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Abril Azul: a importância da inclusão do autista na sociedade

Foto: Freepik

Por: Pedro Leal

03/04/2024 - 07:04

Abrindo com o Dia mundial de Conscientização sobre o Autismo, em 2 de abril, este mês é marcado por ações para dar visibilidade e facilitar a inclusão de pessoas com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA), um conjunto de condições de desenvolvimento neurológico que afeta aproximadamente 2 milhões de brasileiros e um a cada 110 nascimentos, segundo o Center for Disease Control (CDC) dos EUA.

A estimativa é que sejam 70 milhões de pessoas dentro do espectro do autismo em todo o planeta, uma população que ainda encara preconceitos, dificuldades e desafios em um mundo que muitas vezes lhes é hostil.

O diagnóstico do autismo é feito de forma multidisciplinar, envolvendo um médico especialista – um psiquiatra ou um neurologista, em grande parte dos casos; o neuropsicólogo, que vai fazer também uma avaliação do comportamento; e pode incluir ainda outros profissionais da área de saúde que têm uma capacitação para identificação do autismo.

Hoje, o TEA é dividido em três níveis, que definem a necessidade de suporte que o autista necessitará ao longo da vida. Uma pessoa com nível 1, por exemplo, só precisa de um leve suporte. Já uma diagnosticada com o nível 3 precisa de suporte substancial.

Além da dificuldade para se comunicar e interagir com outras pessoas, que é comum a todos os autistas, o TEA também pode ter outras manifestações, como comportamentos repetitivos, interesses restritos, problemas em lidar com estímulos sensoriais excessivos (som alto, cheiro forte, multidões), dificuldade de aprendizagem e adoção de rotinas muito específicas.

Quais os sinais de alerta para procurar ajuda médica?

Os pais devem ficar atentos se o filho:

  • Não estabelece contato visual com a mãe durante a amamentação;
  • Não olha quando é chamado pelo nome ou quando alguém compartilha um interesse e aponta para algo;
  • Não gosta do toque e prefere ficar sozinho no berço (isso não significa desgostar de carinho);
  • Quando começa a andar, é na ponta dos pés;
  • Tem um jeito atípico de brincar – prefere empilhar ou enfileirar carrinhos, por exemplo;
  • Tem seletividade alimentar e problemas com texturas;
  • Não ri de brincadeiras que os pais fazem;
  • Faz gestos repetitivos, com a cabeça ou o tronco, e balança as mãos;
  • Não fala ou, quando aprende a falar, repete frases de filmes, sem se comunicar;
  • Fica nervoso com mudanças de rotina.

Empresas preparam ações para este público

Na terça-feira (2), foi aberta ao público a loja temporária da campanha, coordenada pela Associação de Amigos do Autista (AMA), no shopping Partage Jaraguá do Sul. Este ano, sob o tema “Expressões que Transformam”, a iniciativa tem como objetivo, além de reforçar a importância do diagnóstico precoce do autismo e ampliar o seu debate com a comunidade, trazer a arrecadação de fundos em prol da entidade para permitir novos investimentos.

Além disto, em parceria com a APAE Jaraguá do Sul, promove um treinamento especial aos funcionários das lojas do shopping, voltado ao acolhimento de clientes autistas.

Neste 1º Workshop sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA), a ser realizado na sexta-feira (5), os participantes serão capacitados sobre a importância de estarem preparados para atender às necessidades específicas das pessoas autistas, em vista de se proporcionar um ambiente mais inclusivo e acolhedor a todos os consumidores.

A atividade será conduzida durante toda a manhã no centro de compras, com intermédio da neuropsicóloga Karina Cardoso Wunsch e da neuro psicopedagoga Moniki Alves Netto, profissionais da equipe da APAE de Jaraguá do Sul.

A ação se propõe especialmente a ajudar a desmistificar conceitos sobre o autismo e oferecer orientações sobre como abordar e acolher famílias neuro diversas no cotidiano do empreendimento. No encontro, além de informações fundamentais sobre o TEA e suas características, serão abordadas estratégias para manejo de crises, além de atividades práticas para lidar com excesso de estímulos e adaptações ao ambiente para receber pessoas com TEA.

Outras empresas tomam medidas mais amplas para abordar este público – caso este da WEG, que apoia e participa de vários projetos nesta frente.

Estes projetos incluem o Projeto TEA em Movimento, da Associação Desportiva, Recreativa e Cultural Motiva Bento Gonçalves, sediada em Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul. O projeto visa oferecer atividades físicas lúdicas e prazerosas para crianças e adolescentes com Transtorno do Espectro Autista (TEA), com idades entre três e 13 anos, com a finalidade de melhorar suas habilidades motoras, cognitivas e sociais.

O Projeto Abraçando com Arte, da Associação de Amigos do Autista (AMA) em Jaraguá do Sul tem como objetivo principal garantir a sustentabilidade econômica da entidade, através da qualificação de suas atividades, programas e serviços. Além disso, busca promover a reciclagem sustentável de papel, utilizando papéis recolhidos de empresas, escritórios e da própria entidade para a confecção de cartões, contribuindo assim para a preservação do meio ambiente.

