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Riqueza rural: ver a terra livre do agrotóxico emociona produtor

Por: Elissandro Sutil

06/05/2018 - 07:05 - Atualizada em: 07/05/2018 - 12:22

Aos 70 anos, o produtor de alimentos orgânicos Romualdo Campigotto sente orgulho de mostrar sua produção na terra que adquiriu há mais de 40 anos e onde criou os filhos. Na localidade São Pedro, no bairro Garibaldi, sua casa fica no alto de uma colina, de onde se avista a abundante natureza.

Grande parte da propriedade é tomada pelos bananais. São 13 mil pés. Mas, olhando com cuidado, logo se percebe que não são só bananas que crescem por ali. É possível encontrar mamão, tangerina, batata doce, chuchu, palmito e até mesmo pés de café. Entretanto, nem sempre foi assim.

Foto: Eduardo Montecino/OCP News

O agricultor conta que se dedica à bananicultura há décadas, antes cultivada de forma tradicional. Assim, o uso de agrotóxicos não permitia outras culturas paralelas à da banana. Apesar dos bananais serem mais limpos, pois nada crescia entre os pés da fruta, o manejo com o veneno cobrou seu preço.

Campigotto já passou por duas cirurgias em decorrência do câncer. O assunto é delicado e o emociona muito, mas também serve para reafirmar a escolha que fez há 11 anos e que transformou sua propriedade e sua vida. A produção de orgânicos, hoje, garante a saúde de quem trabalha na terra e também do consumidor.

“A gente usava aquelas máquinas de pulverizar a bananeira, com a bomba manual (ele mostra a posição em que ficava, com o braço levantado acima da cabeça). Passava o dia todo embaixo daquele veneno sem máscara, sem nada”, conta o produtor.

A doença, infelizmente, está relacionada ao uso de componentes químicos para combater pragas, insetos e plantas que possam interferir no desenvolvimento da plantação.

Foto: Eduardo Montecino/OCP News

Por isso, não é incomum que os agricultores apresentem câncer, principalmente na pele. Hoje, os produtores rurais já contam com estudos e sabem da necessidade de se proteger, mesmo assim, muitos decidem dar outro rumo à atividade.

“É verdade que agora tem mais mato, mais bicho, bastante vespa, aranha, formiga, tem cobra, mas também tem vida. Tudo nasce e cresce. A gente usa esterco de gado e de frango para adubar a terra, é tudo natural, orgânico”, ressalta.

Cultivo com foco na preservação

Cultivados sem o uso de agrotóxicos, adubos químicos ou substâncias sintéticas que agridam o meio ambiente, esses produtos compõem um mercado em expansão.

A ascensão do mercado de orgânicos no Brasil é simbolizada por um faturamento da ordem de R$ 3 bilhões  em 2016, e por um número de produtores na casa de 15 mil, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Foto: Eduardo Montecino/OCP News

Mas, para que a propriedade esteja apta para produção orgânica, precisa obedecer uma série de normas. Para ser considerado orgânico, o processo produtivo contempla o uso responsável do solo, da água, do ar e dos demais recursos naturais, respeitando as relações sociais e culturais. O foco da agroecologia é preservar.

O controle de pragas é feito com produtos certificados, registrados pelo Mapa. No entanto, no sistema orgânico, a planta adquire imunidade e se reestrutura praticamente sozinha. Também podem ser usados os biofertilizantes.

Foto: Eduardo Montecino/OCP News

“Olha, no começo foi meio difícil, porque a banana não se acostumava tão bem. Mas, agora está se adaptando bem. Primeiro, se passava veneno até na estrada, hoje em dia não se pode passar nada, nada. Era tudo limpo (a rua), mas agora só passando a roçadeira”, revela.

Se o trabalho aumentou por conta da limpeza que deve ser feita em intervalos mais curtos, por outro lado, a fruta está menor e, portanto, mais leve. Há mais vantagem financeira para o produtor, além do primordial: disposição e saúde para lidar com a terra.

