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Em casa: Jaraguaense que estava na Ucrânia dá detalhes sobre a guerra e futuros planos

Daniel Rosa (primeiro da esquerda) cruzou a fronteira da Ucrânia com a Moldávia no domingo (27) | Foto: Arquivo pessoal

Por: Lucas Pavin

01/04/2022 - 17:04 - Atualizada em: 01/04/2022 - 17:47

Finalmente em casa. Após passar 32 dias em meio a guerra entre Ucrânia e Rússia, Daniel Rosa chegou em Jaraguá do Sul na última quarta-feira (30).

O jaraguaense de 28 anos, que joga futsal no país invadido pelos russos, estava em Kherson, cidade ucraniana dominada pelos inimigos.

Ao lado de um brasileiro e companheiro de time, além de uma tradutora ucraniana, o atleta do Mfc Prodexim cruzou a fronteira com a Moldávia no domingo (27) e conseguiu deixar o país depois de uma verdadeira saga.

Em entrevista ao OCP e Avante! Esportes, Daniel deu detalhes sobre os momentos de tensão vividos em pouco mais de um mês, a fuga de Kherson, ensinamentos trazidos do conflito, possível retorno a Ucrânia e o acerto com novo clube. Confira abaixo:

– Já deu para assimilar tudo que aconteceu após viver um mês de guerra?

“Graças a Deus passou a parte difícil que era passar a fronteira. Depois que passamos, parecia que tiramos uns 100kg das costas. Teve a parte chata de viajar e tudo mais, mas nem se compara com o que passamos lá (Ucrânia) psicologicamente. Já pude abraçar meus pais, meus irmãos, conheci meu afilhado e agora é tentar voltar a minha vida normal e torcer para quem ficou lá”.

– Como foi esse reencontro com a família?

“Foi especial. Sempre mostrei pra eles que estava bem apesar da guerra e realmente estávamos na medida do possível, porque soubemos de casos muito piores. Ver eles foi um alívio e dar a certeza de que estou bem, agora sem nenhuma preocupação”.

– Qual era o maior temor de vocês em Kherson?

“Kherson não tinha a força do exército ucraniano e era uma cidade apenas com civis, que tentaram resistir jogando coquetel molotov, por exemplo. Os russos revidavam metralhando prédios, carros e mataram cerca de 200 pessoas na entrada da cidade pelo que ficamos sabendo, deixando os corpos pelo chão. Tomaram rapidamente a cidade e a partir do momento que entraram na prefeitura e negociaram com o prefeito, que pediu para viverem em harmonia. Os russos passaram algumas regras e o pessoal voltou a andar na rua. Mas o nosso maior medo era o exército ucraniano entrar na cidade e começar a ter combate lá dentro, porque o meu apartamento era bem no centro e muito perto da prefeitura. Mas graças a Deus isso não aconteceu”.

– Quais foram os momentos mais marcantes e chocantes que presenciou?

“A primeira noite que escutávamos os aviões passando, que largavam bombas na cidade e região. Teve o dia que invadiram Kherson, que vi os tanques de guerra pela primeira vez. Os barulhos de bombas nos primeiros dias também davam muito medo, porque não sabíamos se iria cair na gente, mas depois acabamos nos acostumando. Sentíamos o chão vibrar e a janela tremer. Teve um dia mais tenso que parecia réveillon. Era muito barulho e ficamos sabendo no dia seguinte a defesa antiaérea russa estava derrubando os helicópteros russos. Outro dia marcante foi a nossa saída do país”.

– Como foi essa saída da cidade?

“Pegamos um ‘caminho escondido’, mas perigoso. Saímos em meio ao campo de batalha e depois soubemos que carros foram explodidos por minas e metralhados no mesmo caminho. Poderia ter sido a gente. Sair de lá foi como ter assistido um filme de cinco horas. Haviam muitos bloqueios nas cidades, com tanques de guerra, blindados, soldados fortemente armados. Do lado humanitário é horrível o que está acontecendo, mas foi a maior experiência que já tive na vida”.

– Tem a pretensão de voltar para Ucrânia?

“Com certeza. É o lugar onde mais fui feliz na minha carreira. Gostava muito do clube e das pessoas que me tratavam super bem. Fico muito triste pelo que aconteceu e ouvir do presidente, um cara muito correto, de que não sabe do futuro, que não pode garantir nosso contrato e que podemos procurar novo clube. Mas torço para que volte o clube e o país se reestruture. Se eles quiserem com certeza eu volto”.

– Como será esse período que ficará em Jaraguá do Sul?

“Sempre que estou de férias em Jaraguá faço trabalhos com o Ricardo (preparador físico) e já comecei a treinar de novo. Fiquei 30 dias em casa e fazia algumas coisas, mas longe do condicionamento físico que um atleta precisa. Estou sofrendo nesses primeiros dias, cheio de dor, mas a intenção é recuperar esse condicionamento físico o mais rápido possível pra vida voltar ao normal”.

– Tem acerto com algum novo clube?

“Já viajo na semana que vem para Eslovênia, onde vou jogar os playoffs pelo Dobovec. Como não pretendo voltar para o Brasil e continuar na Europa, achei válido porque vou estar em atividade. A próxima temporada europeia só começa final de julho e não queria ficar parado no Brasil até lá. Como apareceu essa oportunidade, optei ir pra Eslovênia jogar as fases finais. Mas ainda não acertei nada para próxima temporada até porque o time da Ucrânia (Mfc Prodexim) pediu para esperar pra eles terem certeza de que não vai continuar o campeonato”.

– Quais os maiores ensinamentos que leva da guerra?

“O principal é ter um pouco de empatia. Vimos algumas pessoas fazendo piadinha e deixamos tantos amigos lá que perderam casa e muitas coisas. Minha situação era difícil, mas a hora que desse eu colocaria as coisas na mala e viria embora como aconteceu. Já o pessoal de lá ficou sem saber como será o futuro. Quando estava em Odessa, antes de cruzar a fronteira, encontrei um homem que estava refugiado de Mariupol, uma das cidades mais bombardeadas. Ele falou que lá viu pedaços de crianças pelo chão, que perdeu casas e carros. Foi uma lição de vida pra mim de não reclamar e saber que tem gente em situação muito pior. Tem que agradecer o fato de eu estar aqui e bem. Oro e torço para que tudo fique bem com quem está na Ucrânia, porque foi uma situação muito difícil”.

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Lucas Pavin

Jornalista esportivo, com a missão de informar tudo o que rola na região, seja na base, amador ou profissional.