Com a proximidade das eleições municipais, a atuação dos representantes políticos estará na balança dos eleitores em outubro. Se o olhar da população está mais apurado para as ações do Executivo, a mesma medida não é aplicada ao trabalho dos vereadores. Especialistas apontam que ainda falta conhecimento e fiscalização da sociedade sobre as competências da atividade parlamentar.
A baixa produção legislativa, aliada a propostas que trazem pouco impacto à vida dos cidadãos, são apontadas pelo mestre em sociologia política, Eduardo Guerini, como fatores para o distanciamento popular. Uma realidade que, segundo ele, se repete na maioria das cidades do país.
Na Câmara de Vereadores de Jaraguá do Sul, considerando os números disponibilizados pelo site oficial, pelo menos 82% dos projetos de lei que tramitaram nesta legislatura não trazem benefício prático para a população. Foram denominações de ruas, honrarias e reconhecimento de entidades. Também há criação de comemorações municipais, como dia da Dona-de-Casa, do Orquidófalo e Dia da Bíblia.
Os vereadores também avaliaram mais de 2,2 mil proposições. O maior número foi de indicações, cerca de duas mil, enviadas à Prefeitura com sugestões de obras, mudanças no trânsito ou melhorias, normalmente apontadas pela comunidade. Considerando o período, foi apontada uma média de 1,6 indicações por dia.
Houve outros 156 requerimentos e 38 moções. O recurso menos utilizado, apenas 22 vezes, foi o pedido de informação, que normalmente serve de canal para fiscalização de ações do Executivo. O levantamento inclui somente propostas originadas na própria Casa.
Guerini destaca que o engessamento das atividades do vereador também é causado por interesses individuais, possibilitado pela falta de acompanhamento dos eleitores. “Em nenhum momento se vê projetos de interesse social. A falta de controle da própria sociedade deixa o vereador com mandato livre para atuar de acordo com interesses pessoais e partidários”, avalia.
Dois projetos de impacto que foram derrubados pelos vereadores justamente pela mobilização pessoal foi o índice de reajuste dos servidores públicos, que conseguiram cerca de 1% a mais do que a proposta inicial, e o projeto de lei que autorizava a abertura do comércio dos domingos, proposta rejeitada pelo sindicato e trabalhadores do setor.
O professor universitário e especialista em direito político, Jeison Heiler, complementa que a falta de eficiência nas propostas pode ser fundamentada pelo posicionamento de “centralismo Executivo”. “Tivemos presidentes que aprovaram legislações sociais sem que houvesse luta, diferente do processo que aconteceu em outros países. Então, há essa noção que basta eleger um representante bem intencionado para resolver os problemas. Não há uma responsabilidade do eleitor e engajamento político”, considera.
Para Heiler, os vereadores também estão cercados de uma quantidade massiva de leis estaduais e federais, que se sobrepõem e reduzem as competências legislativas do município. Mesmo assim, o professor considera que os parlamentares estão incumbidos de inúmeras outras competências, principalmente o acompanhamento de projetos ao lado das bases comunitários que o elegeram e o estudo das ações do Executivo.
Entrevista
OCP - A produção legislativa é um bom critério para avaliar o trabalho dos vereadores?
Eduardo Guerini - A produção legislativa é muito baixa, a maior parte da produção se refere a honrarias, títulos de cidadãos ou nomeação de vias públicas. Observa-se que a produção nas Câmaras em muitos casos é baixa pela coalizão preventiva. Vereadores vão para o Executivo e são ocupados pelo princípio da governabilidade sem prestar contas à população que os elegeram. O mandato é popular, mas vereadores não prestam conta. Essa é uma característica do abismo entre representantes e representados. Segundo é a falta de controle social, da sociedade em geral. O vereador fica com mandato livre para operar de acordo com seus interesses, ou interesses partidários. O resultado é a queda da produtividade. O terceiro ponto, mais marginal, é a falta de plano de ação dos prefeitos, o que dificulta a fiscalização. O quarto problema é relacionado à baixa capacidade de fiscalização porque os vereadores não tem controle efetivo sobre orçamento, há pouca capacidade de investimento dos municípios e os recursos vêm de fora. Todos esses elementos produzem queda na ação dos vereadores.
Há realmente um engessamento das atividades legislativas ou falta entendimento de quem assume a cadeira?
Na verdade, o Legislativo não pode criar nenhuma lei que onere o orçamento municipal, mas ele pode, na votação da lei orçamentária, apontar diretrizes essenciais. Nesse momento, ele poderia entrar com mais ênfase e tem condições objetivas de dar norte e direção para a gestão pública. Essa é a atividade. Como vereadores acabam tomando o Legislativo como atividade própria e não comunitária, falta essa de ação das Câmaras. Sem contar as outras demandas possíveis, como referendo popular, plebiscito, audiências públicas, revisões em leis. De modo geral, a atividade legislativa no Brasil está garroteada pela estrutura partidária e falta de conhecimento do que seria a atividade parlamentar.