A Câmara dos Deputados aprovou na quarta à noite, por 252 votos a 163, um projeto de lei que propõe algo inimaginável para qualquer brasileiro: punições para aqueles que discriminarem políticos envolvidos em corrupção, bem como seus familiares.
Parece piada, mas não é. O projeto foi proposto por Danielle Cunha, filha de Eduardo Cunha, condenado a mais de 55 anos de prisão em três processos pelo desvio de milhões para o exterior.
As condenações estão sendo anuladas pela mudança de regras pelo Supremo Tribunal Federal, que agora quer que a Justiça Eleitoral e não a Federal julgue os casos e está aplicando a nova regra para o passado, derrubando as sentenças.
O projeto tem duas regras centrais. A primeira pune com prisão de 2 a 4 anos quem tentar impedir que investigados ou condenados por corrupção assumam cargos públicos. Não importa que tenha sido condenado em quatro instâncias.
Se o processo criminal não se encerrou, e no Brasil passa vinte anos sem se encerrar, ai de quem tentar impedir que a raposa cuide do galinheiro. Não há surpresa nisso. O Brasil já se tornou o país em que a raposa sai impune e o protetor do galinheiro é punido.
A outra regra proíbe que bancos discriminem e recusem a abertura de contas para políticos ou de investigados e condenados que não tenham condenação definitiva. Não haveria nenhum problema em obrigar bancos a justificar a recusa da abertura de contas para todos os cidadãos e punir recusas indevidas.
Contudo, a regra cria dois tipos de cidadãos: políticos e investigados, com proteções especiais, e os demais. Isso é uma violação do princípio da igualdade perante a lei, já que oferece proteção a um grupo específico de pessoas. Os demais não merecem proteção? Políticos investigados ou até condenados são cidadãos de primeira classe e os demais de segunda?
Além disso, agora, se um traficante de drogas ou um corrupto condenado em quatro instâncias quiser abrir conta para lavar um dinheirinho, o banco não poderá recusar o relacionamento. É uma política de anticompliance, que dificulta a prevenção e o combate à lavagem de dinheiro.
Vivemos numa total inversão de valores. Nosso país estabelece a presunção de inocência para corruptos e de culpa para quem os investiga e condena. Aqui vale o princípio in dubio pro corrupto, na dúvida, em favor do corrupto. Agora, com essa lei, talvez se deva reformular: o princípio por aqui é sempre, mesmo diante da certeza, favoreça-se o corrupto.
Será que em breve seremos presos por chamarmos o político pego com dinheiro na cueca de corrupto? É melhor não dar ideia.