sete votos favoráveis e cinco votos contrários à proposta.

Votaram a favor do texto aprovado nesta terça-feira os deputados Carlos Chiodini (MDB), Caroline de Toni (PL), Coronel Armando (PL), Darci de Matos (PSD), Fabio Schiochet (União), Hélio Costa (PSD) e Pedro Uczai (PT).

Os votos contra foram de Angela Amin (PP), Carmen Zanotto (Cidadania), Daniel Freitas (PL), Gilson Marques (Novo) e Rodrigo Coelho (Podemos).

Não votaram a favor da alteração de limites orçamentários os deputados Peninha, Ricardo Guidi, Geovânia de Sá e Celso Maldaner.

Como votaram os catarinenses no destaque do NOVO?

Angela Amin PP Não

Carmen Zanotto Cidadania Não

Caroline de Toni PL Não

Carlos Chiodini – Não votou

Celso Maldaner MDB Não votou

Coronel Armando PL Não

Daniel Freitas PL Não

Darci de Matos PSD Não votou

Fabio Schiochet União Não

Geovânia de Sá PSDB Não votou

Gilson Marques Novo Não

Hélio Costa PSD Sim

Pedro Uczai PT Sim

Peninha MDB Não votou

Ricardo Guidi PSD Sim

Rodrigo Coelho Podemos Sim

 

A lei atualmente em vigor estabelece que:

  • é proibido o governo indicar para diretoria ou conselho de administração de estatais e agências reguladoras quem tenha atuado nos 3 anos anteriores como integrante de instância decisória de partido político ou tenha feito trabalho vinculado a alguma campanha eleitoral;
  • despesas com publicidade e patrocínio da empresa pública e de sociedade de economia mista não podem ultrapassar o limite de 0,5% da receita operacional bruta do exercício anterior.

O projeto no Congresso altera justamente esses pontos para dizer que:

  • o governo ficará proibido de indicar quem atuar em instância decisória de partido político ou tiver feito trabalho vinculado a uma campanha eleitoral nos 30 dias anteriores à indicação;
  • o limite para despesas com publicidade e patrocínio da empresa pública e da sociedade de economia mista passará de 0,5% para 2% da receita operacional bruta do exercício anterior. A lei atual já permite a ampliação do limite até 2%, mas condiciona a uma justificativa baseada em parâmetros de mercado ou da sociedade e aprovada pelo respectivo Conselho de Administração.

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Pedro Leal

Analista de mercado e mestre em jornalismo (universidades de Swansea, País de Gales, e Aarhus, Dinamarca).