O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou uma decisão que permitiu a apreensão de um recém-nascido logo após o parto em Blumenau. O pedido partiu do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) após a suspeita de que a mãe da criança iria entregar o bebê para que a prima e a companheira dela o criassem.
Em nota, a promotoria alegou que ação teve como objetivo garantir a adoção legal da criança.
O caso ocorreu em junho desse ano – em maio deste ano, o MP entrou com uma ação de destituição de poder familiar após a suspeita de que a gestante, na época com 18 anos, gostaria de entregar o filho a prima e a companheira dela, para quem ambas criassem o bebê, pois não teria condições. Isto, segundo a promotoria, configuraria em adoção ilegal.
“A promotora de justiça ressaltou que o casal se aproveitou da gravidez indesejada […] para satisfazerem interesse próprio de forma clandestina e em violação aos preceitos legais dispostos no Estatuto da Criança e do Adolescente [ECA], já que inexiste situação consolidada apta a excepcionar o procedimento de adoção, em razão da criança sequer haver nascido”, diz a decisão do STJ.
Atendendo ao pedido, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) concedeu em tutela de urgência a busca e apreensão do bebê após o nascimento, além de suspender e proibir o contato da família da mãe com a criança e entregá-la ao primeiro casal habilitado na fila de adoção.
Sendo assim, conforme o processo, depois que a mulher deu a luz ao filho, em junho, ele foi encaminhado a uma instituição de acolhimento.
Para a decisão, o juiz teria justificado que o menino precisava ter a integridade física e psicológica preservada, assim como a garantia de “ser educado em ambiente adequado, sem mentiras e longe atitudes descuradas”.
Porém, o STJ votou contrário a decisão, em julgamento de 29 de novembro. Segundo o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator da ação, a retirada da criança ainda no hospital “causa certa perplexidade”, já que o fato ocorreu em uma situação onde a mãe estava em condição de extrema fragilidade física e emocional.
Além disso, o magistrado ressaltou que a mãe tem o direito de entregar o filho à adoção, caso queira, desde que seja comunicado à Vara da Infância e Juventude. No entanto, mesmo com a suspeita do ato ilegal, o pedido de apreensão não seria uma decisão “plausível”.
Além disso, a decisão alega que a mãe da criança, que agora está empregada, desistiu da adoção e que, agora, pretende criar o bebê. Sendo assim, o STJ, por unanimidade, votou para revogar a decisão e determinou que a criança voltasse imediatamente para a mãe.
Em nota, o MP afirmou que a atuação da promotoria e da Justiça foi correta. O órgão disse que, segundo o processo, a mãe da criança morava em outro Estado e teria dito que retornaria a sua cidade natal após o nascimento, sem o bebê, que deveria ser criado e educado por outras pessoas.
Além disso, a mulher teria entrado com uma ação para que a criança “sequer fosse registrada em seu nome”, mas sim com o nome do casal para quem a entregaria. A promotoria só teria aberto a ação de destituição do poder familiar após saber do outro processo.
“O objetivo do MPSC sempre foi, e ainda é, garantir que a adoção viesse a ser realizada da forma legal, observando o cadastro único de adoções, gerido pelo CNJ, no qual inúmeras famílias aguardam por longos anos por um filho, mesmo após passarem pelos procedimentos legais que asseguram o direito e a integridade da criança”, diz a nota.
Além disso, a promotoria alega que a ação teve como objetivo garantir a integridade da criança e que o direito de arrependimento da mãe biológica não se aplicaria ao caso, já que ele é garantido “apenas para as genitoras que entregam o filho de forma regular para a adoção, o que não aconteceu”.
Por fim, o MP alega que seguirá “buscando junto ao Poder Judiciário todas as medidas legais necessárias para que sejam observados os ditames legais, o cadastro único de adoções do CNJ e principalmente a proteção as crianças e adolescentes, além do próprio sistema de proteção das crianças em nosso Estado”. (veja a nota na íntegra abaixo)
Veja a nota na íntegra:
“A respeito da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que vem repercutindo na imprensa e redes sociais, proferida na última terça-feira (29/11), no julgamento do HC 776.461/SC, que determinou a restituição imediata de um bebê à sua mãe biológica, a par do absoluto respeito do MPSC à decisão proferida pelo STJ e pelo papel do Tribunal na consolidação dos direitos da população brasileira, seguiremos buscando demonstrar, pelos recursos cabíveis, que a atuação do MP e da Justiça catarinense foi correta.
O caso em questão diz respeito a uma mãe que entregou voluntariamente seu filho para terceiros logo após o nascimento, sem observar a lista oficial de adoção. Ao que consta, a mãe da criança morava em outro Estado e, segundo seu próprio relato, tão logo o filho nascesse iria retornar à cidade de origem sem o bebê, que deveria ser criado e educado como filho por outro casal. A genitora ainda ingressou com um processo judicial para que a criança sequer fosse registrada em seu nome, mas sim diretamente como filha desse casal a quem pretendia entregar a criança para adoção irregular, o que não é permitido pela lei.
A Promotoria de Justiça ingressou com a ação de destituição do poder familiar somente após tomar conhecimento da ação judicial privada, ajuizada pela mãe em conjunto com o casal para quem ela pretendia entregar o filho para a adoção irregular.
O objetivo do MPSC sempre foi, e ainda é, garantir que a adoção viesse a ser realizada da forma legal, observando o cadastro único de adoções, gerido pelo CNJ, no qual inúmeras famílias aguardam por longos anos por um filho, mesmo após passarem pelos procedimentos legais que asseguram o direito e a integridade da criança.
A lei é clara em definir como motivo para a destituição familiar a entrega de uma criança à adoção fora do sistema legal (Código Civil, artigo 1.638, inciso V).
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I – castigar imoderadamente o filho;
II – deixar o filho em abandono;
III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
V – entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção.
Portanto, a ação do MPSC no caso concreto e a decisão do Judiciário catarinense buscaram assegurar a integridade da criança e o respeito aos ditames legais. Ao que compreendeu a Promotoria de Justiça, não se aplicaria ao caso o direito de arrependimento da mãe biológica, previsto no ECA, uma vez que esse direito é garantido apenas para as genitoras que entregam o filho de forma regular para a adoção, o que não aconteceu.
O MPSC seguirá buscando junto ao Poder Judiciário todas as medidas legais necessárias para que sejam observados os ditames legais, o cadastro único de adoções do CNJ e principalmente a proteção as crianças e adolescentes, além do próprio sistema de proteção das crianças em nosso Estado”.