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Estado com maior expectativa de vida, SC carece de atendimento ao idoso

Por: Schirlei Alves

02/04/2018 - 06:04 - Atualizada em: 03/04/2018 - 17:23

“Eu ainda sou um garoto, posso dançar e cantar para os meus amigos que estão aqui. Sinto falta da liberdade, mas não tenho para onde ir. Se ele (filho) não tivesse arrumado esse lugar para mim, eu estava frito”, analisa o idoso Espedite Hermogenes, 77 anos, que vive há quase um ano na Sociedade Espírita de Recuperação, Trabalho e Educação (Serte), uma das instituições de longa permanência para idosos de Florianópolis.

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Com história no futebol como jogador do Vasco da Gama e outros times cariocas, concluiu sua carreira de atleta ainda jovem, após passar por dois times de Joinville, os extintos Caxias Futebol Clube e América Futebol Clube. Na cidade que o acolheu, no Norte de Santa Catarina, aprendeu o ofício de soldador. Após a separação, mudou-se para Florianópolis.

“No meu tempo não ganhava-se dinheiro jogando bola, hoje qualquer garoto está ganhando milhões, e, com todo respeito, nós jogávamos muito mais bola”, adverte o boleiro.

Apesar do bom humor e disposição física, Hermogenes está com as funções neurológicas comprometidas e não consegue mais viver sozinho como fez nos últimos anos na Capital. Acabou sem rumo pelas ruas do Centro. O casal de filhos bem que tentou assumir os cuidados, mas, além de não dispor de tempo integral para tomar conta dele, não havia condições financeiras para contratar um cuidador.

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Os filhos de seu Hermogenes não pagam pela estadia do pai que é custeada em parte pela prefeitura e em parte é mantida por doações captadas pela instituição. Os idosos que possuem algum tipo de benefício como aposentadoria contribuem com 70% (em torno de R$ 600).

https://www.youtube.com/watch?v=fAryy_NiZ18&feature=youtu.be

Só que o valor de R$ 1,3 mil pago pelo município cobre apenas um terço das despesas, que chegam a quase R$ 3 mil por idoso (a casa atende 57 pessoas). Sem contar os gastos com manutenção da estrutura e funcionários de saúde.

“A gente recebe pessoas acamadas, em condições de rua e com problema mental. De acordo com a política, a casa deveria ser só um acolhimento, mas temos estrutura clínica”, diz a presidente da instituição, Regina Gonzaga Sampaio.

O fato de o poder público, tanto municipal quanto estadual, entrar apenas com contrapartida financeira no atendimento ao idoso oferecido por entidades filantrópicas ou privadas, preocupa o Ministério Público.

“A gente não tem alternativa, ou o idoso está com a família e começa a ser mal cuidado, ou é mandado para uma ILPI. Precisa haver uma política pública intermediária e planejamento, pois haverá uma população gigantesca de idosos daqui 20 anos”, advertiu a promotora de Justiça e coordenadora-adjunta do Centro de Apoio Operacional de Direitos Humanos e do Terceiro Setor, Ariadne Clarissa Klein Sartori.

De acordo com o estudo Mudança Demográfica no Brasil no Início do Século XXI, promovido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Santa Catarina é o único estado cuja expectativa de vida deve ultrapassar a barreira dos 80 anos em 2020 (sendo 77 anos para homens e 83,5 anos para mulheres). Em mais dez anos de projeção (2030), os homens devem alcançar os 79,1 anos e as mulheres 85,4 anos.

Como a expectativa de vida tende a aumentar, a promotora lembra que os tipos de doenças também acompanham esse processo, como já ocorre com os idosos que sofrem com doenças degenerativas como o Alzheimer, o que os torna mais dependentes.

“É lamentável a participação do poder público da forma como está. Não tem planejamento, depende de instituições privadas e o valor que ele paga nunca é equivalente ao custo”, completa Ariadne.

