Será que estamos bebendo mais durante a quarentena?

Por: Natália Trentini

27/05/2020 - 05:05

Mundo afora, pesquisas indicam um aumento no consumo de bebidas alcoólicas desde o início das orientações de isolamento social – no Reino Unido, as vendas aumentaram 22% em março e, nos Estados Unidos, 55%, comparadas ao mesmo período do ano passado.

No Brasil, não existem dados que confirmem que a população está bebendo mais, mas a sensação é que a ansiedade, tédio e frustração estão levando a copos cheios com mais frequência.

Uma pesquisa realizada pelo OCP entre os dias 22 e 24 de maio nas redes sociais apontou que 34,7% dos entrevistados aumentaram o consumo durante o período de quarentena.

Em contrapartida, 52,8% responderam que mantiveram o consumo na mesma quantidade e 12,5% relataram ter reduzido a ingestão de álcool.

O psicólogo e professor universitário, Franklin Jones Vieira, afirma que existem muitos gatilhos para um uso excessivo de álcool, e a situação atual pode ser um deles.

“O abuso de álcool ou qualquer outra substância psicoativa é causado por diversos fatores, um deles pode ser o sentimento de solidão e desamparo ou dificuldade em lidar com as próprias angústias”, comenta.

Vieira explica que o álcool é uma substância de fácil acesso que deprime o sistema nervoso central e estimula o rebaixamento dos reflexos e da censura. Assim, vem aquela sensação momentânea de anestesia, de fugir da realidade.

“Geralmente, o abuso de substância denota uma inabilidade do sujeito em lidar com algumas emoções e sentimentos como a demonstração de afeto e necessidade de obtê-lo, raiva, frustração e fracasso”, diz.

Estar na linha de frente da pandemia, trabalhar sentindo insegurança, estar em home office, lidar com a rotina das crianças em ensino domiciliar, não poder viajar, fazer atividades em grupo… São muitas novas situações para lidar e poucas certezas sobre o futuro, o que pode levar às desculpas para aliviar essa carga.

Mais do que a mudança na rotina ou novas demandas, o psicólogo destaca que é ansiedade o que costuma levar a “subterfúgios”, que também vão além da bebida alcoólica em si. Fumar e comer excessivamente estão nessa lista.

Mas a sensação de acalmar essa ansiedade com álcool é passageira. “Após o uso, o sujeito sofrerá alterações de humor, indisposição, lentidão, sonolência ou confusão mental”, comenta Vieira.

E quem continuar se negando a lidar com suas frustrações ou fingir que elas nem existem, pode acabar tentado a aumentar o consumo dose a dose.

“Em caso de overdose ou abuso a longo prazo, causa amnésia, delírio e a forma mais grave – a Síndrome de Korsakoff, ocasionada pela falta de vitamina B1 ou tiamina – , causando uma neurotoxicidade e sequelas crônicas de falta de memória (80% dos casos)”, esclarece.

Ao invés de “afogar as mágoas” desse modo em um momento tão complexo, Vieira aconselha a refletir e ser honesto consigo mesmo.

“A pergunta sugerida para tempos de ócio e/ou confinamento seria: quais as fantasias que tenho criado sobre o que sinto diante das incertezas vivenciadas atualmente?”, questiona Vieira.

Só um pouco para relaxar

Você comprou bebida como quem estocou papel higiênico no começo da pandemia? Talvez seja bom observar seus comportamentos.

Você está bebendo mais do que antes da quarentena? Precisa beber um pouco mais para conseguir aquela sensação de relaxamento? Compare.

Vieira comenta que a dependência é caracterizada pelo desejo irresistível de consumir a substância e uma atitude compulsiva de tentar obtê-la. O que, muitas vezes, pode ser um comportamento sutil.

“Nesse caso, pode-se observar que a pessoa planeja uma rotina de consumo ou substitui relações sociais e/ou de responsabilidades pelo uso da substância, tornando-se indiferente frente aos prejuízos advindos de suas atitudes”, comenta.

“O abuso de uma substância psicoativa é caracterizado pelo excesso de consumo, onde o sujeito excede seu limite de tolerância no momento do uso”.

A tolerância varia muito de pessoa para a pessoa e ultrapassar essa linha pode ser algo sutil, mas acaba apresentando riscos e danos pessoais, sociais e de relacionamento, ressalta o psicólogo.

De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), não existe um nível seguro para consumo de álcool. Beber mesmo uma única dose pode trazer prejuízos para a saúde a longo prazo.

Além disso, a entidade de saúde ressalta que ingerir álcool aumenta sintomas de pânico e de ansiedade, depressão e outros transtornos mentais e o risco de violência doméstica.

Riscos para a saúde

Além dos conhecidos riscos para saúde física e mental, o consumo excessivo de álcool tem um caráter ainda mais crítico nesse momento.

O consumo de álcool reduz a capacidade do sistema imunológico combater infecções.

De acordo com publicação da BBC, um grupo de pesquisadores italianos publicaram na revista científica Minerva Médica um estudo que sugere que até mesmo o consumo moderado pode aumentar as chances de uma pessoas ser infectada pelo Covid-19 e ter a doença agravada.

Ainda segundo a OMS, o uso intenso de álcool aumenta o risco de Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA), uma das complicações mais graves do coronavírus.

 

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