Elas pesam cerca de 40 quilos, tem 47 cordas e são resultado de um trabalho feito por centenas de mãos. Com uma produção praticamente artesanal que pode levar até quatro meses, as harpas são também um motivo de orgulho para Jaraguá do Sul. É na Sociedade Cultura Artística (Scar) que se encontra a maior concentração do instrumento na América Latina, um total de 17 unidades que ganham atenção especial, principalmente às vésperas do Festival de Música de Santa Catarina (Femusc).
Apesar de serem usadas ao longo de todo o ano, em aulas e concertos, as harpas têm maior visibilidade nessa época, pois durante o Festival são usadas por alunos de diversos países e se tornam protagonistas de concertos. E é exatamente pensando no melhor de cada instrumento que o Femusc, junto com a Scar, recebe anualmente um técnico da empresa Lyon e Healy, fabricante das harpas, para ajustar os instrumentos.
Neste ano, quem veio para a cidade para cumprir a tarefa foi o americano Bill Iaros. Apaixonado por música, Bill toca piano e trompete, mas conheceu as harpas a convite de um amigo que trabalhava na empresa e o chamou para uma entrevista. “Desde então estou trabalhando com isso.Tem sido uma experiência boa e depois de alguns anos de aprendizado, eles começaram a me colocar na estrada para viajar pelo mundo. No começo viajava somente nos Estados Unidos, depois México. Comecei a ficar muito bom na função e aí me mandaram para a Ásia, China e agora para o Brasil, onde tem sido uma experiência incrível”, explica.
Atuando há 11 anos no ramo, ele conhece bem as particularidades do instrumento. “O que mais afeta a harpa é a variação de temperatura. Muito calor, muito frio e umidade são problemas que podem afetar a qualidade do instrumento”, explica. Por isso, as harpas devem ser mantidas em uma sala refrigerada e requerem cuidados. Além da aparência robusta, os instrumentos também são valiosos: uma harpa nova, segundo Iaros, pode custar até 22 mil dólares.
Assim que chegou à Scar, o americano não parou. Ele ficou na cidade por uma semana trabalhando exclusivamente com as harpas. O primeiro passo foi verificar a condição dos pedais, depois Iaros partiu para os ajustes. Como são feitas artesanalmente, cada harpa possuí características únicas e o maior desafio do técnico é deixá-las com a sonoridade igual. “No processo de regulagem precisamos deixá-las praticamente do mesmo jeito e isso é bem difícil porque em cada uma a regulagem é diferente”, enfatiza. O tempo de trabalho em cada instrumento varia, em algumas pode levar uma hora, em outras até cinco.
Quem acompanhou de perto todo o trabalho do americano foi Wellington Bonifácio, 25 anos, que há alguns anos atua ao lado do pai Donizete na manutenção dos pianos para o Femusc. Desde 2015, ele se dedica ao cuidado com as harpas, que conheceu durante o Festival, e busca especialização. “É um instrumento bem diferente do piano, que eu já domino a técnica, mas aproveitei a vinda dele para aprender mais sobre os cuidados e manutenção. No Brasil não existe alguém que faça isso, por isso acho importante me especializar para poder prestar esse tipo de serviço por aqui”, enfatiza.
Para o americano, que se despediu da cidade ontem (24), foi uma surpresa e um desafio lidar com tantas harpas. “Não sei se é assim em todo o Brasil, mas acredito que não. Tem sido um trabalho intenso desde que cheguei aqui, é muito legal”, diz. Assim que saiu de Jaraguá do Sul, ele partiu para Belo Horizonte onde atenderá outras de suas pacientes preferidas: as harpas.
Jaraguaense se especializa no aprendizado do instrumento
Depois de procurar por aulas de violão, Gabriel Vieira, 18 anos, descobriu as harpas entre os diversos instrumentos na Scar. Após algumas aulas no projeto Música Para Todos (MPT), não teve jeito, o jaraguaense se encantou por elas. Desde 2012 ele participa do Femusc e hoje é também aluno da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde faz bacharelado no instrumento. “Ela é basicamente a minha vida, passo mais tempo com a harpa do que com qualquer pessoa”, diz.
Ele também acompanhou a manutenção harpas da Scar, o que considera uma importante oportunidade de aprendizado. “Aproveitei para conversar com o Bill e aprender mais como funciona a técnica do instrumento, a regulagem, que é bem importante para o músico saber”, completa. Sem deixar de participar do Femusc e de vir para a cidade visitar a família, Vieira pretende alçar grandes voos. “Penso em fazer especialização fora do Brasil porque aqui não tem. Se quiser fazer mestrado terei que ir para fora. Se continuar aqui, quero ir para grandes centros onde tem mais orquestras e oportunidades”, enfatiza.