Passado um ano da greve dos caminhoneiros que parou o país por 11 dias em 2018, a situação da categoria está pior do que estava antes da paralisação. Está é a avaliação do presidente da Associação dos Caminhoneiros Autônomos do Vale do Itapocu (Acavi), Kelvyn Cristofolini.
“Antes ao menos tínhamos carga para trabalhar, agora nem isso temos direito”, afirma, apontando a situação crítica.
No papel, as demandas do movimento foram cumpridas, explica o caminhoneiro. “Temos a tabela do frete, temos a isenção do pedágio para o eixo suspenso, tivemos o congelamento do preço do diesel. Mas na prática as coisas estão piores”.
Segundo um dos líderes da categoria na região, grande parte das cargas seguem abaixo da tabela do frete – especialmente mais ao norte do país, tornando a viagem de volta muita vezes um caso de “pagar para trabalhar”, afirma Cristofolini.
O fim da retenção do preço do diesel levou a aumentos consideráveis – no começo desta semana, o preço médio do combustível S500 (mais poluente) chegou a R$ 3,73, enquanto o S10 (com menos enxofre) alcançou R$ 3,65.
No ano passado, os preços médios no início de maio estavam em R$ 3,55 (S500) e a R$ 3,64 (S10). Mas se atualizados pelo IPCA, considerado o índice oficial de inflação do país, esses valores hoje representariam R$ 3,86 (S500) e R$ 3,96 (S10).
Com um grande número de caminhões em circulação, poucas cargas e as despesas batendo, muitos caminhoneiros tem se visto na necessidade de aceitar preços baixos, afirma o autônomo Ivan Jair Testoni.
“Tem muita gente que prefere deixar o caminhão parado ou fazer uma rota sozinho a pegar uma carga com preço abusivo, mas com a oferta infelizmente sempre tem quem pegue”, lamenta.
Testoni destaca que grande parte dos autônomos tem se deparado com o endividamento.
“São muitos que estão inadimplentes, alguns até recorrendo à empréstimos com juros abusivos porque já estão com o nome sujo. O fato de ser generalizada a situação acaba ajudando a gerar empatia dos prestadores de serviço”, nota, destacando que borracharias, mecânicas e outros integrantes da “malha de apoio” do setor sabem que a falta de pagamento não é por má vontade.
Cargas de grãos tem passado pela maior dificuldade
Segundo Cristofolini, com grande parte das cargas tem sido fácil barganhar por um preço maior – e setores da indústria e frigoríficos tem cumprido a tabela do frete.
“O que tem sido mais difícil é com o agronegócio, particularmente com grãos”, afirma.
Como a carga não é perecível e a capacidade de armazenamento tende a ser maior, alguns produtores e negociadores veem menos problema em reter o produto até que alguém aceite o preço.
“É diferente de um frigorífico, por exemplo, que tem que se preocupar com a carne estragar ou de uma fábrica que precisa de matéria prima e de espaço para o estoque, eles só tem que se preocupar com esvaziar quando chega a próxima safra”, afirma.
“No começo estavam seguindo a tabela do frete, mas aí o agronegócio veio batendo”, diz Testoni.
Segundo o caminhoneiro, 80% das indústrias pagam às transportadoras e os autônomos os valores da tabela, enquanto os produtores de grão tentam pressionar o preços para baixo.
A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária tem repetidamente questionado a tabela do frete. O último pedido de revisão da tabela pelo setor, após um ajuste de 4,13% para acompanhar a alta no diesel, veio no dia 21, juntamente com três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI).
Testoni ainda nota que muitas rotas – particularmente no norte do país – envolvem travessias longas e locais com pouca infraestrutura e segurança.
“Se você for pegar uma balsa no Amazonas, por exemplo, são sete, oito dias que você perde e que poderia estar em outro contrato. Dependendo do tempo, temos estradas de barro em que se perde muito tempo e que poderiam ser mais rápidas com obras adequadas”, diz
Demanda é por qualidade
Segundo Cristofolini, o setor pede por condições de trabalho, dentre tabela do frete, paradas na estrada e rodovias com qualidade – e não, como as medidas que foram tomadas este ano sugere, subsídio.
“O governo federal liberou recurso para transportadoras e criou este cartão caminhoneiro, mas não é isso que queremos. Isso só vai aumentar o número de caminhões e gerar mais fonte de dívida”, explica.
Ele ressalta que os aumentos do frete no papel e os reajustes do combustível têm aumentado os custos em toda a cadeia de trabalho, mas os autônomos não veem este retorno.
“Aumenta alimento, aumenta combustível, bateria, pneu, serviços, mas não estamos recebendo mais”, critica.
De acordo com o presidente do grupo de classe, o setor tem evitado uma paralisação até julho, esperando que a obrigatoriedade da tabela do frete seja devidamente aplicada até lá.
“Estamos até com dificuldade para negociar, pois teoricamente nossas exigências foram atendidas. Mas está cada vez mais difícil segurar o setor. Muitos querem parar novamente”, comenta.
Ele frisa que antes da greve de 2018 o setor estava desorganizado. “Aqui na região não havia uma entidade de classe, a paralisação levou a nossa organização e ao diálogo em Brasília. Agora esperamos ver medidas na prática”, diz.
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