Caso Luciane Kochélla chama atenção para depressão pós-parto em Jaraguá do Sul

Foto Divulgação

Por: Elissandro Sutil

10/11/2018 - 08:11 - Atualizada em: 12/11/2018 - 16:15

por Cláudio Costa e Verônica Lemus

Um caso de depressão pós-parto teve um desfecho trágico na tarde de quinta-feira (8), em Jaraguá do Sul. Luciane Vieira Kochélla, 39 anos, mãe de um filho de seis meses, foi encontrada morta no rio Itapocu, após ser dada como desaparecida por quatro dias.

A suspeita é de que ela tenha se jogado no rio após sair de casa. Luciane deixou um bilhete de despedida para o marido em seu carro, encontrado em uma rua sem saída próximo ao rio.

A depressão pós-parto foi diagnosticada logo após o nascimento da criança. Então, ela e o marido, Sidnei Sandro Kochélla, 40 anos, foram morar com a mãe de Luciane, Marli Helena Vieira, 62 anos, que passou a ajudar na criação do menino, enquanto que a filha realizava o tratamento para tratar a doença com o auxílio de medicação.

Os meses de tratamento se passaram e Luciane enfrentava períodos de tranquilidade e tormenta emocional. De acordo com Marli, ela teve um episódio de descontrole emocional, mas nunca havia falado em fugir do convívio com a família e do bebê.

Aparentemente, Viviane passava por um momento tranquilo antes de desaparecer e não demonstrou no dia a dia que poderia cometer um ato contra a própria vida.

Depressão pós-parto atinge mais de 26% das mulheres

Segundo uma pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de 2016, em cada quatro mulheres no Brasil, mais de uma apresenta sintomas de depressão pós-parto.

A pesquisa ouviu 23.896 mulheres no período de 6 a 18 meses após o nascimento do bebê e constatou a prevalência dos sintomas de depressão em 26,3% das entrevistadas.

No mundo todo, cerca de 10% das mulheres grávidas e 13% das mulheres que acabaram de dar à luz experimentam algum transtorno mental, principalmente depressão, segundo informações da World Health Organization (WHO).

“A depressão pós-parto (DPP) é um transtorno de humor muito mais comum do que se imagina. Se caracteriza por sintomas parecidos aos da depressão comum, mas há causas e sinais distintos”, explica a psicóloga Belisa Araújo.

A maioria dos quadros de DPP, informa a psicóloga, é uma continuação de depressão que já existia durante a gestação, apresentada de forma mais grave.

“Por isso alguns profissionais preferem chamar de depressão perinatal, pois este termo inclui todo período gestacional e do puerpério”, diz Belisa.

De forma geral, os sintomas do quadro de depressão pós-parto tendem a surgir na mulher no primeiro mês após o parto, podendo surgir até um ano depois do nascimento do bebê.

A psicóloga e terapeuta perinatal Suellen de Souza também esclarece que alguns sintomas podem surgir entre os primeiros dias e até o primeiro mês de vida do bebê, em um período de conflito emocional chamado de baby blues (tristeza do bebê, em tradução livre).

“É normal que a mulher apresente alguns sintomas, pois ela necessita de tempo para se adaptar às necessidades do bebê e às mudanças na sua vida”.

No entanto, quando os sintomas do baby blues se mantêm por duas semanas ou mais, Suellen aconselha a consulta com um profissional, para avaliar a situação e iniciar o tratamento adequado.

Para Vanessa, apoio foi fundamental para superar tristeza

O baby blues foi o que viveu a acadêmica de direito, Vanessa Huning David de Souza, 28 anos. Em fevereiro de 2016, ela e o marido, Cristiano David de Souza, 31 anos, engravidaram do primeiro filho, Conrado, hoje com dois anos.

A gravidez havia sido planejada e foi muito sonhada pelo casal. Vanessa começou a se preparar e buscas informações sobre parto humanizado, passou a frequentar grupos de mulheres, rodas de conversas sobre gestação e humanização do nascimento.

Mas toda a preparação e toda expectativa para receber o bebê tão desejado não impediram que Vanessa experimentasse momentos muito difíceis dias depois que Conrado nasceu.

“Quando o Conrado tinha sete dias eu retornei ao hospital porque tive problemas nos pontos, com dez dias eu não sabia quem chorava mais, se era o Conrado ou eu por não conseguir amamentar, meu peito sangrava”, lembra Vanessa.

Ela conta que se culpou muito por não conseguir amamentar o filho, chegando a duvidar da sua capacidade de ser mãe.

 

Cristiano com o filho, Conrado, assumindo a cozinha enquanto Vanessa se recuperava após o parto | Foto Arquivo Pessoal

Tanto Vanessa quanto Cristiano são de fora de Jaraguá do Sul e não têm família na cidade, por isso, eram somente os dois para dar conta de toda a responsabilidade.

“Eu não me sentia bem, nem feliz. Via todo o esforço do meu marido, cozinhando enquanto eu me recuperava dos pontos, que deu banho sozinho no Conrado nos primeiros dias, e eu que deveria estar feliz, grata e plena como mãe, sentia tudo, menos isso”, ela conta.

Sentindo tristeza sem explicação e chorando bastante, Vanessa começou a perceber que precisava de ajuda. Foi nas rodas de conversa que ela conheceu a psicóloga Suellen, que também havia sido mãe recentemente, e pode ajudá-la a “sair dessa escuridão do puerpério”, como ela chama.

