“Minha filha mais velha tinha nove anos na época e eu observava as diferenças. O Gabriel ficava olhando muito tempo para um lugar fixo sem nada (vazio) e não falava. E a menina falou muito cedo, então eu fui percebendo por essas coisas”, revela.Embora trabalhasse com crianças, até então Jane não conhecia o TEA. Quando o filho tinha três anos, ela assistiu à palestra com neurologista de Blumenau, que falou sobre as características do autismo.
“E aquilo juntou todos os traços que o meu filho tinha. Cheguei aqui e falei com a creche sobre isso, mas não havia nada a ser feito, porque a educação infantil não faz esse acompanhamento. E é desde pequeno que o transtorno deve ser trabalhado”, destaca.Mesmo sem um diagnóstico, a mãe levou Gabriel para psicóloga e fonoaudióloga. Após os quatro anos, ele começou a falar. Desde então, a família vem lutando pela sua inclusão na sociedade e para que leve a vida como qualquer criança. O laudo só veio aos cinco anos, autismo no nível 1 (o mais leve), mas os pais não esperaram um parecer médico para buscar o suporte necessário ao desenvolvimento do filho. Na Escola Municipal de Ensino Fundamental Francisco Solamon, no bairro Santo Antônio, Gabriel Dziecinny Ferreira, hoje com 12 anos, frequenta o sétimo ano. As dificuldades iniciais de concentração e para entender que uma ordem dada em sala de aula para a turma deveria também ser atendida por ele foram superadas. Os ruídos que tornam o cérebro de um autista barulhento e caótico foram dando espaço para pensamentos organizados, para a aprendizagem e para o convívio com colegas, professores e quem mais se aproximar. O TEA não impede que o menino tire notas altas, realize belíssimos trabalhos de artes plásticas e toque acordeon. “Eu toco acordeon e fiz aulas no Femusquinho. Lá eu toquei viola. Também já fiz umas pinturas”, revela Gabriel, que também adora pesquisas na internet e é muito dedicado aos estudos. Ele considera a escola e a turma legais e diz que tem boa relação com colegas e professores. O adolescente conta que no quinto ano havia muito barulho na sala e não conseguia se concentrar, mas que essa fase já passou. Desde a infância, o aluno teve acompanhamento fonoterapêutico, psicólogo e neurológico.
Pequenas mudanças geraram grandes conquistas em sala de aula
Conforme a pedagoga especializada em educação especial, Marilu Schiessl, a escola possui dois alunos com TEA, níveis 1 e 2 (moderado). Ela explica que há, ainda, o autismo nível 3, o mais severo. Na escola também funciona o polo de Atendimento Educacional Especializado (AEE) da região, que promove acompanhamento aos alunos no contra turno escolar. “O Gabriel vem uma vez por semana à minha sala para fazer a complementação de alguma coisa que está faltando. Na sala de aula, muitas vezes, eles (os autistas) não conseguem aprender tudo, devido à estrutura, ao ambiente, ao barulho”, revela a professora. Marilu ressalta que no início, algumas adaptações foram feitas para que o aluno conseguisse aprender o conteúdo. Hoje, ela garante que ele aprendeu a lidar com questões que tinha dificuldade.“Ele veio para cá com dez anos, no quinto ano. Na escola em que ele estudava, havia ruídos demais, a turma era agitada. Algumas adaptações tiveram que ser feitas naquela época. Por exemplo, a professora tinha que direcionar a fala para ele de forma objetiva, porque quando ela falava para o grupo, ele achava que não era com ele. Outra questão envolvia as provas, que ele não conseguia realizar na sala. Um mínimo ruído ou movimento desconcentrava-o, aí as notas eram baixas. A partir do momento que a gente tirou ele da sala para fazer as provas, ele passou a tirar notas 9/10. Então, era uma coisa simples, mas teve que ser identificada e adaptada”, salienta a especialista.Com o suporte necessário, o aluno autista pode se desenvolver melhor. Esse apoio vai desde o olhar do professor para identificar alguma dificuldade, até o atendimento especializado. Hoje, Gabriel consegue fazer as provas em sala de aula. Ele aprendeu a lidar com o ambiente, além de melhorar significativamente a interação social.
Sensações de um autista são amplificadas

Gabriel frequenta o ensino regular, é sociável e tem noção de seu diagnóstico | Foto OCP
“Nós conseguimos filtrar os outros ruídos. Por exemplo, você está prestado atenção na minha fala e não está prestando atenção no barulho do computador, nem do ar condicionado, nem no movimento das árvores ou no ruído das cadeiras... Para o autista, essas informações ocorrem ao mesmo tempo e com a mesma intensidade, muitas vezes eles se desorganizam”, destaca.Para a mãe do menino, a principal barreira em relação ao TEA é a falta de informação, que impede que muitas famílias auxiliem no desenvolvimento dos filhos desde a primeira infância. “Sei que ele tem condições de, no futuro, ser um engenheiro ou estar na profissão que ele escolher. O Gabriel é ótimo em matemática, desenha bem e está acompanhando a turma. Acho que se não tivéssemos consciência de que ele precisava desse estímulo desde pequeno, buscado dicas de como trabalhar ele em casa, no dia a dia, sempre procurando a socialização – na escola, no mercado, no futebol – talvez ele não estivesse onde está agora”, diz. Segundo Jane, o esposo, Arilson Ferreira, comprou dois acordeons para incentivar o filho a tocar e há três anos os dois praticam juntos, com aulas na Scar. Emocionada, ela conta que no ano passado os pais colocaram um vídeo para explicar ao menino o que é autismo. “Ao final, ele disse ‘é isso que eu tenho’, e foi assim que ele soube e entendeu.”
Dificuldades superadas com rede de apoio
Na rede municipal de ensino, conforme dados obtidos junto à Secretaria de Educação, existem 61 alunos autistas frequentando a escola e 17 frequentando os centros de educação infantil, totalizando 78 estudantes com TEA. Questionada pelo OCP a respeito de qual seria a escola mais indicada ao autista, Marilu Schiessl ressalta que muitos fatores devem ser avaliados, mas é preciso que a unidade se prepare para receber a criança.
Atividades escolares ajudam Gabriel em seu desenvolvimento social | Foto OCP