ENTREVISTA ESPECIAL | Dia das Crianças: O mundo sob a lente da Mirella

Foto Eduardo Montecino/OCP

Por: Elissandro Sutil

10/10/2017 - 09:10 - Atualizada em: 12/10/2017 - 15:21

Embora tenha apenas 11 anos, Mirella Meira Piontkiewicz já tem ideia das consequências de uma guerra e do que a corrupção representa. Estudante do 6º ano da Escola São José, em Corupá, no Norte catarinense, ela tem contato com notícias políticas que falam sobre roubo. Ao contar, voluntariamente, sobre sua doença, a atrofia muscular espinhal (AME), ela é taxativa sobre possíveis soluções para pode adquirir os R$ 3 milhões necessários ao tratamento com o Spinraza, um medicamento importado: “Esse dinheiro que estão roubando dava para pagar meu remédio”, lamenta.

Mirella faz parte de um grupo de cinco crianças ouvidas pela reportagem do O Correio do Povo. O objetivo foi descobrir como as crianças e pré-adolescentes enxergam o mundo e os acontecimentos. A nossa primeira entrevistada disse se preocupar com o próximo e acredita que os refugiados da guerra deveriam ser recebidos por outros países com tratamento igualitário.

“Não precisa deixar eles não virem porque eles são diferentes. Eles precisam de um lugar pra viver, né? Lá eles não conseguem viver mais”, diz. Ela gostaria que as notícias veiculadas diariamente fossem mais positivas e, para aumentar o amor entre as pessoas, sua dica é “pensar antes de agir”.

Boa na disputa do xadrez, a menina de 11 anos e cheia de sonhos quer ser arquiteta e designer, mas também gostaria de dar palestras para falar da AME e buscar ajuda para o tratamento.

https://youtu.be/KPF9c-W70ZM

Com quem você mora?

Moro com a minha mãe, Jaqueline, e meu pai, David.

Descreva a sua casa:

Ela não é muito grande, tem uma cozinha com uma sala conjugada, um banheiro e três quartos.

Você tem animais de estimação?

Tenho um cachorro.

Qual o nome dele?

Scooby.

Quando não está na escola, o que gosta de fazer?

Brincar.

E geralmente você brinca onde?

É que minha mãe, ela trabalha. E eu vou lá onde ela trabalha, porque tem crianças lá. Daí, eu brinco com eles.

Onde ela trabalha?

Ela é diarista.

Qual a disciplina que você mais gosta de estudar?

Inglês.

Tem facilidade com essa língua?

Tenho.

Por que você gosta de inglês?

Porque quando eu crescer eu queria viajar para fora.

Gosta de viajar? Em que lugares já foi?

Já fui para São Paulo, vou todo ano.

Você tem família lá?

Não, vou ao médico. Daí também viajo aqui em Santa Catarina, em Joinville e outras cidades.

Que lugar você gostaria de conhecer?

Os Estados Unidos.

Por quê?

Porque eu acho legal e também lá em Orlando…

A Disney?

Isso.

Você sabe quem é o presidente do Brasil?

Acho que é o Temer.

O que você já ouviu falar dele?

Eu ouvi falar só de roubo.

Corrupção?

Uhum.

E qual a sua ideia de corrupção?

Acho que é quando as pessoas não estão fazendo o que é certo. Estão roubando.

A política é um assunto que te atrai?

Mais ou menos.

Onde você ouve falar de política?

Na televisão.

Já ouviu falar sobre guerras?

Sim.

Sabe se está acontecendo alguma atualmente?

Não sei.

Mas você sabe quais as consequências de uma guerra?

É a morte das pessoas.

Sabe o que são refugiados?

São as pessoas que estão fugindo da cidade ou do país delas pra se esconder em outro lugar.

Por que elas estão fugindo?

Porque elas querem viver.

Você acha que os países que não estão em guerra devem receber essas pessoas?

Acho que sim, porque não precisa deixar eles não virem porque eles são diferentes. Eles precisam de um lugar pra viver, né? Lá eles não conseguem viver mais.

Se tivesse uma criança refugiada na tua escola, como você agiria com ela?

Normal, tratar da mesma forma.

Como você gostaria que ela se sentisse?

Como a gente que está aqui, gostaria que ela se sentisse bem, assim, como os outros.

O que você diria para ela?

Eu falaria para ela não ficar com medo, porque a gente só quer ajudar.

Você acha que a paz mundial depende de quais atitudes das pessoas?

Acho que elas não deveriam ficar revoltadas e querendo a guerra, todo mundo deveria querer a paz.

Você sabe o que é solidariedade?

Não.

É exatamente isso que você está falando. Ser solidário é ajudar as outras pessoas. Como você pratica a solidariedade no dia a dia? O que você acha que faz que é solidário?

Posso pensar?

Pode. Em sala de aula, por exemplo, você ajuda os colegas?

É, eu sempre empresto o meu caderno quando os colegas não conseguem terminar de copiar. No recreio, eu sempre divido o meu lanche.

Você tem acesso à internet?

Tenho sim.

O que você busca na internet, quais as páginas que mais acessa?

Quando a gente tem tarefa escolar, eu procuro lá para… quando eu não sei uma palavra de inglês eu procuro lá para traduzir, né? O significado das palavras.

Você tem perfil nas redes sociais?

Tenho.

E você costuma conversar com as pessoas por ali? Com quem você conversa?

Sim. Converso com meus parentes e colegas de aula.

Tem celular?

Tenho.

Você imagina o mundo sem celular e sem internet?