“Então, o trabalho se torna um pouco mais pesado por um lado. E numa parte também é mais leve porque a banana não dá tão graúda assim. O rendimento (retorno financeiro) é bem mais na orgânica do que na convencional. Dá menos serviço para colher e você consegue valor maior”, aponta.

Produtores também auxiliam a fiscalização

Na propriedade dos Campigotto, são produzidas banana branca e caturra. “Sempre tive banana, nesse terreno aqui tinha 35 mil pés plantados. Depois, os filhos arranjaram outros empregos e a gente diminuiu. Agora, dois dos cinco filhos ajudam na produção de orgânicos.”

Natural de Rio dos Cedros, Romualdo Campigotto diz que sempre trabalhou na roça. Casado há 45 anos, aguentou apenas dois morando na cidade.

Foto: Eduardo Montecino/OCP News

Depois, migrou com a família para o campo e agora só vai à cidade para pagar as contas ou participar das reuniões junto à Associação de Produtores de Orgânicos.

Os encontros acontecem uma vez por mês, quando também auxiliam nas vistorias a propriedades produtoras de alimentos orgânicos. “Estamos sempre de olho, porque um que faça algo errado prejudica todos”, garante.

Trabalho sem pausa nem férias

No meio rural não existe fim de semana ou feriado. A roça demanda cuidados diários e faz jus ao ditado que diz que “o olho do dono que engorda o gado”. De acordo com Campigotto, férias só quando chove demais. Se estiver garoando, pelo menos a roçadeira permanece ativa.

Hoje, a produção de banana da propriedade é uma das que abastece as escolas e creches do município, contribuindo para a alimentação saudável das crianças. “A produção depende, porque no verão ela dá mais e no inverno um pouco menos, mas em torno de 100 caixas por semana. Quatrocentas caixas por mês dá uns oito mil quilos quase. É uma média”, explica.

Foto: Eduardo Montecino/OCP News

No passado, a família também fez uma tentativa com a produção de hortaliças em estufas, mas percebeu que o trabalho não compensou. “Era pouca coisa, daí não compensa sair daqui e levar até o Centro. É muito longe, não ganha nem para viagem. Parei e desmanchei a estufa. Tenho aipim e batata doce, que comercializo também, mas é pouca coisa, mais é para o gasto”, destaca.

Futuramente, o produtor pretende plantar um pouco de verdura, já que há possibilidade de formação de uma feira permanente na cidade. A propriedade também tem gado de leite e alguns animais na engorda.

Café orgânico também tem procura

Em um pequeno passeio pelo bananal da família Campigotto é possível se deparar com uma variedade de produtos. Muitas frutas – algumas que Romualdo nem sabe o nome – e uma pequena produção de café orgânico. Apesar de poucos pés plantados, ele diz que a quantidade de grão colhido é boa.

“Tem café no meio da banana, tem fruta plantada, está tudo misturado, pés de palmito, mamão tem bastante. E vem bastante mato, cresce muito agora. O café vende um pouco, a turma vem aí e pede, porque é diferente. O sabor do orgânico é bem diferente. Não tem mistura, é café puro”, enfatiza.

De acordo com especialistas em agricultura orgânica, o café orgânico possui uma alta quantidade de antioxidantes, que inclusive podem contribuir no atraso do processo de envelhecimento e na inibição do avanço de doenças como o mal de Parkison, o mal de Alzheimer e a cirrose hepática.

Além disso, o café é uma paixão nacional e cada vez mais a população busca alternativas saudáveis e de sabor característico. Se todas essas particularidades aumentam o valor financeiro dos produtos cultivados pelos Campigotto, não há como medir o ganho em qualidade de vida da família na última década e que deve se estender às próximas gerações.

Quando olha para trás, Romualdo tem certeza de que optar pela produção orgânica salvou sua vida e vai proporcionar um futuro melhor aos filhos e netos, entre os quais está o pequeno Pietro, de 11 meses. “Ah, toda vida hoje é melhor para eles (os filhos), não ficam aí com esse veneno direto. Para a saúde é melhor. Eu fui operado duas vezes já. Hoje trabalho ainda, não tanto assim, mas estou bem”, assegura.

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Elissandro Sutil

Jornalista e redator no OCP