Bandos de aracuãs anunciam o amanhecer ao longo das matas ciliares às margens dos rios Itapocu e Jaraguá na região central da cidade. Dividindo espaços com canários-da-terra (ou da telha), sanhaçús, sabiás, rolinhas, tucanos e baitacas - uma ave semelhante ao papagaio. Ao lado de pardais, andorinhas, bem-te-vis e joões-de-barro, entre tantas outras aves que podem ser avistadas em qualquer lugar da cidade. Mas a que se deve a crescente reprodução de aves, silvestres ou não, em um ambiente aparentemente hostil a elas? São várias as versões: desmatamentos, a proibição da caça desde 1967 por decreto federal, árvores frutíferas em maior quantidade nos quintais, mais áreas verdes, alimentos oferecidos pela mão humana, entre outros motivos. Enfim, o que se vê talvez seja consequência de uma mistura de tudo isso.
Pombão
Gilberto Duwe, biólogo da Fundação Jaraguaense do Meio Ambiente (Fujama) e pesquisador do assunto, confirma que, nos últimos 15 anos, a reprodução de aves silvestres em ambientes urbanos da cidade tem aumentado. Cita, como exemplo, o pombão, um parente direto do pombo doméstico, que pode ser visto se alimentando junto aos trilhos da ferrovia que atravessa a cidade, às vezes de comportamento solitário, às vezes em grupos de duas a três aves. E que, aos poucos, vão se acostumando com o vai e vem dos trens e das pessoas que circulam pela ciclovia que margeia os trilhos. Seu nome científico é Patagioenas picazuro. “O derramamento frequente de grãos de soja e milho transportados para o porto de São Francisco do Sul é um grande atrativo para a espécie, que já não encontra alimento suficiente em seu habitat natural”, explica o biólogo. A ave, migratória, costuma fazer ninhos em locais bem protegidos, como árvores fechadas e touças de bambu por causa dos predadores naturais, entre eles tucanos, gaviões, cobras e gatos-do-mato. Põe de dois a três ovos e a sobrevivência de filhotes se dá em bom número.
Trinca-ferro e anus
Mas outras espécies ainda sofrem com a captura ilegal. Entre elas o trinca-ferro, por causa do alto valor comercial. Este pássaro, como o curió, hoje só é encontrado em distantes áreas rurais, podem ser reproduzidos em cativeiro, porém é preciso licenciamento expresso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) . “No caso do trinca-ferro e na contramão de outras espécies, temos um quadro negativo, de baixa reprodução, por conta da captura com armadilhas”, observa Duwe. Já o “sumiço” do anu, uma ave carnívora e predadora de ninhos de outras espécies, e que até passado recente era comum em ambientes urbanos centrais, se dá por outro motivo, segundo Duwe. “As fêmeas de um bando colocam todos os ovos em apenas um ninho, que precisa ser bem grande (cada uma delas põe de quatro a sete ovos), construído em local bem protegido. Como ainda temos pouco verde em áreas sempre mais povoadas para abrigar os bandos de anus que se reproduzem a cada ano, a espécie acabou migrando para as localidades mais afastadas”, explica o biólogo.