Não, porque as pessoas usam bastante.

Conhece algum youtuber?

Conheço.

Quais canais que mais te interessam?

Eu sempre vejo o canal de uma youtuber e ela sempre faz coisas diferentes.

Sobre o que ela fala?

Depende, sobre maquiagem, ela dá dicas.

O que você sabe sobre bullying?

É quando uma pessoa faz xingamentos para outra várias vezes, todos os dias.

Você já viu alguém fazendo isso?

Sim.

Onde?

Na escola.

O que você acha que a pessoa que sofre bullying sente?

Constrangimento, tristeza.

O que você acha que a pessoa que pratica o bullying sente?

Eu acho que ela deve sentir raiva.

Me explica o que é jornalismo?

Eles pegam as notícias e dão para o povo.

O que um jornalista faz?

Ele sabe o que está acontecendo.

Onde você acompanha as notícias?

Eu vejo no jornal.

E as notícias são positivas ou negativas?

Na maioria, negativas.

Sobre o que elas falam?

Sobre essas coisas de prefeito, presidente, corrupção.

O que você gostaria de ver mais nas notícias?

Coisas boas, pessoas que conseguem uma moradia, que são refugiados, as crianças que são adotadas…

Como você define o amor?

O carinho com as pessoas, as atitudes, né? Quando uma pessoa gosta da outra e trata bem.

O que a gente pode fazer para aumentar o amor entre as pessoas?

Pensar antes de agir.

Me conta alguma história legal que você já tenha lido:

Eu gosto do livro e do filme do Ladrão de Raios.

O Percy Jackson?

Sim, esse mesmo.

Então você gosta de fantasia?

Gosto, e quando eu era pequena minha mãe contava os contos de fadas.

Me conta uma coisa legal que aprendeu na escola?

Raiz quadrada.

Você gosta de matemática?

Gosto.

E onde você vai empregar a raiz quadrada?

É que quando eu crescer eu quero ser arquiteta e designer.

Por quê?

Porque eu acho legal desenhar as cidades e lojas.

O que você acha mais importante na arquitetura e no designer?

Você precisa ver o que a pessoa quer para aí depois você formular.

Você sabe quais os direitos da criança?

Estudar, né? Moradia, roupas, comida.

Todas as crianças têm esses direitos respeitados?

Não.

E os deveres da criança?

Estudar, ler bastante, ajudar em casa.

Além de presentes, o que mais as crianças gostariam de ganhar no dia delas?

Crianças que não têm condições?

Todas as crianças…

Acho que elas gostariam de ganhar carinho, atenção, surpresas, ganhar abraços e beijos.

Você convive com pessoas mais velhas, tios ou avós?

No dia a dia sim, tem dias que eu fico com meus avós.

E como é a convivência com eles?

É legal, a gente brinca bastante.

E sobre o que vocês conversam?

Converso bastante sobre o que acontece na escola.

Você acha que os avós têm paciência com as crianças?

Eu acho que sim.

Eles contam coisas sobre o passado?

Sim, e eu gosto bastante. Meu pai também conta, de quando ele estudava aqui na escola.

Como é o nome desse ursinho?

Ele ainda não tem nome, eu ganhei de uma menina que não queria mais ele.

E você gostou do presente?

Gostei muito.

Que outros brinquedos você gosta?

Gosto do Plasmacar, que é tipo um skate com volante e com rodas e você coloca os pés em cima para andar.

Na escola, tem algo que você pratica?

Eu jogo xadrez. Eu fiquei em terceiro lugar no campeonato.

E qual a estratégia do xadrez?

Primeiro você tem que pensar bem quando o adversário jogar onde está o seu rei, você tem que ficar atento para quando uma pessoa jogar você analisar todos os lados que ela pode virar. Eu acho que ganhei porque ele não prestou muita atenção.

Além de ser arquiteta e designer, quais seus outros sonhos?

Dar palestra.

Sobre o que você falaria?

Sobre a minha vida.

Por quê?

Porque eu queria contar para as pessoas sobre a minha doença, porque está saindo um remédio que paralisa ela e aí se eu conseguisse contar queria falar sobre isso.

E qual é a tua doença?

Atrofia Muscular Espinhal.

Qual o remédio que está saindo para ela?

Spinraza, é que ele paralisa a doença.

E aí é possível voltar a andar?

Melhora os movimentos. Eles falaram que daqui a cinco anos (a doença) ia ter a cura.

Você sabe de alguém que já usou esse remédio?

Não. Mas tem um menino em Joinville que ele tem a mesma coisa, só que é a mais grave, daí é tipo 1, mas ele é bebê ainda. Ele tá quase, mas é que custa bastante.

É caro?

R$ 3 milhões.

E hoje você não tem condições de pagar esse valor para ter o medicamento?

Não tenho.

E como você espera solucionar esse problema?

Governo, campanhas também. Também acho que esse dinheiro que eles estão roubando (referente à corrupção) dava pra pagar o meu remédio.

Vamos fazer um teste. Você é a apresentadora e vai falar para as pessoas. O que você diria?

Meu nome é Mirella, eu tenho uma doença que se chama atrofia muscular espinhal, que é mais conhecida como AME, e eu tenho expectativa de voltar a andar. Só que depende de as pessoas ajudarem.

Antes você andava?

Andava. Eu andei até os sete anos.

“Meu nome é Mirella, eu tenho uma doença que se chama
atrofia muscular espinhal, que é mais conhecida como AME, e eu
tenho expectativa de voltar a andar. Só que depende de as pessoas ajudarem.”