Comandante da PM e especialistas da região comentam decreto que facilita posse de armas

Foto Arquivo/Agência Brasil

Por: Pedro Leal

19/01/2019 - 06:01 - Atualizada em: 21/01/2019 - 10:44

Nesta semana, como havia prometido na campanha, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou um decreto presidencial flexibilizando a legislação que diz respeito ao registro de posse de armas.

A flexibilização abrange moradores de estados com mais de 10 homicídios por 100 mil habitantes em 2016 – critério que abrange todas as unidades da federação.

“Todo e qualquer cidadão e cidadã, em qualquer lugar do país, por conta desse dispositivo, tem o direito de ir até uma delegacia de Polícia Federal, levar os seus documentos, pedir autorização, adquirir a arma e poder ter a respectiva posse“, declarou o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.

Para o comerciante de armas e artigos de caça Otacil de Araújo, proprietário da Savana Pesca e Caça, em Massaranduba, o decreto já era esperado desde o período eleitoral.

“Foram só duas semanas de governo e foi dado este passo, era muito esperado para garantir ao cidadão de bem o direito de defesa”, afirma, frisando que, em sua experiência, grande parte dos proprietários de armas nunca cometeram crimes.

Otacil de Araújo garante que a procura por armas já demonstra aumento | Foto Eduardo Montecino/OCP News

Otacil de Araújo garante que a procura por armas já demonstra aumento | Foto Eduardo Montecino/OCP News

O decreto já causou um aumento na procura, afirma o lojista, que diz receber mais procura por parte de idosos. “Aqui nós temos um problema muito grande na forma de agressões e invasões à residência de idosos, então esta população tem procurado para se defender”, explica.

Para o comandante do 14º Batalhão da Polícia Militar, Tenente-coronel Márcio Leandro Reisdorfer, entretanto, não há muito consenso científico quanto ao impacto que essa legalização pode ter nas mortes por armas de fogo, por falta de dados e estudos empíricos da questão. Atualmente, em Santa Catarina, 43% dos homicídios foram cometidos com armas de fogo.

“É importante frisar que o decreto diz respeito à posse e não ao porte, e que este registro agilizado dará mais transparência no acompanhamento das armas em circulação e que o país não tem um histórico de cenários de ‘atiradores ativos'”, afirma o comandante.

Os cenários em questão são aqueles em que um atirador entra armado em um espaço público com a intenção de causar o maior número possível de mortes – como os tiroteios em escolas e universidades nos EUA.

O militar não nega a possibilidade de que o aumento de armas legais em circulação aumente ainda, por outro lado, a chance destas armas serem furtadas e acabarem na mão de criminosos, embora frise que a transparência ajuda no rastreamento.

Flexibilização divide opiniões

Para o juiz da vara de execução penal de Joinville, João Marcos Buch, o decreto é preocupante e precipitado. “De acordo com todas as minhas experiências como juiz da área criminal e pela análise da criminologia, quem deve ter capacitação para usar armas são as forças públicas”, defende.

Buch considera o contrato preocupante | Foto Vitor Shimomura/Agência AL

De acordo com o juiz, o decreto passa um recado do governo federal para a população, indicando que os cidadãos devem se armar e que o trabalho de segurança não caberia estritamente ao poder público.

“E isso terá consequências para todos nós, no aumento da violência doméstica e de brigas envolvendo pessoas armadas”, prevê.

O advogado Gabriel Girardi diverge. Em sua avaliação, o decreto apenas reduz a subjetividade e a burocracia envolvida no processo de registro  e facilita a aquisição.

Girardi exalta pontos positivos do decreto | Foto Eduardo Montecino/OCP News

Girardi exalta pontos positivos do decreto | Foto Eduardo Montecino/OCP News

“Algo que não está claro para população que não tem intimidade com as leis é que a posse de arma de fogo sempre foi permitida. Um excesso de restrição, em si, nunca existiu”, explica.

