No início da década de 1960, no final da rua hoje chamada de Águas Claras, nascia a pequena Alzira. Com uma infância livre, ela corria pelas ruas de barro, se embrenhava na mata, ouvia o barulho do rio e das cachoeiras e, claro, conforme crescia, tomou gosto por explorar ainda mais o lugar em que nasceu.
Quando a chuva caía com gosto, Alzira, os irmãos e os primos corriam e ficavam com a vara de pescar nas mãos, a postos. Assim que os pingos de chuva cessavam, o grupo saía para a pesca. “Antigamente a gente ia pescar e vinha com uns peixões, tinha jundiás enormes”, lembra. “Hoje nem piavinha tem”.
As coisas mudaram muito. Se à época nem luz elétrica tinha, hoje o movimento aumentou, o asfalto cobriu a terra e as cachoeiras quase não existem mais. Alzira Klimenkowski, hoje com 57 anos, conta que os eletrodomésticos e as lâmpadas acesas só se tornaram realidade em 1978 e ela é testemunha de cada uma das mudanças do bairro Águas Claras.
“Quando eu era pequena a água que tomávamos era da cachoeira. As minhas filhas tomavam banho de cachoeira. Às vezes tinha aluno que faltava escola pra ficar na água”, conta.
Hoje, isso não é mais possível. O rio que fazia a alegria da criançada e de quebra ofertava um som natural e ambiente aos moradores, hoje tem mais pedra do que água. Para Alzira que não reconhece outro lugar como seu lar, a mudança é nítida.
Ela conta que, antes, “todo mundo se conhecia” e hoje, em 2018, embora muitos moradores tenham permanecido, há muita “gente nova”.
Conhecedora como poucos do bairro, ela exalta a beleza e a tranquilidade do lugar em que nasceu, cresceu, casou, criou as filhas e segue a vida, mas também sabe que há mudanças capazes de melhorar ainda mais a qualidade de vida da comunidade.
Para ela, que estudou na escola do bairro quando as turmas se misturavam e ainda era uma pequena construção com uma sala, a estrutura educacional evoluiu muito no bairro. “Minhas filhas estudaram na mesma escola, mas agora é muito maior, muito melhor. Se tem uma coisa que não temos do que reclamar, é da escola”, garante.
Apesar disso, para ela as crianças não são prioridade do governo municipal quando o assunto é lazer. Ela reclama a instalação de uma estrutura capaz de ofertar espaço para os pequenos brincarem. “Não tem sequer um parquinho”, diz.
A Prefeitura afirma que “espera investir na construção do Parque da Via Verde, com espaço para a prática de esportes ao ar livre, píer para canoagem, pista de skate, área infantil, entre outros”.
O governo municipal afirma ainda que está reavaliando a instalação de áreas de lazer da forma convencional devido ao alto custo de manutenção e aos constantes atos de vandalismo “que vêm ocasionando danos, riscos de acidentes e prejuízos aos cofres públicos”, informa por meio de nota.
Reclamações de moradores
Durante a semana os ônibus amarelinhos são constantes pelas ruas íngremes do bairro, mas aos fins de semana a história é bem diferente, garante o aposentado Nair Machado que dos 58 anos de vida, passou 30 no Águas Claras. “Já estou aqui há 30 anos, sou experiente no bairro”, brinca.
O sobe e desce faz parte do dia a dia de Machado e é justamente pela falta de veículo próprio que ele conhece as dificuldades de depender do transporte público aos fins de semana.
Embora elogie bastante a estrutura do bairro, como as boas condições de pavimentação que, segundo ele, virou realidade há cerca de dois anos, pede mais atenção ao transporte na região.
“Uma coisa que nós precisávamos que melhorasse é a questão do ônibus. No fim de semana só tem um horário. Se precisar descer, tem que ir a pé. Ainda bem que estou acostumado”, diz.
O secretário de Planejamento e Urbanismo do município, Eduardo Bertoldi, afirma que o edital de transporte coletivo, que está em fase de elaboração, contempla moradores da região com novas opções de horários.
Outra área alvo de reclamação dos moradores é a saúde. Para os marceneiros Pedro Evaristo das Dores, de 60 anos, e Albino Lemos dos Santos, de 54, o bairro precisa de uma unidade de saúde que possa contemplar a demanda e, para ambos, a posição geográfica precisa ser levada em consideração.
“As pessoas têm que descer lá embaixo, na Figueira, e a maioria têm que ir a pé, porque muita gente não tem carro não”, reclama Albino.
Para Pedro, o bairro necessita, com urgência, de um centro de educação infantil. “Tem muita criança aqui e se quiser ir pra creche tem que ir para outros bairros. Agora imagina uma mãe descer essa rua com um filho no colo. E se tiver chovendo? Não dá”, reclama.
A Secretaria de Saúde alega que a região é contemplada com três Unidades Básicas de Saúde – UBS Morro Boa Vista, UBS Ilha da Figueira e UBS Águas Claras. Além disso, a secretaria informa que a unidade Águas Claras atende a uma população estimada de 5 mil habitantes com procedimentos clínicos, odontológicos e de enfermagem, além de visitas de agentes comunitários de saúde.
Já a Secretaria de Educação afirma que o bairro está na área de abrangência da Ilha da Figueira, o único do município que possui quatro instituições municipais de educação infantil.
“Normalmente, quando realizados os cadastros nos períodos indicados pela Semed e solicitadas mais de uma opção de atendimento, o período de permanência em lista é até inferior aos demais bairros”, afirma o secretário Rogério Jung, por meio de nota.
Rótulo de “área de risco”
As ruas íngremes, o rio que corta o bairro, a área de mata e os incidentes devido à chuvas em anos anteriores deram um título bastante contestado e inglório ao Águas Claras, segundo os moradores.
Para Alzira Klimenkowski, Albino Lemos dos Santos e Pedro Evaristo das Dores, não há motivos para o bairro ser considerado como uma “área de risco”, o que impede, inclusive, muitos moradores de guardar a escritura de casa.
Alzira questiona e afirma que não há qualquer perigo na região a mais do que em outros locais da cidade. “Eles dizem que o bairro Águas Claras é o primeiro em área de risco. Por que isso? Nunca aconteceu nada. Uma casa até desabou, mas porque construíram em cima do barranco, não porque é perigoso”, indaga.
Os marceneiros Albino e Pedro dizem que a nomenclatura é prejudicial para os moradores que sequer conseguem regularizar a situação escrituraria dos terrenos. “Não conseguimos documento por causa disso, a Fatma não libera por conta dessa ‘área de risco’”, diz Albino.
A Prefeitura alega, por meio de nota, que o município está trabalhando na revisão dos locais interditados “e consequente desinterdição daqueles que comprovadamente não ofereçam mais riscos de deslizamentos ou alagamentos”.
Quer receber as notícias no WhatsApp?
- Região de Jaraguá do Sul – Clique aqui
- Região de Joinville – Clique aqui
- Região de Florianópolis – Clique aqui