Quem são esses jaraguaenses: a história de família e trabalho duro por trás do Maloka Lanches

Por: Claudio Costa

03/08/2016 - 08:08

O dia a dia de uma lanchonete é bastante árduo e dedicação é algo essencial nesta atividade. Além de um lanche saboroso, atenção aos detalhes e um ótimo atendimento são peças chave para manter uma clientela fiel. Esses itens fazem com que o Maloka Lanches, estabelecimento localizado na rua Walter Marquardt, no bairro Barra do Rio Molha, seja uma referência aqui na cidade. Três gerações da família Püttjer são responsáveis por construir uma bela história de sabor e tradição.

Margot, oma Winni e Rodolfo: as três gerações da família Püttjer (Foto:Cláudio Costa/Por Acaso)

Margot, oma Winni e Rodolfo: as três gerações da família Püttjer (Foto:Cláudio Costa/Por Acaso)

Tudo começou em 1985. Guido Püttjer e outros três amigos decidiram abrir uma choperia no terreno da sua família. Para isso, eles construíram a grande choupana, aquela que hoje ocupa o centro do atual estabelecimento. Mas os desentendimentos entre os sócios eram frequentes e isso exigiu a intervenção da oma Winni Püttjer, mãe de Guido. Depois de poucos meses de funcionamento, ela comprou o estabelecimento e ampliou a estrutura. O local ganhou novos banheiros, cozinha e um depósito, tudo numa configuração um pouco diferente da atual.

A primeira construção do Maloka, em 1985 (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

A primeira construção do Maloka, em 1985 (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

Do Green Space ao Maloka Lanches

Com o negócio nas mãos, mas sem experiência alguma no ramo, oma Winni decidiu alugar o espaço para um conhecido em 1986. O Green Space foi aberto e era frequentado basicamente por jovens. Ao som de rock e dado o consumo de drogas por alguns dos clientes, a lanchonete não era “bem frequentada”, como definiu a matriarca.

No ano seguinte, o casal Margot Püttjer e Jaime Schmitz passou a administrar interinamente o local. Os pais de Margot, Winni e Heinz Püttjer (falecido em 2011, aos 82 anos) assumiram o estabelecimento algum tempo depois e, assim, o Maloka Lanches foi registrado em 1º de setembro de 1987.

Heinz Püttjer atrás do balcão do Maloka Lanches (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

Heinz Püttjer atrás do balcão do Maloka Lanches (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

Os novos administradores encontraram dificuldades para tocar o negócio. Afinal, o estabelecimento tinha uma nova direção, mas a clientela não era a ideal. A matriarca estava cansada de eventualmente encontrar saquinhos com pó branco nas frestas do banheiro. “Eles diziam que era talco”, comenta Margot.

Para mudar o cenário, oma Winni tomou uma decisão radical. Substituiu os clássicos do Led Zeppelin e do Barão Vermelho pela música tradicional alemã. “A gente colocava sempre depois do que eles escutavam. Tanto que os rapazes acabaram se retirando e se tornou uma tradição”, conta. Os clientes que frequentam a lanchonete se deparam com a música ambiente na língua germânica até hoje.

Imagem: Reiner Modro / 2015

Oma Winni e realezas das sociedades de tiro. Imagem: Reiner Modro / 2015

Outra grande dificuldade que o casal enfrentou no momento em que assumiu as atividades da lanchonete foi a confecção dos lanches. Oma Winni foi até a lanchonete Varandão com a intenção de obter ajuda para montar o cardápio. “Eu não sabia nada, nada. Daí, eu fui lá no Varandão para perguntar como fazia um x-salada. E eles disseram que não”, relembra.

“Eu vim pra casa e disse para o Jaime que iria no Três Espinheiros, porque ninguém me conhecia lá”, detalhou oma Winni. Antes mesmo de chegar na lanchonete, a matriarca dos Püttjer encontrou uma funcionária amiga dela. “Ela me deu as folhas com os lanches e com as bebidas”, explica oma Winni. As receitas foram copiadas e coladas nas paredes da cozinha para que todos pudessem aprender a fazer os lanches.

