Por Heloísa Jahn Levantamento da ONG Todos Pela Educação destaca um cenário preocupante para o ensino brasileiro: entre as crianças e adolescentes que estão fora da escola, cerca de 62% têm entre 15 e 17 anos. A pesquisa, feita com base nos resultados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), aponta a evasão de mais de 1,5 milhão de adolescentes que deveriam estar cursando o ensino médio. Nesta mesma faixa etária, aproximadamente 240 alunos se evadiram da escola na microrregião no ano de 2016. O número leva em conta os municípios de Corupá, Guaramirim, Massaranduba e Schroeder. Conforme a gerente regional de Educação, Cristiana Potronieri Ziehlsdorff, a situação é predominante em famílias em situação de vulnerabilidade. Parte desses estudantes evadidos acabam, com o tempo, recorrendo ao ensino de adultos, o Ceja (Centro de Educação de Jovens e Adultos). “A situação econômica das famílias é fator determinante. Com renda baixa, os estudantes acabam priorizando o trabalho e deixando a escola para poder auxiliar os pais”, destaca.
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Para e gerente de Educação, Cristiana Ziehlsdorff, é preciso contribuição da família para que os jovens se mantenham na escola| Foto Eduardo Montecino

Cristiana revela que, no ano passado, houve reuniões com os Conselhos Tutelares da região, onde foi solicitada a abertura de mais vagas à noite para esses alunos poderem trabalhar. “Mas nós acabamos negando esse aumento de vagas porque a prioridade desses adolescentes deve ser a escola. Por mais que a gente entenda que necessitam do sustento, tentamos ainda priorizar a escola para que possam concluir o ensino médio. Vemos, também, que falta a motivação e a família orientar sobre a necessidade de finalizar os estudos, para depois ir adiante”, relata a gerente.

Modelo educacional e fatores sociais impulsionam a evasão Ainda conforme a pesquisa, o Brasil tem 2.486.245 milhões de crianças e jovens em idade escolar fora do sistema de ensino, sendo precisamente 1.543.713 deles adolescentes de 15 a 17 anos. Para o coordenador de projetos da ONG Todos Pela Educação, Caio Callegari, as razões fundamentais da evasão estão ligadas à falta de qualidade do sistema escolar, gravidez precoce, violência nos grandes centros urbanos e à dificuldade de conciliar estudo e trabalho. “Por exemplo, dos 1,9 milhão de crianças e jovens de dez a 17 anos que estão fora da escola, quase 14% são mães adolescentes”, ressalta. Callegari explica que, do ponto de vista da falta de qualidade, é possível identificar pelo menos duas causas: a repetência crônica e a falta de conexão da escola com o projeto de vida dos jovens. “Esses fatores provocam, para muitos estudantes, a sensação de que a escola não é para eles. E isso ocorre já no ensino fundamental, posto que quase 20% dos jovens de 19 anos nem chegam a entrar no ensino médio”, observa. No caso de Jaraguá do Sul, para fazer que os jovens priorizem os estudos e não o ingresso no mercado de trabalho, Callegari diz que, além de adotar as políticas públicas para tornar a escola mais atrativa, é preciso aprofundar o processo de aproximação da comunidade educacional com a realidade da família dos estudantes.  

“Os jovens e suas famílias têm de ter a compreensão da importância da conclusão da educação básica, não só em termos dos seus direitos de aprendizagem e da abertura de oportunidades de trabalho, mas também considerando os ganhos futuros da Educação: em média, cada um ano a mais de escolaridade aumenta de 9 a 12% a renda de uma pessoa ao longo de toda a sua vida”, ressalta.

