Como a ética do medo atua na instabilidade social

Geral
sábado, 12:12 - 29/04/2017

Em meio à pluralidade, polaridade e contínua instabilidade da ordem social, fenômenos estes que caracterizam nossos tempos, a sensação que nos aflora é de que a paz só se dá com poder temível. Por esse prisma, mesmo que soe paradoxal, podemos considerar que estamos vivendo uma era de ‘paz atômica’ e ‘dedo em riste’.
Uma paz, cuja pretensão aqui, não é restringi-la ao sentido bélico, mas, considerá-la na dimensão da convivência humana, em todas as esferas sociais. Uma paz regida pela ética do medo em detrimento da inteligência. Logo, imposta ao invés de conquistada na mansidão e sabedoria.
Admitamos então que kilotons de ogivas nucleares e um simples ‘dedo em riste’ configurem forças distintas em suas formas dimensionais, mas congêneres em seus efeitos, bastando apenas relativizar as circunstâncias. Teríamos razão suficiente para a inquietante reflexão: O que produziria maior efeito moral, a ameaça de um kiloton nuclear numa sociedade humilde, passiva e oprimida ou um gesto de ‘dedo em riste’ numa sociedade crítica e reconhecidamente evoluída?
Qualquer que possa ser essa resposta, ela será subjetiva, já que, historicamente, não vivenciamos os dois perfis de sociedade de forma simultânea. Mas se imaginarmos uma resposta sob a ótica da obediência, os kilotons numa sociedade humilde teriam, em tese, efeito moral supostamente eficiente. Já, se conjecturarmos pela ótica da coação, o ‘dedo em riste’ numa sociedade crítica e evoluída, tenderia a significar guerra declarada.
Agora, se a esta mesma paz associarmos mais dois elementos, a liberdade e a segurança, deduziremos que a ética do medo, ancorada nas duas forças obtusas, seria socialmente desagregadora e desestabilizadora. Providencial se faz aqui o olhar de Bauman, mesmo considerado um pessimista em sua crítica à pós-modernidade: Sustenta ele que “as relações escorrem pelo vão dos dedos” e, por tal circunstância, “os burocratas modernos devem, em outras palavras, destacar-se em todas as habilidades justamente louvadas por seu papel-chave em assegurar as realizações espantosas pelas quais a ‘razão’ moderna é justamente apreciada e das quais nós, seus proprietários/usuários/beneficiários, somos (também corretamente) tão orgulhosos.
As emoções são muitas e falam línguas diferentes, às vezes discordantes, mas a ‘razão’ é uma só e tem apenas uma língua”. Como vemos, são reflexões cujas respostas plausíveis ainda são questão de tempo. Por enquanto, para satisfazer otimistas e pessimistas, como bem profetiza Harari em seu best-seller ‘Sapiens’, “podemos concluir dizendo que estamos no limiar do céu e do inferno, movendo-nos nervosamente dos portões de um para a antessala do outro. A história ainda não se decidiu sobre nosso destino, e uma série de coincidências ainda pode nos colocar em uma ou outra direção”.
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