Como SC se transformou em referência na doação e transplante de órgãos

Foto: Ricardo Wolffenbuttel/Secom

Por: Pedro Leal

27/09/2023 - 10:09 - Atualizada em: 27/09/2023 - 17:12

Santa Catarina tem muitos indicadores que a destacam positivamente no cenário nacional. Um deles é comemorado nesta quarta-feira (27), Dia Nacional da Doação de Órgãos. Há 18 anos, o Estado figura entre os líderes na doação e transplante de órgãos e tecidos, com índices similares aos países que mais se destacam nesse quesito.

Conforme o coordenador da Central Estadual de Transplantes (SC Transplantes), Joel de Andrade, nesses 18 anos, Santa Catarina foi líder em 14 e vice-líder em quatro. Esses resultados são atribuídos à adoção do modelo espanhol, considerado um dos mais bem-sucedidos no mundo.

Andrade explica que o modelo consiste na disponibilização, nos hospitais doadores, de profissionais de saúde capacitados a lidar com um processo complexo, que começa na detecção de possíveis doadores, o diagnóstico de morte encefálica, a manutenção desse doador até a retirada dos órgãos e a concordância dos familiares com a doação.

“A entrevista familiar é a etapa mais difícil e complexa”, afirma o coordenador. “Treinamos as equipes de profissionais da saúde a exaustão, em especial as habilidades de comunicação entre os coordenadores de transplantes e a família.”

A capacitação contínua das equipes também é apontada como um dos fatores do sucesso catarinense. Em 2007, 70% das famílias não autorizavam a doação. Atualmente, menos de 30% não concordam. A meta é atingir 10%, como ocorre na Espanha, referência mundial na doação de órgãos.

Mesmo com os resultados positivos, o coordenador acredita que há espaço para avanços, como a melhoria na comunicação com as famílias e na detecção de potenciais doadores. “Detectamos muitos doadores, mas nas auditorias que fazemos, notamos que há pacientes que não são detectados”, comenta.

Decisão é da família

No passado, qualquer pessoa podia deixar expressa no documento de identidade a vontade de ser doador. Atualmente, isso não é mais possível. Mesmo que tenha o desejo de doar, cabe à família a decisão final. O coordenador da SC Transplantes explica que é preciso haver consenso dentro da família sobre a autorização. “Se temos um caso em que são quatro filhos e um não autoriza a doação, nós não fazemos”, exemplifica.

Os profissionais de saúde que se envolvem nesse processo destacam a importância das famílias conversarem abertamente sobre o tema.

“As pessoas têm de aprender sobre o morrer. Culturalmente, a gente não conversa sobre isso”, comenta o médico intensivista pediátrico Victor Monteiro Rodrigues, coordenador médico da comissão de transplantes do Hospital Santo Antônio de Blumenau. “A possibilidade da doação é um direito de cada pessoa. Cabe a nós dar a oportunidade de exercer esse direito em um momento em que não podemos mais expressá-lo.”

“Uma regra fixa de todo esse processo é que quando alguém deixa claro para a família que quer ter seus órgãos doados, a família respeita essa vontade, mesmo num momento muito difícil”, completa Joel de Andrade. “Para quem tem um doador na família, basta respeitar a vontade dele.”

Desafios

O treinamento constante ajuda a derrubar mitos envolvendo a doação de órgãos. A enfermeira Marjana Almeida Herpich, coordenadora de transplantes do Hospital Santo Antônio de Blumenau, explica que um dos principais está relacionado à maneira como o corpo do doador será devolvido à família após a retirada dos órgãos.

“Qualquer captação de órgãos e tecidos é um procedimento seguro e o corpo do doador será entregue do mesmo jeito que ele estava ao falecer”, comentou. “A família poderá fazer o velório normalmente e se despedir da maneira adequada.”

A dificuldade em aceitar a morte do ente querido também está entre os desafios enfrentados pelas equipes. “Os familiares ficam na dívida se houve de fato uma morte encefálica, se não há nada ainda que possa ser feito para reverter a situação”, relata a nefrologista Elisângela Biazoto Massa, coordenadora de transplantes no Hospital Marieta Konder Bornhausen de Itajaí. “É difícil para a família aceitar, principalmente quando são pacientes jovens.”

O coordenador da SC Transplante acrescenta que há famílias que não aceitam esperar o tempo necessário para a retirada dos órgãos e tecidos. “Mas a recusa por uma doação nunca é culpa da família, sempre é culpa da estrutura que atende essa família desde a internação desse paciente”, comenta Andrade.

Da Agência Alesc

 

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Pedro Leal

Analista de mercado e mestre em jornalismo (universidades de Swansea, País de Gales, e Aarhus, Dinamarca).