O Brasil, apesar de ser um “gigante em biodiversidade e pesquisa”, conforme destacado por relatórios, enfrenta uma crise estrutural que o torna um dos países mais complexos e “travados” para pesquisadores. Essa realidade é evidenciada pela queda de 7,2% na produção científica em 2023, segundo dados da Elsevier-Bori, repetindo uma tendência de declínio iniciada em 2021. A análise desse cenário revela causas multifatoriais, desde cortes orçamentários até a desvalorização da carreira acadêmica, e aponta para soluções urgentes.
Principais obstáculos:
1. Subfinanciamento crônico:
O orçamento para ciência sofreu reduções drásticas, com perdas acumuladas de R$ 117 bilhões (valores reais corrigidos pelo IPCA) desde 2014, quando atingiu seu pico. Em 2021, 91% do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) foi contingenciado, inviabilizando projetos e compra de insumos básicos, como reagentes. Laboratórios chegaram a ter dificuldades para pagar contas de luz, mesmo possuindo equipamentos de ponta.
2. Falta de atração para jovens pesquisadores:
Bolsas de pós-graduação, mesmo após reajustes em 2023, permanecem insuficientes (R$ 2,1 mil para mestrado e R$ 3,1 mil para doutorado). Salários iniciais de professores universitários com doutorado são inferiores aos de profissionais de TI, desestimulando a carreira acadêmica. Além disso, bolsistas não têm direitos trabalhistas como 13º salário ou aposentadoria.
3. Burocracia e fragilidade institucional:
A dependência de emendas parlamentares para financiar pesquisa e a instabilidade política geram incertezas. Projetos como o PL 675/2022, que propõe incluir tempo de bolsa na aposentadoria, tramitam lentamente no Congresso.
4. Desconexão entre pesquisa e mercado:
Apesar de ser líder em patentes na América Latina (58%), o Brasil falha em converter ciência em negócios escaláveis. Faltam políticas para integrar universidades e empresas, como parcerias público-privadas.
Caminhos para reversão:
– Recomposição Orçamentária: Cumprir a Lei Complementar 177/21, que proíbe contingenciamento do FNDCT, e retomar investimentos em patamares pré-2014.
– Valorização da Carreira: Aumentar bolsas e salários, garantir direitos previdenciários e criar planos de carreira além da docência, como em startups e centros de inovação.
– Infraestrutura e Planejamento: Direcionar recursos para custeio (insumos, manutenção) e infraestrutura, além de priorizar áreas estratégicas como biotecnologia.
– Incentivo à Inovação: Ampliar programas como o Brazil Biotech Report, que propõe internacionalização de biotechs e atração de investidores.
O Brasil tem potencial para ser um hub global de pesquisa, mas precisa superar a “janela de dez anos de estagnação” com políticas de Estado, não de governo. A reversão do status atual exige urgência, pois, como alertou o presidente da ABC, “leva décadas para construir um sistema de tecnologia, mas pouco tempo para destruir”. A ciência não é um gasto, mas o alicerce para desenvolvimento econômico e soberania nacional.