Na última semana, o auditório da escola de música Belas Artes de Joinville foi palco de uma noite histórica e inesquecível. O evento Sons e Sensaçãoes, marcou a estreia da Orquestra de Pessoas com Deficiência Visual da AJIDEVI (Associação Joinvilense para Integração dos Deficientes Visuais) reuniu dezenas de músicos e coralistas que, ao lado do público, protagonizaram um espetáculo de diversidade e inclusão.
A ideia da orquestra nasceu há cerca de três anos, quando o músico e regente Nery Júnior, formado pelo Belas Artes Joinville, iniciou seu trabalho na AJIDEVI. Ao perceber o potencial dos alunos e a estrutura disponível na instituição, ele começou a sonhar com um projeto coletivo. “Meu planejamento foi ensinar o mesmo repertório em diferentes instrumentos, tudo na mesma tonalidade, para depois juntar e formar a orquestra. Ver esse sonho se concretizar no palco foi emocionante”, afirmou o maestro.
O processo de formação envolveu dedicação e paciência. Muitos integrantes não tinham experiência prévia com música, mas encontraram no aprendizado uma forma de superar barreiras e redescobrir o prazer de estar em grupo. “Não são todos músicos profissionais. São pessoas que perderam a visão em diferentes momentos da vida e que encontraram na música acolhimento, terapia e, agora, a oportunidade de se apresentarem diante de um público”, contou Nery.
Diversidade no palco
O espetáculo apresentou um repertório eclético e brasileiro, com baião, xote, Tonico & Tinoco, Jota Quest e Tom Jobim. No palco, estavam um baterista profissional, um jovem tecladista em formação, flautistas, violonistas, coralistas e até um grupo de cordas iniciante. “Essa diversidade mostra que a deficiência não limita talentos. Tivemos jovens, adultos e idosos, cegos totais e pessoas com baixa visão, todos unidos pela música”, destacou o regente.
Foi uma noite de muito som e de diversas sensações. Muitos relataram se sentir inspirados pelas histórias de vida dos músicos, que transformaram desafios em potência artística. “A música tem essa força: ela transmite emoção de forma única. O que vimos aqui foi inclusão acontecendo no palco, com autenticidade e sensibilidade”, comentou uma espectadora ao final da apresentação.
Inclusão e inovação cultural
A orquestra chama atenção não apenas pelo repertório, mas pelo seu caráter inovador: todos os integrantes, incluindo o maestro, têm deficiência visual. “Em Joinville nunca houve uma experiência semelhante, e acredito que em Santa Catarina também não. É um marco cultural para a cidade e para a comunidade de pessoas com deficiência”, afirmou Nery.
No Brasil, a principal referência é a Orquestra de Cantores Cegos, do Espírito Santo, mas o diferencial joinvilense é reunir músicos, cantores e regente com deficiência visual em um mesmo grupo instrumental e coral. “É um exemplo de como a arte pode ampliar horizontes e criar novas possibilidades para além das limitações físicas”, complementou o maestro.
Sem patrocinadores além do apoio da AJIDEVI e do espaço cedido pelo Belas Artes Joinville, a orquestra contou com a energia do público como seu maior incentivo. “Neste momento inicial, a melhor forma de apoiar é prestigiar, compartilhar e dar visibilidade. Esse retorno da plateia é o combustível para que possamos crescer e consolidar o projeto”, destacou Nery.
Próximos passos
A estreia foi apenas o começo. A orquestra já tem participação confirmada no Natal de Joinville (Natal Luz), em novembro, na Travessa Bachmann, e deve iniciar ensaios para um repertório natalino nas próximas semanas. A expectativa é que, com a repercussão positiva, novas parcerias se somem à iniciativa.
“Ver os integrantes se emocionando no palco, muitos pela primeira vez em uma apresentação, foi uma experiência inesquecível. A estreia mostrou que a música é capaz de transformar vidas e de sensibilizar toda uma comunidade. Este foi apenas o primeiro capítulo de uma história que promete muitos outros momentos marcantes”, concluiu o maestro Nery.