Caminho para superar medos e culpas

Além de poder trocar mensagens e conversar com a nova amiga, a mãe Vanessa também decidiu voltar a trabalhar.

“Meu filho tinha 70 dias. E eu sentia um misto de culpa e de alívio. Porque eu queria ser uma boa mãe para ele, mas como os sentimentos de não estar sendo útil estavam me rondando eu acreditava que trabalhando seria mais útil para ele”, ela relata.

Hoje, enquanto vive a licença maternidade para cuidar da caçula Alice, de três meses, Vanessa diz que não sabe porque tinha essa ideia em relação ao trabalho, mas ter novamente uma rotina e contato com outras pessoas lhe ajudou a superar o baby blues, ela percebe.

“Hoje sei que sou uma ótima mãe. Sei que falho todos os dias, mas entendo e respeito isso em mim pois sei o quanto me esforço para acertar”, ela conta.

Vanessa e o marido, Cristiano, curtindo com os filhos Conrado e Alice | Foto Arquivo Pessoal

Entender o que é a maternidade real e os problemas diários que ela traz permitem a construção dessa confiança e também a compaixão consigo mesma, tão necessários para a jornada.

 

Orientação, tratamento e empatia

A procura de tratamento psiquiátrico e psicológico é fundamental para lidar com a depressão pós-parto, reforçam as psicólogas. O apoio de amigos e dos familiares, tanto nos cuidados com a mulher quanto com o do bebê, é igualmente importante, para que a mãe se sinta acolhida, compreendida e amada.

“Para quem está próximo, a orientação é paciência e empatia com a condição dela, pois normalmente a mulher já está se criticando bastante e sofrendo demais com sentimento de incapacidade. A cobrança não ajuda, e não é frescura, preguiça, ou qualquer outro julgamento moral”, esclarece a psicóloga Belisa Araújo.

E quanto mais cedo o tratamento começar, melhor é a chance de uma recuperação rápida e completa, afirma a psicóloga e terapeuta perinatal Suellen de Souza.

“A terapia é indicada para que a mulher tenha a chance de expor seus sentimentos e angústias, trabalhar seus medos e sentir-se acolhida sem julgamentos”, aponta a profissional. Antidepressivos também podem ser utilizados, geralmente em combinação com a orientação e suporte, comenta Suellen.

O tratamento e o suporte social e familiar também facilitam que a mulher possa seguir a recomendação de cuidar mais de si, conforme for possível.

Algumas dicas para esse autocuidado incluem aulas de Yoga, exercícios físicos, massagem, acupuntura e meditação, cita Belisa. “Colocar na rotina mais atividades prazerosas, divertidas e relaxantes”, observa a psicóloga.

Procure ajuda!

É importante que a mulher ou algum familiar fiquem atentos aos primeiros sinais e reconheçam a depressão, para que essa mulher receba o apoio e o tratamento necessários o mais breve possível, atenta a psicóloga Suellen de Souza. Sem tratamento, a depressão pode durar meses e até anos.

“Procurar uma rede de apoio, roda de conversas entre mães, e um profissional de saúde mental é o caminho para uma boa recuperação”, ela diz.

Causas e fatores de risco

Não há uma causa única ou uma definição exata da causa da depressão pós-parto, explicam as psicólogas Belisa Araújo e Suellen de Souza.

“É uma combinação de fatores psicológicos, ambientais, hormonais e genéticos”, informa Belisa. Suellen ainda acrescenta, no entanto, que a principal causa da DPP é o enorme desequilíbrio de hormônios no pós-parto.

Principais fatores de risco:

  • Histórico de transtornos mentais, até mesmo de familiares
  • Eventos que podem causar estresse como doenças crônicas
  • Alimentação inadequada
  • Isolamento
  • Privação de sono
  • Parto muito difícil e complicações de saúde na mãe ou no bebê
  • Dificuldade de amamentar
  • Filhos mais velhos com ciúmes

Outros fatores ligados a estrutura emocional e estilo de vida também podem potencializar a doença, apontam as psicólogas.

  • Problemas financeiros, desemprego
  • Expectativas altas e idealizações associadas à maternidade
  • Problemas conjugais e violência doméstica
  • Baixo suporte social e pouca ajuda de terceiros para cuidar do bebê

CUIDADO! Sobrecarga ou falta de ajuda para cuidar do bebê e altas expectativas ou idealizações ligadas à maternidade estão entre fatores de risco para a depressão pós-parto.

Atenção aos Sintomas

É importante que a mãe e os familiares estejam atentos aos sintomas da depressão pós-parto. “Há uma significativa perda de prazer, a mulher perde interesse por atividades que normalmente a interessaria”, aponta a psicóloga Belisa Araújo.

Outro dos sintomas pode ser tanto uma preocupação excessiva com a criança, levando a comportamentos obsessivos, e até mesmo o outro extremo, de apatia e desinteresse, podendo rejeitar o filho.

Fique atento aos principais sintomas da DPP:

  • Dificuldade de concentração
  • Sentimento de vazio
  • Tristeza constante com choro fácil
  • Sentimento frequente de inutilidade e muita culpa
  • Alterações de apetite para mais ou para menos, produzindo alterações no peso
  • Sono prejudicado e não por conta do bebê
  • Incapacidade de cuidar de si mesma e do filho
  • Sentimentos de desamparo e desesperança
  • Pensamentos recorrentes de morte ou suicídio
  • Diminuição da energia e motivação
  • Baixa autoestima
  • Cansaço extremo
  • Medos
  • Desinteresse sexual
  • Ansiedade

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