O projeto “Acolhimento e Desenvolvimento”, também desenvolvido em Jaraguá do Sul, visa ampliar o espaço de atendimento da APAE local, destinado a crianças e adolescentes com Transtorno do Desenvolvimento Intelectual (DI), Múltiplo (DM), Espectro Autista (TEA) e Atraso Global do Desenvolvimento (AGD). O projeto é apoiado pela WEG desde 2021, e as principais iniciativas foram, e continuam sendo, expandir o espaço físico da instituição, instalar novas salas de atendimento e ampliar a equipe multidisciplinar para atender as necessidades individuais das crianças e adolescentes uma vez por semana.

Deputado chama atenção para o diagnóstico tardio de TEA

O deputado Dr. Vicente Caropreso (PSDB) foi à tribuna, na terça-feira (2), para destacar o início do mês Abril Azul, voltado à conscientização da sociedade sobre temas ligados ao Transtorno do Espectro Autista (TEA).

De acordo com o parlamentar, cada vez mais pessoas têm sido diagnosticadas com o transtorno, especialmente na infância, o que representa um desafio para a manutenção do atendimento prestado pelo poder público.

“Vivenciamos um crescimento exponencial do diagnóstico do TEA aqui em Santa Catarina e também no Brasil, algo que vem desafiando autoridades. Desse jeito, temos que criar e aperfeiçoar as políticas públicas. Não é uma questão de uma secretaria ou outra, é uma questão de política de Estado de enfrentamento.”

Dr. Vicente chamou a atenção sobre o diagnóstico do autismo em adultos. Conforme o deputado, enquanto muito tem sido feito no que diz respeito ao diagnóstico precoce em crianças, a falta de protocolos claros para adultos pode ser uma lacuna significativa nos sistemas de bem-estar e saúde. “A falta de conhecimento sobre o autismo em adultos pode levar a diagnósticos equivocados. Muitas vezes acaba sendo confundido com outras coisas, com outros transtornos mentais, e aí vêm vários diagnósticos errados, deixando muitos pacientes à deriva em um mar de incertezas.”

A dificuldade de interação social, interesses muito específicos e comportamentos repetitivos podem ser indícios de autismo em adultos, incluindo até depressão com risco de suicídio. “Para um diagnóstico preciso é fundamental consultar um psiquiatra ou neurologista, com o acompanhamento de um psicólogo. É uma questão multidisciplinar”, destaca o deputado que também é médico.

Autismo desapercebido: o depoimento de um jornalista

Em um tempo não muito distante vistos apenas em sua forma mais grave – e muitas vezes, caricata – autistas hoje se fazem presentes em todos os níveis da sociedade. Apesar de uma taxa de desemprego de 85% entre esta população, segundo dados do IBGE, muitos autistas são membros produtivos da sociedade, inclusive este jornalista que escreve essa matéria.

Eu era como muitas outras crianças dentro do espectro do autismo: interesses extremamente focados. Hábitos repetitivos, socialização difícil e uma juventude marcada pelo bullying. Interesses que por vezes me alienavam de meus pares – quer por ser mais maduros do que os de crianças da minha idade, quer por ser mais infantil. A dificuldade com mudanças de rotina, que me persegue até hoje.

O desconforto com sabores estranhos e pessoas desconhecidas. Tinha ainda a dificuldade no olhar, os interesses restritos – e que seguem até hoje, como podem atestar os numerosos itens de colecionador em minha casa. A lentidão em começar a falar e a pressa em começar a ler. A dificuldade em lidar com cargas emocionais ou sensoriais. Os sinais de uma condição que se fazia presente, mas não era reconhecida.

A suspeita sempre esteve lá, de parentes que levantavam a pergunta a professores que achavam que havia algo “de errado” comigo. Sinal claro da ignorância sobre a condição que ainda perdura, mas nenhuma certeza.

O diagnóstico, no entanto, foi tardio, altamente tardio. Veio como resultado de uma busca por esclarecimento após uma série de dúvidas sobre diagnósticos provisórios anteriores, que iam de transtorno de personalidade impulsiva à esquizofrenia paranoide, que me levou a buscar uma avaliação neuropsicológica apenas aos 37 anos, em 2023, e um diagnóstico formalizado em laudo em janeiro de 2024.

Nesses 37 anos sem o diagnóstico, a condição se fez um companheiro invisível, mas constante, que trouxe consigo desafios múltiplos – no convívio social, em lidar com a demanda sensorial, e nos nichos de interesse com os quais pouco havia com quem discutir. Mas não impediu uma vida proveitosa, que haveria de ser mais fácil soubesse eu de minha condição – incluindo um mestrado sanduíche em Gales e Dinamarca e uma carreira como jornalista no Jornal O Correio do Povo (OCP) há seis anos.

Foto: Arquivo pessoal

 

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Pedro Leal

Analista de mercado e mestre em jornalismo (universidades de Swansea, País de Gales, e Aarhus, Dinamarca).