O x-real e um copo de suco de maracujá com o chorinho (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

O x-real e um copo de suco de maracujá com o famoso “chorinho” (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

O Maloka guarda atrativos gastronômicos peculiares. Um deles é o chucrute que vem junto com a salada servida nos lanches. “A ideia foi sugestão de um distribuidor da empresa Dequech. Ele disse que seria uma diferencial nos lanches”, conta oma Winni. O destaque do cardápio do estabelecimento é o x-real. Além do hambúrguer artesanal de 150 gramas de carne nobre e temperos que são segredo da casa, o lanche remete ao primeiro x-salada feito no Brasil. “Eu fui pesquisar como eram feitos os primeiros x-salada. Descobri que o primeiro x-salada foi feito em São Paulo. Originalmente, ele levava queijo, tomate e alface”, comenta Margot.

Recreativa da Polícia Militar

Nos anos 90, o Maloka passou por mudanças nas suas instalações e reforçou a sua clientela. Uma delas composta pela primeira turma de policiais militares formada em Jaraguá do Sul, em 21 de setembro de 1991. Meses antes, após o árduo treinamento feito no Pavilhão de Evento, os 43 aspirantes a policiais militares se refrescavam tomando cerveja no Maloka. “Quando o sargento Moreira passava com a tropa perto do Maloka gritava: ‘esquerda, volver’”, brinca oma Winni.

Painel com índios da nota de mil cruzeiros após a pintura, em 1993 (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

Painel com os índios da nota de mil cruzeiros após a pintura, em 1993 (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

O estabelecimento era praticamente uma “recreativa” dos policiais militares. Segundo oma Winni, todos os policiais tinham conta no estabelecimento e, quando chegava o pagamento, uma fila era formada pelos PMs e tudo era pago corretamente. Um dos policiais da primeira turma foi protagonista de uma história de amor no Maloka. O policial militar Ramos pedia os seus lanches para Giovana, assistente de Winni na cozinha, que não dava muita bola para o PM. “Um belo dia eu vi os dois namorando”, exclama oma Winni. A relação gastronômica entre os dois ficou cada vez mais estreita e acabou no altar.

Fachada da famosa lanchonete jaraguaense. Foto: Google - 20015

Fachada da famosa lanchonete jaraguaense. Foto: Google / 2015

Além dos policiais militares Novaes e Lima, o Maloka é frequentado por outros clientes assíduos. Vladimir Mazurek, Poffo, Picolli e Odair Grandes são alguns dos nomes lembrados por Margot e oma Winni. O deputado estadual Vicente Caropreso, o ex-prefeito Irineu Passold e os empresários Werner Voigt (falecido em 2016), Gilberto Menel (falecido em 2011) também apreciaram os lanches da casa. O estabelecimento recebe moradores de Pomerode, Schroeder, Guaramirim e Massaranduba. Grupos de motociclistas do Paraná e de São Paulo incluem a lanchonete no roteiro quando passam por Jaraguá do Sul.

Oma Winni com quadro em alusão ao deutsches eck, cantinho alemão na língua alemã (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

Oma Winni com quadro em alusão ao deutsches eck, “cantinho alemão” na língua alemã (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

Antigamente o trabalho era intenso, começava às 9h da manhã e seguia até tarde da noite. O casal servia lanches, refrigerantes, Chocoleite e biscoitos para os trabalhadores das empresas próximas. Mas, em algumas noites, o expediente era prolongado por horas e até dias. Clientes costumavam jogar cartas no estabelecimento. “Ele (Heinz) ia dormir e eu ficava para colocar as toalhas pra lavar. Eles ficavam jogando baralho e muitas vezes se serviam sozinhos, tamanha a confiança que a gente tinha”, ilustra oma Winni, ao dizer que era comum que os jogadores utilizassem os ônibus da Malwee para voltar pra casa durante a madrugada.