Neste ano, o MP deve fazer um levantamento orçamentário e estrutural das políticas públicas para os idosos em cada um dos municípios catarinenses. O resultado será encaminhado aos promotores das comarcas para que eles possam cobrar medidas dos governos.

No levantamento, o órgão pretende levar em consideração um relatório do Tribunal de Contas de Santa Catarina de 2015 que recomendou à Secretaria de Estado da Assistência Social a elaboração de um diagnóstico sobre a situação do idoso, a implantação de um sistema estadual de informação social para gestão, ações de políticas assistenciais e a criação do fundo estadual do idoso.

 

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CONTRAPONTOS

Conselho Estadual do Idoso

O Conselho afirma que está ciente das demandas solicitadas pelo Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público e diz que as prioridades para o ano são: a regulamentação do Fundo do Idoso, o levantamento do perfil do idoso no Estado e a capacitação dos conselhos municipais:

– O Fundo Nacional do Idoso, que é uma recomendação dos órgãos, ainda não foi criado, mas está em fase de regulamentação. Porém, a captação de recurso que pode ser feita por meio de repasse de impostos de empresas privadas, cabe ao governo do Estado.

– O diagnóstico estadual com o perfil do idoso está em fase de finalização do projeto para começar a levantar os dados. Porém, a execução do projeto também depende do Estado por meio da Secretaria de Assistência Social.

– A verba para promover a capacitação dos conselhos municipais já foi captada por meio de convênio com o governo Federal. O recurso de R$ 450 mil deve ser investido em atividades que ocorrerão ao longo deste ano.

 

Secretaria de Estado da Assistência Social

A secretaria disse, por meio da assessoria de imprensa, que não poderia se manifestar sobre o tema, uma vez que houve mudança na gestão depois que Eduardo Pinho Moreira assumiu o governo do Estado. Os novos gestores, portanto, não estariam informados das demandas de cada uma das pastas.

 

Secretaria Municipal de Assitência Social da Capital

A secretaria municipal Katherine Schreiner conversou com o OCP News sobre as demandas de Florianópolis. Ela admitiu que a política para o idoso consiste basicamente na modalidade de cofinanciamento com as ILPIs como é o caso da Serte. “De fato, não banca toda a estadia do idoso, a outra parte a entidade busca de outras formas”.

Porém, a secretaria garante que novas estruturas devem ser inauguradas até o final do governo Gean Loureiro. Uma das promessas é a ampliação do projeto Floripa Feliz Idade lançado no ano passado e que reúne grupos de idosos em atividades físicas e de lazer. A ideia, segundo Katherine, é disponibilizar um espaço para os grupos se reunirem. Já existe uma casa no bairro Córrego Grande sendo mobiliada para este fim. A inauguração, promete, deve ocorrer até o final de abril.

Outra promessa é a implantação de um Centro-Dia, cuja finalidade é cuidar de idosos que têm família, mas que precisam de atenção especializada enquanto os familiares trabalham. A ideia é que os serviço seja prestado por meio de uma instituição, uma vez que a prefeitura não tem recurso para tocar o trabalho sozinho. A promessa é entregar o equipamento até 2020.

 

SOLUÇÕES
Confira as sugestões dos especialistas ouvidos na reportagem

– Implantar o Centro-Dia de Referência para Idosos. Seria uma alternativa para as famílias que podem cuidar dos seus idosos durante a noite, mas que precisam de um local de acolhimento enquanto trabalham. Esta seria uma alternativa à institucionalização do idoso e uma forma de manter o vínculo familiar.

– Disponibilizar cuidadores para atendimento a domicílio.

– Ampliar os convênios com as ILPIs existentes e criar novas estruturas totalmente públicas.

– Criar equipamentos regionais, tanto de Centro-Dia como de ILPI, para atender os municípios menores.

– Desenvolver políticas públicas que possibilitem a assistência social, a prevenção de maus-tratos e o acolhimento dos idosos em situação de vulnerabilidade.

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Schirlei Alves

Jornalista com 10 anos de experiência. Já atuou em TV, rádio, jornal impresso, digital e assessoria de comunicação.