Há cerca de nove anos, o vendedor Anderson Töwe, em parceria com sua esposa, a arquiteta Eliane Scheidt Töwe, decidiu restaurar a casa centenária onde ele nasceu e morou, junto dos seus avós paternos. O imóvel em estilo enxaimel, localizado na Rua Richard Viergutz, no Bairro Rio Cerro I, em Jaraguá do Sul, ficou como herança para Anderson. Ela foi construída em 1923 e guarda muitas histórias.
Anderson, que hoje tem 30 anos de idade, conta que a família Töwe veio da Alemanha para o Brasil em 1885 e, inicialmente, se estabeleceu na região de Benedito Novo, mudando-se depois para Pomerode e Jaraguá do Sul.
“Fui criado pelos meus avós Bruno e Adi Töwe, porque minha mãe morreu muito nova, meu pai acabou se casando novamente e passou a residir em outro lugar”, explica.
Naquela época, a casa era toda rebocada, e isso escondia o seu estilo enxaimel. “Meu quarto era na parte de cima. E eu, moleque, gostava de mexer nas coisas. Um dia, descasquei um pouco a parede e aí começaram a aparecer as madeiras. Eu quase apanhei do meu opa (avô) por causa disso”, relembra com um sorriso.
O reboco das paredes da casa tem uma explicação: é que durante a 2ª Guerra Mundial, tudo que fosse relativo à Alemanha era proibido no Brasil. Então, a casa foi totalmente rebocada para esconder a sua arquitetura original.
Técnica criada pelos alemães para facilitar o transporte
Quando foi construída, em 1923, a casa ficava próxima da empresa Chocoleite, no Rio Cerro II. “Por ser uma construção enxaimel, você pode ver que a madeira é toda numerada. Esta é uma técnica que os alemães criaram, justamente para facilitar o transporte das casas quando eles saiam de um lugar para outro. Então, se desmontava a casa, levavam-se as peças e ela era erguida no local desejado. Com a numeração já se sabia que madeira ia em qual lugar. São casas pré-montadas e nos encaixes são usados pinos, também de madeira”, explica Anderson.
Ele conta que, nos anos 1940, a casa teria sido comprada pela família Rahn. Depois, o imóvel passou a ser propriedade da família Radünz, que possuía um enorme engenho na região. Era uma casa de aluguel. O avô de Anderson trabalhava para o sr. Radünz e acabou ficando com ela em um acerto trabalhista.
“Quando eu e a Eliane ficamos juntos, nós pensamos: ‘vamos casar primeiro ou reformar a casa primeiro? Resolvemos arrumar a casa, que é o que a gente precisava”, diz. O casal queria fazer algumas alterações no imóvel, como construir um banheiro dentro da residência, por exemplo, mas não podia, por ser uma casa antiga, indicada para tombamento pelo Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Cultural, Arqueológico, Artístico e Natural de Jaraguá do Sul (Comphan).
“Então, eu fui atrás de uma outra casa enxaimel e acabei comprando uma lá em Rio da Luz, na divisa de Jaraguá com Pomerode. Trouxe ela para cá e reconstruí do jeito que a gente queria, nos fundos do terreno. Algumas madeiras de encaixe precisaram ser substituídas, porque ela também deve ter uns 100 anos. Mas aí pensamos: o que fazer com o ‘elefante branco’ (a casa que era do avô) que está aqui?”.
Recursos para investir na restauração do imóvel
O casal desenvolveu um projeto e Anderson participou de um edital do Fundo Municipal de Cultura de Jaraguá do Sul, através do qual conseguiu obter R$ 45 mil para uso na reforma da casa que foi dos seus avós. “Iniciamos a restauração dela. Foi tudo desmontado, fizemos um levantamento do que estava bom e o que não poderia ser aproveitado”, conta.
“Todos os tijolos, que vieram de Joinville, foram guardados. Inclusive, na época os tijolos eram feitos à mão, porque não existiam as olarias como são hoje. O ano 1923 está escrito em cada um deles, assim como o nome da família Rahn. Só não sabemos ao certo se a família era proprietária da casa ou da olaria que fabricou os tijolos”, relata Anderson.
Ofício que passou de uma geração para outra
Feito o projeto e desmontada a casa, as peças em madeira foram levadas para a oficina de Paulo Volles, em Blumenau. “Ele é um carpinteiro especializado em construções estilo enxaimel. Fiquei seis meses lá com ele aprendendo”, conta Anderson, que montou sua própria oficina de carpintaria. “O gosto pela carpintaria está no sangue. Meu tataravô já era carpinteiro, o bisavô também. Um irmão do meu avô e um dos meus tios ainda são carpinteiros”, destaca.
“Fizemos tudo que era necessário lá em Blumenau e trouxemos as madeiras de volta para cá. Aqui, o imóvel recebeu novos fundamentos, com pedras que vieram de Joinville para ficar igual ao original”, completa.
Investimento na restauração
Além dos 45 mil da prefeitura, recebidos via edital, Anderson investiu outros R$ 30 mil com recursos próprios na restauração do imóvel. Algumas paredes precisaram ser feitas novas e outras ainda são as originais. Toda madeira foi tratada para evitar problemas com os cupins e a umidade. E entre um tijolo e outro, é usado barro. “O barro tem a vantagem de ser térmico, não puxa umidade e no inverno fica quentinho, além de isolar um pouco do calor no verão”, explica.
“Não vou investir mais dinheiro meu na restauração porque não posso fazer uso como eu queria, que é colocar um piso diferente e fazer o banheiro”, diz. É necessário comprar mais tijolos e madeiras, mas para concluir a restauração da casa, Anderson aguarda novo edital da prefeitura. “Enquanto isso, eu vou fazendo como eu posso”, afirma.
Lançamento de novo edital
A secretária municipal de Cultura Esporte e Lazer de Jaraguá do Sul, Natália Lúcia Petry, informou que está em fase de análise no departamento jurídico da prefeitura o lançamento de um novo edital no valor de R$ 600 mil para investimento em edificações tombadas como patrimônio histórico, que irá beneficiar nove projetos. A previsão é que o edital seja lançado no mês de março.
De acordo com Anderson, quando o imóvel estiver totalmente restaurado, deverá abrigar uma choperia ou algo do gênero, ou então o escritório de arquitetura de Eliane.
Conhecimento passado adiante
Anderson conta que já recebeu estudantes de Arquitetura e Engenharia Civil de instituições de ensino da região, como a Furb e a Uniasselvi, interessados em aprender a técnica do estilo enxaimel. “Eles vêm e eu mostro como tudo é feito, a massa de barro que se usa, o encaixe das madeiras, etc.”.
Como tem conhecimento aprofundado sobre o assunto, Anderson já está atuando profissionalmente na restauração de construções no estilo enxaimel. Em um galpão nos fundos da propriedade, ele tem uma casa de quase 120 metros quadrados totalmente desmontada. “Esta casa estava no município de Luiz Alves, foi comprada por uma família de Guaramirim e será montada numa propriedade em Corupá”, conta.