Conforme o coordenador, com esse diálogo o objetivo é evitar que estudantes que não precisam trabalhar abandonem a escola, apenas com a finalidade de entrar mais cedo no mercado de trabalho. “E que se construa políticas de apoio aos jovens de baixa renda para que possam dedicar o tempo adequado aos estudos”, aponta. Como a escola pode se tornar mais atrativa? O coordenador de projetos da ONG Todos Pela Educação, Caio Callegari, afirma que pesquisas recentes têm mostrado que as soluções não são tão complexas ou inovadoras. “Em primeiro lugar, deveria haver mudanças mais básicas, como garantir uma escola mais segura, com professores que não faltem e com uma infraestrutura adequada, desde o oferecimento de laboratório de ciências e internet banda larga, até banheiros adequados, passando por questões também de acessibilidade a alunos com deficiência”, pondera. Outro ponto fundamental, de acordo com ele, é que haja na escola uma cultura de consideração do jovem. “Com isso quero apontar duas coisas: um esforço adicional de apoio aos jovens em situações mais vulneráveis para que não se sintam abandonados e um diálogo continuado com os estudantes para ouvir suas demandas e opiniões sobre o ambiente escolar, inclusive pensando em quais trajetórias formativas devem ser oferecidas para atender aos desejos e sonhos da juventude”, enfatiza Callegari. O supervisor de ensino da Gerência Regional de Educação de Jaraguá do Sul, Reginaldo Pires de Lima, destaca que as escolas da região são bem organizadas no quesito segurança, com controle da entrada e saída dos alunos e da comunidade. Em relação aos professores, Lima garante que passam por capacitação constantemente. “Além disso, as escolas oferecem outras alternativas para atrair os alunos, como oportunidades de pesquisas, viagens, feiras de ciências, que auxiliam muito e proporcionam outras aprendizagens. A avaliação também está diferente, com o professor dando a chance de o aluno recuperar as dificuldades que ele tem já ao longo da jornada”, observa. Lima também ressalta como motivos para a evasão o fato de que muitas famílias “caminham na região”. “Tínhamos em torno de 18 mil alunos e fomos para algo em torno de 16 mil do ano passado para este ano. Um pouco dessa evasão ocorreu devido à questão econômica. O fechamento de empresas e comércio dificultou para muitas pessoas, que buscaram outros locais para viver”, argumenta. Na contramão desse panorama desfavorável, muitas escolas recebem voluntários para projetos e orientação. “Há um movimento bacana com a comunidade em geral no sentindo de manter os alunos na escola e orientá-los para a vida”, diz o supervisor de ensino. Cooperação contra a evasão A implantação de projetos que estimulem e valorizem a participação do aluno na escola é, muitas vezes, a saída para que eles não desistam dos estudos. Na escola Professora Lília Ayroso Oechsler, o Programa Cooperjovem, implantado pelo Sescoop (Serviço Nacional de Aprendizagem e Cooperativismo) com o apoio da Gerência Regional de Educação, vem disseminando ideais por meio de ações participativas e cooperativas, capacitando professores e integrando toda a comunidade escolar. Na escola, de acordo com a diretora Fabiana Ribeiro de França, o programa acontece em parceria com a Cooperativa de Crédito Viacred, com atividades que acontecem no decorrer do ano junto às disciplinas. “Nos últimos três anos, nós trabalhamos o trânsito e no início de 2017 mudamos o tema, que é valores. Em três anos, vamos trabalhar nove valores, três por ano”, explica. Fabiana acredita que um dos motivos para o aluno se evadir está diretamente ligado à autoestima, por isso a importância de abordar esses valores. Iniciado em 2011, o programa vem trazendo, segundo a coordenadora na escola, professora Maristela Ribas, resultados significativos. “Há maior colaboração por parte de todos, as notas melhoraram e o programa também capacita os professores. Como o projeto é continuado e faz parte da rotina da escola, as mudanças vão ocorrendo gradualmente”, destaca. A professora Marisa Vianna revela que por ter trabalhado em outras escolas consegue observar a diferença na conduta dos alunos. “Eles estão muito mais tranquilos, evitando conflitos, mais cuidadosos com a escola e com os colegas. Os estudantes que vêm de fora vão sendo envolvidos por essa atmosfera e vão mudando também”, salienta. Para Jenifer Cristina Dallagnolo, 15 anos, aluna do 1º ano do ensino médio, o Cooperjovem melhorou muito a convivência e o clima na instituição. Ela estuda na Lília Ayroso desde a pré-escola. “Estamos mais cooperativos com o próximo, conseguimos praticamente eliminar algumas condutas que atrapalhavam e as crianças estão se cuidando mais”, revela. Ela observa que os jogos e atividades conjuntas auxiliam muito a integração de todos. “A prática do bullying, que antes era comum, hoje não é mais. Esse projeto é um diferencial da escola, que pode ser implantado nas outras”, conclui. Reforma do ensino médio também precisa ser estrutural Defendida pelo governo federal como uma forma de manter os jovens na escola, a reforma do ensino médio tem uma das principais bandeiras a flexibilização da base curricular, inserindo a possibilidade do ensino técnico já no ensino médio dentro da carga horária regular. O coordenador de projetos da ONG Todos Pela Educação, Caio Callegari, acredita que oferecer a oportunidade de um contato técnico e profissional e ampliar as possibilidades de aprofundamento escolar, de acordo com o que os jovens querem, é algo positivo e pode tornar a etapa mais aderente aos anseios da juventude. “Contudo, as mudanças até agora planejadas para o ensino médio não podem ser entendidas como uma condição suficiente para a melhora necessária no modelo de ensino. Uma reforma efetiva deve ser mais completa, englobando outras variáveis como: aprimoramento da formação docente, atratividade da carreira do magistério, infraestrutura escolar, expectativas claras de aprendizagem, uso pedagógico das avaliações no processo, apoio aos estudantes em situações mais vulneráveis e diálogo com os estudantes para identificar os pontos-chave para uma melhoria global do sistema escolar”, conclui Callegari.