Araújo frisa que, embora o decreto presidencial tenha descartado a necessidade de justificativa para a posse de arma, os requisitos para a obtenção de armas de fogo ficaram mais exigentes em tempos recentes.

“Antigamente se burlava os exames, mas hoje se exige uma proficiência muito elevada e os laudos psicológicos não são mais tão simples”, afirma.

Custos não são pequenos

Um empecilho para a obtenção da arma, além dos laudos, exames e certificações exigidas, é o custo da própria arma: na região, um revólver novo, devidamente registrado, começa na faixa de R$ 2,6 mil, podendo chegar aos R$ 6 mil ou mais.

Preço de um revólver pode chegar na casa dos R$ 6 mil | Foto Eduardo Montecino/OCP News

Preço de um revólver pode chegar na casa dos R$ 6 mil | Foto Eduardo Montecino/OCP News

Uma pistola parte da faixa dos R$ 4 mil e, segundo Araújo, os preços assustam os clientes. “As pessoas têm vindo muito para fazer orçamento e se assustado um pouco com os preços, pois é um custo bem elevado”, admite.

Segundo tabela dos fornecedores, 45% do preço das armas é formado por impostos.

Passos seguintes

O próximo passo para a campanha de liberação das armas do presidente Jair Bolsonaro é a anistia de armas irregulares – estima-se que existam cerca de 8 milhões de armas sem registro em circulação no país.

O presidente Jair Bolsonaro também promete trabalhar na volta do recesso do Congresso para liberar o porte de armas no campo.

A informação foi confirmada pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, ao Canal Rural. Porte de armas diz respeito à circulação com arma de fogo fora de casa ou do trabalho .

O que muda

Justificativa

  • Não há necessidade de uma justificativa para a posse da arma, apenas o preenchimento de um formulário;
  • Legislação nova parte da presunção de veracidade na justificativa;
  • Na legislação anterior, ficava a cargo de um delegado da Polícia Federal julgar o pedido.

Validade

  • A validade do registro  passa a ser de dez anos, com autorização para quatro armas, com possibilidade de número maior caso haja comprovação de necessidade;
  • Validade do registro de armas de uso restrito também muda, de três para dez anos;
  •  Registros válidos atualmente serão renovados automaticamente para dez anos da data de emissão ou da última renovação, ao invés do prazo anterior.

Comprovação

  • Não há mais necessidade de comprovação da capacidade técnica para a renovação do registro de posse, apenas para a emissão.

Segurança

  • Em caso de crianças, adolescentes ou pessoas com deficiência mental em casa é adicionada a obrigação de ter um cofre ou outro local seguro e com tranca onde a arma deve ficar guardada.

O que permanece igual

Requisitos para obtenção do registro permanecem os mesmos:

  • Ter mais de 25 anos;
  • Comprovação de idoneidade, mediante certidão negativa de antecedentes criminais;
  • Comprovação de renda e ocupação lícita e residência fixa;
  • Comprovação de capacidade técnica para o uso de arma de fogo;
  • Comprovação de aptidão psicológica, mediante laudo psicotécnico.

E o porte?

O porte – autorização para transitar com a arma de fogo – é proibido, mas as pessoas que se encaixam nos perfis abaixo podem obter o documento:

  • Integrantes das Forças Armadas;
  • Policiais militares, policiais civis e oficiais na ativa;
  • Guardas municipais de capitais ou cidades com mais de 500 mil habitantes;
  • Guardas municipais de cidades entre 50 mil e 500 mil quando estão em serviço;
  • Promotores e juízes;
  • Agentes penitenciários;
  • Funcionários de empresas de segurança privada e de transporte de valores ou que precisem de arma para uso profissional.

Armas, em números

Segundo dados do Sistema Nacional de Armas (Sinarm), do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, o país registra cerca de 45 mil novos registros de arma por ano, com outros 200 mil sendo renovados anualmente.

Em 2018, o país expediu 8.639 novos certificados de porte de arma e 48.330 mil novas armas foram registradas.

Pedidos de posse de armas no país

Foto OCP News

 

Quer receber as notícias no WhatsApp?