“Meu filho está com medo de fazer cocô”. A frase, comum entre pais e mães de crianças pequenas, pode parecer trivial, mas por trás dela está uma situação que exige atenção, acolhimento e tratamento adequado. Segundo a terapeuta ocupacional Silvia Ueno Leonetti, especialista em saúde funcional, a maioria dos casos de medo de evacuar está relacionada a um episódio de prisão de ventre e evacuação dolorosa, que pode deixar uma marca emocional na criança.
“A constipação é muito mais comum do que se imagina, e pode ocorrer por alimentação inadequada ou pelo comportamento retentivo, quando a criança segura o cocô. Quando isso acontece, o cocô fica duro, dói para sair e pode até provocar fissuras na região anal, o que reforça o medo”, explica Silvia.
Esse medo pode se manifestar tanto em crianças que ainda usam fraldas quanto nas que já desfraldaram. Em alguns casos, inclusive, a criança volta a pedir a fralda para conseguir evacuar, já que o acessório se torna um símbolo de segurança emocional.
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“A dor do cocô fica registrada. E mesmo quando o tratamento médico começa e o cocô amolece, muitas crianças seguem com medo. É um ciclo difícil: a criança segura o cocô, ele endurece, dói, e ela segura ainda mais”, completa.
Silvia alerta que a constipação deve ser avaliada por um pediatra e tratada com seriedade. O uso de laxativos, muitas vezes indicado como primeira linha de tratamento, ainda causa receio entre famílias — receio esse que pode agravar o problema.
Solução lúdica
Para lidar com esses casos, Silvia criou uma personagem lúdica: a Fada do Cocô, que virou apoio terapêutico e estrela do livro “A Visita Inesperada de uma Fada Diferente”. Na história, a fadinha ajuda uma criança a superar o medo de evacuar, por meio de afeto, acolhimento e a “varinha da coragem”.
A personagem também protagoniza o Clube da Fada, com vídeos educativos, atividades e trilha terapêutica para que a criança se aproxime do banheiro com mais confiança e aprenda sobre o próprio corpo e a alimentação saudável.
“A criança precisa aprender que o cocô não é sujo, nojento ou feio. É natural. Quando ensinamos isso de forma carinhosa e lúdica, ela desenvolve uma nova relação com o corpo e com o momento de evacuar”, explica a terapeuta.
Além do suporte lúdico, Silvia recomenda uma abordagem multidisciplinar com pediatras, nutricionistas, psicólogos e terapeutas ocupacionais, especialmente nos casos em que a seletividade alimentar ou aspectos emocionais estão envolvidos.
“Acolher o medo da criança é o primeiro passo para transformar o momento do cocô em um ato de coragem, leveza e conexão com o próprio corpo”, finaliza a profissional.