Oma Winni durante os festejos de uma primeira comunhão (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

Oma Winni durante os festejos de uma primeira comunhão (Reprodução: Cláudio Costa/Por Acaso)

Limpeza

A maior preocupação de oma Winni, aos 83 anos, com certeza é com a limpeza do estabelecimento. “Os nossos distribuidores dizem que nunca encontram uma cozinha tão limpa quanto a nossa”, conta a matriarca. Apesar de estar afastada pela idade há quatro anos, ela continua a percorrer as instalações do Maloka Lanches e conversar com todos os fregueses, sem deixar de verificar de perto a limpeza do local. “Se você observar bem, vai ver que não há uma teia de aranha nos cantos das madeiras. Isso é algo que precisa sempre ser limpo”, relata oma Winni, com a autoridade de quem conquistou gerações de clientes pelo seu preciosismo.

Limpeza sempre foi um dos pontos principais do trabalho no Maloka. Na foto, alvará dando nota "A" para as condições de higiene do local (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

Limpeza sempre foi um dos pontos principais do trabalho no Maloka. Na foto, alvará dando nota “A” para as condições de higiene do local (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

Um episódio envolvendo a fama de limpeza do Maloka foi lembrado por oma Winni. Em 2000, quando a Vigilância Sanitária de Jaraguá do Sul dava notas para as condições de higiene dos estabelecimentos, o Maloka Lanches ganhou a classificação “A”. “Mas o prefeito Irineu Pasold achou que um local com piso de cimento não poderia ter esse padrão de limpeza. Então, ele pediu que uma equipe da vigilância fizesse novamente a inspeção com a presença dele”, desabafa oma Winni. Segundo ela, uma nova visita foi feita e o estabelecimento passou com louvor pela inspeção.

Oma Winni (esquerda) e Margot (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

Oma Winni (esquerda) e Margot (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

O Maloka passou por diversas modificações na sua estrutura através das décadas, mas não perdeu a sua essência. Se você procura um lugar aconchegante, com bom atendimento e deliciosos lanches, a lanchonete pode muito bem estar na sua lista. Hoje, as filhas de oma Winni, Denise, Brigitte e Margot Püttjer (gerente administrativa), são as donas do local. Outro elemento importante no funcionamento do estabelecimento é o filho de Guido, Rodolfo. Ele é responsável pela copa e foi eleito o melhor garçom de Jaraguá do Sul, em votação feita pelos leitores do Por Acaso em 2015.

Rodolfo Püttjer, o melhor garçom. Foto: Cláudio Costa

Rodolfo Püttjer, o garçom preferido. Foto: Cláudio Costa

Outras curiosidades do Maloka:

– Vindos em três ônibus, em determinada ocasião 108 cabos eleitorais foram atendidos ao mesmo tempo no Maloka. Todos os lanches e bebidas foram iguais. O grupo fazia campanha para uma política da cidade.

– O mascote do Maloka Lanches foi desenvolvido por Silvio, um amigo de Margot;

(Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

(Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

– Se você pede um suco no Maloka, é certo que venha mais um copinho com um “chorinho”.

– Certa vez um cliente pediu um bauru (pão, queijo, rosbife, tomate e pepino) para oma Winni. Sem saber fazer o lanche, ela pediu para as pessoas como fazer. Envergonhada, fez o sanduíche, que foi posteriormente elogiado pelo freguês;

"Zoológico" da oma Winni foi comprado em Ibirama (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

“Zoológico” da oma Winni foi comprado em Ibirama (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

– No inverno, é feito um quentão com ingredientes especiais da casa;

No inverno, é servido o tradicional quentão com receita da casa (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

No inverno, é servido o tradicional quentão com receita da casa (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

– O aperitivo da casa é receita do antigo bar Marobá, antes localizado na rua Max Wilhelm.

O tradicional drink do Maloka Lanches (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)

O tradicional drink do Maloka Lanches (Foto: Cláudio Costa/Por Acaso)